Em 24 horas, em meio a fortes repercussões negativas, por parte da militância bolsonarista, nas redes sociais, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, revogou nesta quinta-feira, 28, a nomeação da cientista política friburguense Ilona Szabó para o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP). Em nota, Moro pediu desculpas a Ilona por ter que revogar a nomeação. “A escolha [de Ilona] foi motivada pelos relevantes conhecimentos dela na área de segurança pública e igualmente pela notoriedade e qualidade dos serviços prestados pelo Instituto Igarapé. Diante da repercussão negativa em alguns segmentos, optou-se por revogar a nomeação, o que foi previamente comunicado à nomeada e a quem o Ministério respeitosamente apresenta escusas”, disse o ministro.
Como noticiou A VOZ DA SERRA, a nomeação de Ilona para o conselho, como suplente, na última quarta-feira, 27, fez com que Moro fosse criticado por bolsonaristas nas redes sociais. No Twitter, a hastag #IlonaNão e o nome dela foram mencionados mais de cem mil vezes nas redes sociais. Entre as críticas, haviam comentários de que Ilona é “comunista” e “inimiga do governo”, contrária às políticas do presidente.
Cientista política de projeção internacional, Ilona tem mestrado em estudos de conflito e paz pela Universidade de Uppsala (Suécia) e é especialista em redução da violência e política de drogas. Fundadora do Instituto Igarapé, que se dedica a estudar e a elaborar propostas de políticas públicas para a redução da violência, atuou na ONG Viva Rio e foi uma das coordenadoras da campanha nacional de desarmamento.
A revogação da nomeação de Ilona repercutiu nas redes sociais na noite desta quinta-feira, 28. Apoiadores do governo agradeceram ao ministro com a hastag #ObrigadoMoro, que chegou aos assuntos mais comentados do Twitter. Por outro lado, quem apoiava Ilona no governo também levou a hastag #MoroBundaMole, com críticas ao ministro, aos Trends Topics da rede social.
No mesmo dia, em nota, Ilona lamentou a revogação da nomeação e disse que "ganha a polarização" e que "a pluralidade é derrotada devido à ação de grupos minoritários”. Em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, ela detalhou que foi convidada por Moro a integrar o conselho após encontro com ele e o secretário de Segurança Pública, general Guilherme Teóphilo, durante uma reunião no Fórum Econômico Mundial de Davos, em janeiro. “Estivemos numa mesa em Davos e descobrimos muitas convergências. Os três objetivos principais do ministro - a luta contra o crime organizado, combate ao crime violento e combate à corrupção - são também as três agendas principais do Instituto Igarapé, que dirijo. A agenda do ministro, como a nossa, é uma agenda técnica. Expusemos os números e metodologias do Igarapé - como eu disse, temos, como o ministro, uma agenda técnica, de combate ao crime, sempre baseando-se em evidências. Foi uma conversa ótima”, contou.
Ilona disse ainda que, após a repercussão da nomeação, ela enviou uma mensagem para o chefe do gabinete do ministro. Em seguida, Moro ligou para ela. “O ministro me pediu desculpas. Disse que ele lamentava, mas estava sendo pressionado, porque o presidente Bolsonaro não sustentava a escolha na base dele”.
Ilona disse ainda que o presidente Bolsonaro precisa construir diálogos e consensos. “Quando ele diz que quem pensa diferente é inimigo, mostra que não está à altura do país. Acho que os brasileiros estão cansados disso. Uma prova é todas as mensagens de apoio que recebi quando decidi ir para o governo, muitas delas de gente que votou contra o Bolsonaro. Os brasileiros querem gente que pense o país, não gente que fica procurando inimigos”, afirmou Ilona ao Estadão.
Diante da decisão de Moro, o diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, enviou um ofício ao ministro da Justiça pedindo para ser exonerado de um outro conselho, também vinculado à pasta. "Escrevo para, em caráter irrevogável e em solidariedade à cientista política Ilona Szabó, que foi colocada em uma situação constrangedora no episódio da nomeação e posterior revogação da mesma para uma vaga no CNPCP, fruto da pressão de grupos nas redes sociais, pedir pública e respeitosamente minha exoneração da vaga que ocupo no Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social", escreveu.
O Instituto Sou da Paz divulgou nota na qual também manifestou solidariedade à cientista política "em razão do desrespeito demonstrado pelo governo federal". Segundo o instituto, Ilona Szabó "tem experiência e formação acadêmica excepcional que a credenciam a ocupar assento no CNPCP". O Sou da Paz diz ainda que, ao revogar a nomeação de Ilona para o conselho, o governo "dá sinais claros da dificuldade tremenda em conviver com a diferença de ideias".
O conselho que Ilona comporia é composto por integrantes do governo e da sociedade civil e é subordinado ao Ministério da Justiça. Entre as finalidades do órgão, estão: propor diretrizes da política criminal quanto à prevenção do delito, administração da Justiça Criminal e execução das penas e das medidas de segurança; contribuir na elaboração de planos nacionais de desenvolvimento, sugerindo metas e prioridades da política criminal e penitenciária; estabelecer os critérios e prioridades para aplicação dos recursos do Fundo Penitenciário Nacional.
O conselho também é responsável pela elaboração do texto do indulto de Natal (que passa pelo ministro da Justiça e pelo presidente da República). É composto por 26 membros (13 titulares e 13 suplentes), indicados pelo ministro da Justiça. São professores e profissionais de direito penal, processual penal, penitenciário, e representantes de comunidades e entidades de segurança.
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