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Simplesmente Nise!
Amor gera amor! O coração proporciona a plenitude da humanidade, a congruência dos sentimentos em prol da relação harmoniosa e favorável a disseminação do bem-estar. Imbuída desse esplendor e medicina, Nise da Silveira, a psiquiatra do manicômio do Engenho de Dentro, subúrbio do Rio de Janeiro, na década de 1940, recebe uma linda homenagem no filme “Nise - O Coração da Loucura” de Roberto Berliner. No papel, a excepcional atriz Glória Pires consegue mostrar o compromisso ético com a medicina e a humanização na relação com o outro.
O filme mostra a luta de Nise pelos seus clientes, não mais denominados pacientes por ela. Não apoia tratamento baseado em violência e se recusa utilizar os métodos tradicionais da clínica, com isso, é designada pelos médicos reacionários da instituição a assumir o abandonado setor de Terapia Ocupacional, visto como espaço de menos valor. Os outros psiquiatras estão mais preocupados com suas glórias pessoais, aquela que poderá vir pelas publicações nos periódicos de medicina, concebido pela ausência de humanidade nos seus métodos medicinais destrutivos.
A médica é única mulher na instituição, e não por acaso, um ser humano privilegiado à enxergar para além das dificuldades esquizofrênicas de cada sujeito. Sua causa está baseada na reflexão da exclusão social que os internos sofrem, seja no sentido rua/casa, ou, dentro da residência ao serem segmentados pelos os outros psiquiatras. A lógica de exclusão permanece, e, aquele espaço, que tem como propósito a recuperação cognitiva das pessoas, se constitui apenas para saneamento da sociedade, para retirar dela algo indesejável. A luta de Nise será contra o machismo, falta de recursos, desafio ao status quo da medicina e expansão da gentileza.
A reconstrução da década de 40 é impecável, o trabalho de direção de arte feito pelo Daniel Flaksman e o figurino pela Cris Kangussu nos projetam para época, em nenhum momento foge do momento histórico em que o filme está inserido. Nenhum detalhe é deixado de lado, desde o simples objeto em cima da mesa à paleta de cores do manicômio. Conseguimos entender as limitações tecnológicas e de pensamento da época, assim, valorizar cada vez mais o trabalho de Nise.
A construção do roteiro é extremamente complexa, não em relação a história, essa é linear e previsível, em relação às questões específicas de cada personagem. Os atores conseguem imprimir na tela o estado de “loucura” e criar empatia a partir das suas ações. A preparação dos atores realizada pela Dani Pereira e Guilherme Gobbi, e a direção de Roberto Berliner são louváveis. Devido o grau de dificuldade do roteiro, a equipe de escritores foi composta por sete membros: Flávia Castro, Mauricio Lissovski, Maria Camargo, Chris Alcazar, Patrícia Andrade, Leonardo Rocha e Roberto Berliner. Contendo psiquiatras como consultores.
Nise entende que, a comunicação entre os seres humanos é fundamental para o seu desenvolvimento, e escolhe a arte como canal de expressão. Entrega pincel a todos para que possam colocar para fora seus pensamentos, acredita que os internos possuem inconsciente como qualquer outra pessoa. A dificuldade em se expressar pela oralidade, numa construção lógica, não impede de se comunicar pela pintura. Assim, haver troca de engrandecimento entre os envolvidos.
Violência gera violência; gentileza gera gentileza; Nise gera sabedoria!
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