A Feira da Vila Amélia: um lugar de memória

quinta-feira, 15 de março de 2018

Lugares de memória. A cidade de Nova Friburgo tem muitos e um deles é o mercado, ou seja, a feira da Vila Amélia. No passado foi a chácara do português Antônio Pinto Martins. Antônio nasceu no dia 1° de julho de 1862, no Minho, em Portugal. Imigrou para o Rio de Janeiro com 11 anos de idade trabalhando como caixeiro. De empregado se tornou co-proprietário adotando o sobrenome Martins de seu sócio quando o mesmo faleceu, passando a chamar-se Antônio Alves Pinto Martins. Casou-se com Carolina Gomes da Rocha e tiveram oito filhos. Amélia, única filha mulher do casal daria nome a chácara dos Martins: Vila Amélia.

 Antônio trabalhou durante 40 anos em seu comércio no Rio de Janeiro quando em 1914, aos 52 anos de idade, em virtude de um derrame decidiu residir com a família em Nova Friburgo. Antônio Alves Pinto Martins, o “Seu Martins”, como era conhecido, adquiriu o imóvel da família Salusse conhecido como Sítio do Relógio. No local construiu a casa de vivenda finalizada em maio de 1916. Explorou comercialmente a chácara e instalou o Mercado Villa Amélia, onde vendia laticínios como leite, queijo e manteiga, verduras, legumes, frutas frescas e em conserva, mel, linguiças defumadas, vinho, tudo com a marca Vila Amélia, com um V e o A entrelaçados.

Na chácara havia pomar com pereiras, macieiras, goiabeiras, canforeiras, jabuticabeiras, laranjeiras, caquis, bananeiras, pita e nêsperas cujas mudas vieram de Portugal. No brejo plantavam hortaliças, legumes e aspargos. Havia a “árvore do palito” no qual se fazia nada menos que palitos e um majestoso e imponente sobreiro, árvore que Seu Martins trouxe de Portugal no qual tirava a cortiça para fazer rolhas para as garrafas do vinho que produzia. Um lago com peixes, um chafariz e flores como margaridas, azaléas, orquídeas, palmeirinhas, cravos, boca de leão e roseiras ornamentavam a vivenda. Um riacho acionava o moinho e o monjolo na extensa propriedade. As louças, jarros d’água, bacias e saboneteiras eram todas em faiança portuguesa e tinha o monograma AM, de Antônio Martins, assim como as toalhas, guardanapos e roupas de cama.

Periodicamente, seu Martins encomendava peças para repor a baixela que quebrava da fábrica portuguesa de porcelanas Vista Alegre. O Córrego do Relógio que passa pelo atual bairro da Vila Amélia, era canalizado e circundado por videiras plantadas por Martins que produziam saborosas uvas. As videiras desciam pelo córrego sobre uma pérgula de ferro e forneciam sombra aos que por ali transitavam nos dias de sol causticante. Os veranistas que passeavam pela Praça do Suspiro geralmente percorriam as margens do Córrego do Relógio apreciando suas videiras até alcançar a chácara de seu Martins para adquirir o seu famoso mel.

Martins trouxe de Portugal a árvore que florescia a flor de tojo, cujo pólen servia para o seu apiário. Estábulo, paiol, vacas, cabras, porcos, enfim, a chácara localizada no coração da cidade atraía a atenção de todos. A charcutaria é uma tradição portuguesa. Em um galpão ficava o fumeiro onde eram defumadas as linguiças de porco feitas na propriedade. As linguiças eram dispostas e penduradas nos varais e abaixo se queimava a lenha para defumar.

Ao se matar um porco os pedaços eram colocados em vasilhames enormes de barro e encobertos por banha derretida que ao esfriar se solidificava, ficando branca como a neve. A carne mergulhada era usada quando necessário e poderia ficar nesse recipiente por meses ou até um ano e se tinha sempre pernil fresquinho. Nos outros galpões ficavam peças para uso na lavoura e o moinho usado para moer o café plantado na propriedade. Antônio Alves Pinto Martins faleceu no dia 25 de junho de 1924, com 62 anos, na Vila Amélia.

Já a matriarca da família, Carolina Martins, faleceu em 1945, com 82 anos de idade. Há muitos anos nenhum membro da família Martins reside em Nova Friburgo, mas em outros estados. Depois de alguns antecessores, a Afape (Associação Friburguense de Pais e Amigos do Educando) se tornou, proprietária do imóvel que alugou para o estado para a instalação da delegacia e a carceragem. Infelizmente essa circunstância deteriorou muito a casa de vivenda da Vila Amélia. A feira atualmente instalada no bairro da Vila Amélia certamente se deve ao comércio da família Martins na localidade, tornando-se por isso, um lugar de memória.

  • Foto da galeria

    Foto da família em 1917

  • Foto da galeria

    Mercado da Vila Amélia

  • Foto da galeria

    Monograma AM de Antonio Martins na porcelana portuguesa

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Janaína Botelho

Janaína Botelho

História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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