A alma verde e histórica de Nova Friburgo: a Chácara do Chalet

quarta-feira, 16 de maio de 2012
por Jornal A Voz da Serra
A alma verde e histórica de Nova Friburgo: a Chácara do Chalet
A alma verde e histórica de Nova Friburgo: a Chácara do Chalet

194 anos nos separam da origem de Nova Friburgo. Ao longo desse período uma tradição ganhou forma, passando de geração a geração e que se mantém viva até hoje, constituindo nossa cultura e patrimônio, herança daqueles primeiros habitantes que lutaram para a realização de seus ideais. Esse passado se faz presente por meio dos sobrenomes, dos costumes, de uma praça ou de uma construção, referências essenciais que parecem corriqueiros no dia a dia, mas que dão sentido a nossas vidas. Todo ser humano cria laços afetivos diante da contemplação dos lugares de sua infância e deles sente orgulho por pertencer a essa história e dela fazer parte.

Talvez não haja lugar que melhor traduza essa sensação do que o Nova Friburgo Country Clube. Palco de um conjunto paisagístico e arquitetônico de importância nacional, é um dos lugares mais conhecidos e visitados do município, motivo de orgulho dos friburguenses e de admiração e respeito dos visitantes. Foi criado na década de 1860, pelo Barão de Nova Friburgo, Antonio Clemente Pinto, mantido pelo seu filho mais velho o Conde de São Clemente, Antonio Clemente Pinto e por Eduardo e César Guinle já no século XX e tombado pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1957, a pedido de César Guinle, mesmo ano em que foi instituído como clube privado.

Hoje, os jardins e, principalmente, a casa-sede denominada Chalet arqueiam sob o peso de seus 150 anos. São muitos os problemas físicos a degradarem a estrutura do Chalet, sendo urgente a restauração e revitalização do espaço. Um patrimônio como este, destaque de nossa cidade e referência para nós cidadãos de Nova Friburgo, precisa ser preservado e mantido para as futuras gerações, pois, constituindo legado dos nossos antepassados, expressa a singularidade e importância de nossa história, fundamentais para seguirmos em frente, em busca do progresso.

Em 2009 na administração de Francisco Jorge Dagfal foi dado o primeiro passo para não perdermos os estuques ricamente decorados do chalé, fazendo o escoramento emergencial de quatro áreas internas com a ajuda de empresas locais. Hoje, na atual administração de Antonio Baptista Filho, juntamos os pedaços que o tempo nos legou, conseguindo, através da publicação do livro “Chácara do Chalet: Pequena História de um Sonho” e das obras já iniciadas, manter esse monumento nacional. Somos capazes de resgatar personagens esquecidos e que deveriam, há muito, serem homenageados; podemos recontar a história de forma clara, legando aos nossos contemporâneos a grandeza de um chalé onde se respira arte e conhecimento de técnicas já esquecidas e de um jardim criado por um gênio, Auguste François Marie Glaziou. Poder vivenciar hoje uma chácara onde arquitetura e paisagem se fundem.

Ao pensarmos o projeto Memória do Nova Friburgo Country Clube em junho de 2010, visamos preservar a memória do clube e, principalmente, despertar o desenvolvimento de atitudes e posturas de proteção e defesa da propriedade, hoje denominada Parque São Clemente. O Parque São Clemente, lote V e área VI do grande loteamento “Cidade Jardim Parque São Clemente”, propriedade particular do Nova Friburgo Country Clube, tombada pelo Iphan em novembro de 1957, conforme Livro de Belas Artes, sob o número de inscrição 440, um cenário de reconhecidos valores histórico, arquitetônico e paisagístico, no qual o chalé, sua casa-sede, vem sofrendo com sua integridade bastante comprometida, com problemas estruturais e físicos.

Temos como principais ações: preservar a memória do clube, organizar um acervo fotográfico referente à história da propriedade e organizar um memorial do acervo museológico pertencente ao clube. O projeto propõe ainda contribuir para a preservação histórica do Parque São Clemente, fazer conhecidos sua história e acervos e desenvolver junto aos sócios e comunidade friburguense ações que visem valorizar e reconhecer este encantador patrimônio, e desta forma despertar e fortalecer em todos o direito de participar de sua preservação e construção histórica. O projeto desenvolve-se sob alguns pressupostos teóricos, a partir da história oral, da pesquisa documental em arquivos públicos e particulares, e do levantamento bibliográfico; consideramos, ainda, o chalé e seus jardins, grande fonte de informações históricas. Andar por suas alamedas e observar os elementos que os compõem nos revelam vestígios materiais e imateriais. Deste modo, sua preservação é importante, enquanto elo do tempo presente com o passado. Preservar o passado significa construir a história; fazer o cotidiano, vivido pelos antepassados; ser compreendido pela geração presente.

Todo trabalho e esforço durante esses dois anos foram recompensados! Em novembro do ano passado realizamos o II Encontro Nacional de Gestores de Jardins Históricos. O evento foi promovido pela Fundação Casa de Rui Barbosa, Fundação Museu Mariano Procópio (Mapro) e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), em parceria com o Nova Friburgo Country Clube, Escola de Belas Artes e Grupo de Pesquisa História do Paisagismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e teve como apoio a Secretaria de Cultura de Nova Friburgo, trazendo à cidade estudiosos e profissionais de diversas partes do país ligados a questões de proteção e preservação de sítios históricos.

No encontro tivemos a oportunidade de convidar de Brasília o senhor Dr. Andrey Rosenthal Schlee—diretor do Departamento do Patrimônio Material e Fiscalização (Iphan), órgão do Ministério da Cultura, que prontamente aceitou o convite e aqui esteve conosco. Fez questão de vistoriar toda a propriedade e constatar a situação crítica em que se encontra o chalé do Nova Friburgo Country Clube.

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Andrey Rosenthal, no encerramento do encontro, recebeu das mãos do presidente Antonio Baptista Filho toda a documentação, mostrando a situação financeira do clube, além de todos os levantamentos e mapeamentos de danos, bem como do projeto de restauro do chalé. Em suas palavras, Andrey Rosenthal disse que lutaria a favor do Nova Friburgo Country Clube e que levaria com ele um dever de casa a ser cumprido.

E assim aconteceu! No início deste ano, recebemos a grande notícia de que o Iphan iria aportar recursos ao chalé e jardins do clube. Recebemos a visita técnica do instituto, que desenvolveu um plano de ação para execução de obra emergencial, constituída de descupinização do chalé, troca e consolidação do madeiramento do telhado, criação de uma subcobertura e consolidação e recuperação dos estuques e do fasquilho dos forros do chalé.

No dia 27 de fevereiro, foi assinado em Brasília pelo presidente do Iphan—Luiz Fernando de Almeida—o aporte dos recursos para a 1ª Etapa—Execução de Obra Emergencial. No dia 27 de abril, recebemos em uma visita técnica e almoço no Nova Friburgo Country Clube a superintendente da 6ª Regional do Iphan–Rio de Janeiro, a senhora Maria Cristina Vereza Lodi, a senhora Erika Machado (Escritório Técnico do Iphan), Maximino Soutelinho da Costa (Escritório Técnico do Iphan) e demais convidados. Os últimos itens técnicos de execução da consolidação e recuperação dos estuques foram vistos e analisados e aguardamos agora o início da obra, prevendo a possibilidade de reabrir todos os cômodos do chalé para visitação em janeiro de 2013, livres do escoramento.

Diante de tais perspectivas, podemos reconhecer que o Chalet do Nova Friburgo Country Clube e seu jardim histórico personificam a memória do povo friburguense. Para os gregos a memória estava recoberta de um halo de divindade, pois referia-se à deusa Mnemosyne, mãe das Musas, que protegem as artes e a história. Essa memória é “sagrada”, é nossa riqueza, é aquilo que tem e dá significado a nossas existências, pois é prova viva que une o nosso presente às nossas origens. Como disse no II Encontro Nacional de Gestores de Jardins Históricos, o professor Carlos Gonçalves Terra da Escola de Belas Artes/UFRJ, “a percepção da memória como leitura do espaço torna-se importante investigação em busca do patrimônio imaterial da localidade”, ou seja, recuperando uma construção, como o Chalet, não resgatamos apenas um prédio da degradação, mas também damos vida às características próprias aos friburguenses. Devemos tomar o que se passa com o Chalet como exemplo e dar início à proteção dos demais monumentos de nossa cidade que estão cada vez mais deteriorados pela ação do tempo. Estes patrimônios necessitam ser resgatados e preservados para que o conhecimento deixado pelos antigos não se perca e que, com seus exemplos, nós possamos modificar o presente em busca de um futuro próspero.

Luiz Fernando Dutra Folly

doutorando em Planejamento Urbano e Regional—IPPUR–UFRJ / mestre em Urbanismo—Prourb–UFRJ / especialista em História—FSB–RJ / arquiteto paisagista formado com o grau “Cum Laude”—UFRJ / curador do chalé do Nova Friburgo Country Clube

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