Durante muitos anos, a narrativa a respeito da protocolar aprovação em plenário da Lei Orçamentária Anual (LOA) para o exercício do ano seguinte se manteve quase que inalterada, a exemplo do que vem se passando em relação à própria redação do projeto e suas principais dotações. Em essência, tanto o plenário quanto a imprensa eram apresentados a pouco mais que uma mera atualização dos números, ao sabor das previsões de repasses e da arrecadação interna.
A base, a estrutura e a liberdade de remanejamento continuavam as mesmas, desenhando um quadro de desatualização e distanciamento entre previsões e execução que acrescentou dificuldades ao controle dos gastos e prejudicou diversas áreas da administração cujos recursos terminavam por ser remanejados a outras frentes. Tudo isso, no entanto, começou a mudar na sessão desta quinta-feira, 12, do Legislativo friburguense.
Desde o processo de leitura, o primeiro secretário da Câmara, vereador Professor Pierre – que também é o presidente da Comissão de Finanças e Orçamento – quebrou o protocolo e adotou uma postura didática em relação a números que na maioria das vezes passam despercebidos a quem não teve oportunidade de estudar a fundo a proposta de orçamento. O detalhamento de gastos, em especial, evidenciou a reduzidíssima previsão de investimentos em áreas sensíveis ou essenciais, e conduziu a questionamentos que uniram situação e oposição em torno do mesmo desconforto. Como, afinal, seria possível aprovar tais números?
De fato, a situação evoluiu de tal forma que, numa certa altura, a Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) pareceu inclinada a exarar parecer contrário à legalidade da peça, o que demandou breve interrupção das atividades. Ficou claro, nesse momento, que rejeitar a nova proposta de orçamento significaria manter em vigor a peça atual, e sua enorme possibilidade de remanejamentos. Na prática, portanto, a votação iria se tratar exatamente disso: colocar, ou não, um freio no remanejamento de recursos.
Apesar da insatisfação geral em relação aos números previstos, o plenário optou, por 15 votos a 4, por estabelecer o teto de 20% para o remanejamento de recursos já para 2020, a título de enfatizar a necessidade de que o Executivo pratique o planejamento e o estabelecimento de prioridades para as peças seguintes. Espera-se, assim, que a mudança – tida como “um remédio amargo” – sirva de gatilho para a elaboração de propostas menos discrepantes em relação à execução efetiva de gastos e investimentos, a começar pela proposta para 2021, a ser apresentada daqui a um ano.
Justificativa
“O orçamento total foi estimado em R$ 578 milhões, mas existem muitas questões pelas quais na prática não se executa esse valor todo”, observa o vereador Professor Pierre. “Historicamente os orçamentos reproduzem a mesma estrutura, porque não existe discussão, não há planejamento de verdade em Nova Friburgo. O orçamento é feito de forma isolada, fragmentada, no âmbito do Executivo, e aí todo ano é um verdadeiro ‘copia e cola’ do ano anterior, só pequenos ajustes são feitos. Então, os descalabros, as diferenças que existem no orçamento, de maneira geral, vêm se repetindo. E se soma à essa problemática a falta de participação. Frequentemente, durante as audiências públicas, eu fico sozinho junto com os técnicos, e em outras oportunidades tenho a companhia dos vereadores Zezinho do Caminhão e Johnny Maycon.”
O presidente da Comissão de Finanças e Orçamento também explicou que foi deliberada a decisão de ler e apresentar os números aos companheiros de plenário, e a todos que acompanharam a sessão, presencialmente ou pela TV Câmara. “Hoje eu detalhei a leitura de propósito, contextualizei, mostrei o ponto nervoso de cada matéria, e fui mostrando os números. Ocorre que esses números, em verdade, sempre existiram. Esse absurdo sempre existiu, mas a Câmara sempre concedeu altos percentuais de remanejamento ao prefeito”, disse.
“Durante anos, sempre entendi que deveria haver um limite para poder forçar o governo a se planejar”, continua Pierre. “Não tenho poder, tempo ou condição de modificar todo o orçamento, não temos a participação de grande massa dos vereadores, a sociedade não participa. Como fazer? Então entendemos que o primeiro remédio seria o corte do percentual de remanejamento.”
Pierre destacou, por fim, que “houve emendas importantes na área de agricultura, promovida pelo vereador Alcir Fonseca. Houve emendas técnicas na área da Saúde, da Educação, mas o grande avanço que se teve é que há mais de dez anos não se consegue limitar tanto um remanejamento de orçamento, como esse. E isso é necessário para que a Câmara consiga saber o que a prefeitura está fazendo com o dinheiro público. Essa é uma medida fundamental para que a Câmara possa ter uma ideia mais clara e exercer sua função constitucional como órgão de controle”, encerrou.
Números
A receita e a despesa do orçamento do ano de 2020 estão no montante de R$ 578 milhões. A previsão de despesas com pessoal é de R$ 200 milhões, ao passo que a aplicação com Educação será de R$ 72 milhões. Em Saúde, por sua vez, será aplicado o montante de R$ 58 milhões.
Os números apresentam pequenas variações em relação ao ano passado, quando a previsão total era de R$ 568 milhões, com a despesa com pessoal chegando a R$ 195 milhões e os investimentos em Educação e Saúde se situaram, respectivamente, na faixa de R$ 70 milhões e R$ 66 milhões.
O remanejamento foi limitado a 20%, ante 30% de anos anteriores. Também foi suprimida a possibilidade de remanejamento de 100% para Saúde, Educação e Mobilidade Urbana.
Deixe o seu comentário