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Por que a largura dos pneus têm influência na aderência?
A pergunta que dá título a esse artigo parece meio óbvia, não? Qualquer criança de 10 anos é capaz de intuir que, numa comparação direta entre dois carros iguais, nas mesmas circunstâncias de pista, e com pneus de composição idêntica mas larguras diferentes, o que estiver com os pneus mais largos terá mais aderência disponível para acelerar, frear e percorrer curvas. Trata-se de um tema redundante, portanto. Certo?
Bom, nem tanto. Ocorre que esta nossa criança vai crescer e, se tudo der certo, irá cursar física no ensino médio, onde aprenderá que a força de atrito será definida por uma fórmula bem simples: o coeficiente de atrito existente entre as duas superfícies em contato, multiplicado pelas forças normais que as comprimem uma contra a outra. Moleza, não é? Mas... Ué? Cadê a parte que fala sobre a extensão da área de contato?
Essa dúvida me acompanhou durante alguns anos, e foi somente numa das vezes em que tive oportunidade de entrevistar Ricardo Divila, o mais destacado engenheiro que o Brasil já revelou ao esporte a motor (responsável, entre muitos outros projetos, pelos primeiros carros da equipe Copersucar Fittipaldi na Fórmula 1), que a situação começou a ganhar contornos um tanto mais nítidos. Perguntado a esse respeito, Ricardo respondeu que era preciso pensar em escala quase microscópica, imaginar a deformação do pneu, a borracha afundando entre as ranhuras do asfalto, e os minúsculos pontos de fixação que se formam o tempo todo, à medida que a roda gira.
Vale considerar ainda que pneus mais largos também reduzem a pressão imposta aos pontos de apoio, uma vez que o peso passa a ser distribuído (dividido) ao longo de uma área maior. Na prática, isso significa que eles podem ser elaborados a partir de compostos mais macios, que têm a vantagem de gerar mais aderência e a desvantagem de se desgastarem mais rapidamente. Essa possibilidade, no entanto, costuma ser mais aproveitada nas competições do que nas ruas, uma vez que a durabilidade esperada pelo mercado não possui a mesma flexibilidade.
Estas ponderações, bem como outras relativas a fatores externos tais como temperatura ambiente, umidade e contaminação da pista, levam a compreender que, na verdade, a velha fórmula reproduzida no ensino médio utiliza o coeficiente como forma de quantificar o resultado de todos estes fatores determinantes, entre os quais se encontra também o tamanho da área de contato. Ou seja: tudo está sendo levado em consideração, ainda que a fórmula seja aparentemente simples. E assim, tanto a fórmula quanto a percepção prática estão corretas.
Dito tudo isso, é importante observar que o motorista não deve sair substituindo arbitrariamente as rodas originais de seu automóvel por outras mais largas. Além de haver impedimentos ou contraindicações na maioria dos casos, é importante considerar que também existem desvantagens atreladas a pneus mais largos, tais como maior arrasto aerodinâmico, que reduz a velocidade máxima e aumenta o consumo. Antes de fazer qualquer alteração, portanto, é preciso se informar muito para saber se é possível e se vale a pena.
Na imensa maioria das vezes, o melhor mesmo é manter pneus nas especificações originais, dentro do prazo e da janela de utilização segura, calibrados, alinhados e balanceados corretamente. Cumprindo todos estes requisitos, e ainda distribuindo o peso interno corretamente, conservando distâncias seguras em relação a quem vai à frente e circulando dentro de velocidades compatíveis, o motorista certamente terá aderência mais do que suficiente para ir e voltar sem sustos.
Márcio Madeira da Cunha
Sobre Rodas
O versátil jornalista Márcio Madeira, especialista em automobilismo, assina a coluna semanal com as melhores dicas e insights do mundo sobre as rodas
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