Era feriado, o sol tímido já não conseguia aquecer a manhã fria de 16 de maio, mas quem saiu cedo da cama para ir ao encontro de artistas promovido pelo Grupo de Arte, Movimento e Ação (Gama), junto ao monumento a Dom João VI, criado pelo artista plástico Felga de Moraes, no Parque Santa Elisa, não se arrependeu. “Foi um evento mágico, felliniano”, definiria mais tarde o mentor de todo o evento. Só podia mesmo ser ele: Julio Cezar Seabra Cavalcanti, o Jaburu.
Sem falsa modéstia, Jaburu afirmou que foi um dos momentos históricos mais importantes de que já participou em Nova Friburgo. Não, diz ele, não foi um evento despretensioso, como se poderia classificar o encontro à primeira vista. “Despretensioso, não, eu diria que foi respeitoso”, declarou.
O “primeiro abraço”, digamos assim, naqueles que tiveram o privilégio de participar do encontro, foi dado por um clown, o palhaço conhecido por Senhor Frango, intepretado por Dalmo Latini. Com sua sanfona lírica, pungente, Dalmo recebe a plateia, que já entra no clima do que virá em seguida. Jaburu faz questão de destacar que incluiu um clown na programação para lembrar Manuel Bandeira em Poética. “Estou farto do lirismo comedido, do lirismo bem comportado. Eu quero o lirismo dos clowns de shapespeare, do lirismo que seja libertação...”, já dizia o poeta. Perfeito para a ocasião.
Para dar um tom ainda mais nonsense à produção, Jaburu incluiu no roteiro a participação de Roberta e Davi, alunos de arte circense da Oficina Escola de Artes. Com suas pernas de pau, empunhavam cartazes destacando personalidades importantes da história de Portugal e de Nova Friburgo - de D. João VI, Luiz de Camões e Eça de Queiroz a Galdino do Valle Filho, Julio Salusse e Dermeval Barbosa Moreira, entre outros.
A programação começou e ninguém melhor que Luiz de Camões para marcar a homenagem a Dom João VI. “Neste instante cesse tudo o que a luz antiga canta pois que uma voz mais alta se levanta”, declama Jaburu. E June Mastrangelo, à capela, se levanta, interpretando o Hino de Nova Friburgo, seguida pela apresentação do coral do Grêmio Português, regido por Lanuzia Pimentel.
O nome do saudoso ator, diretor e dramaturgo Carlito Marchon não poderia ficar de fora de um evento como este. E foi Teleco Ventura quem interpretou duas canções de Carlito que marcaram época, com arranjos de Rafael Veronese: Friburgo, burgo do frio e Samba do paraíso capitalista.
Chega a vez de Ivan Deolindo e Adriana Novaes interpretarem canções de dois músicos conhecidos que nasceram ou viveram em Friburgo: Viola enluarada, de Marcos e Paulo Sérgio Valle (que moraram ali perto do Clube de Xadrez) e Homem da montanha, do friburguense Benito di Paula (“Moro na cidade grande/ a saudade é tamanha/ quero ver se volto logo pra terra/ eu sou homem da montanha”). Depois desta apresentação, foi a vez de Silvio Poeta louvar seu amor a esta terra, declamando um poema de amor a Nova Friburgo.
E o Gama continuou reverenciando Portugal, com Cybele Toledo declamando Florbela Espanca, uma das poetas mais importantes da língua portuguesa. A seguir Irapuan Guimarães deu um show declamando Cântico negro, de José Régio. Foi a vez, então, de Chico Figueiredo e Rodrigo Guadagnini interpretarem Fernando Pessoa. Sem dúvida, um dos muitos pontos altos da celebração.
Para encerrar, chega a vez do mestre Jaburu falar. “Continuaremos lutando diuturnamente, com toda a coragem, para que Nova Friburgo cultue e volte a ter a grande qualidade de vida sociocultural que já teve”, declarou. A manhã já chegava ao fim quando June Mastrangelo volta a soltar sua bela voz e dispara: “Sonhar, mais um sonho impossível / Lutar onde a norma é ceder...”
Foi quando o clown entrou novamente em cena e, brincando, tocando sua sanfona, encerrou o espetáculo. Fellini puro. O prefeito Heródoto Bento de Mello chega neste momento, antecedido por minutos pelo vice, Dermeval Barboza Moreira Neto, acompanhado pelo premier, Braulio Rezende, e outras autoridades. Todos estavam na inauguração do Caminho da Trova, marcada para o mesmo horário, mas fizeram questão de dar pelo menos uma passadinha no final. O presidente da colônia portuguesa, Giovanni Babo Cariello, e o presidente da Associação Comercial, Industrial e Agrícola de Nova Friburgo (Acianf) e do Convention Bureau, José Alexandre de Almeida, também fizeram questão de estar lá.
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