Assim como em qualquer lugar do mundo, em Nova Friburgo há crianças esperando para serem adotadas e pessoas cadastradas para adotar. Nem sempre, no entanto, a demanda combina com a procura de interessados. Outro fator que dificulta esse encontro é que a maioria dos adotandos quer crianças brancas, ainda bebês e saudáveis. Crianças entre 5 e 7 anos também são adotadas. Mas dessa faixa em diante, dos 8 aos 17, a adoção fica bem mais difícil.
No entanto, tudo é possível. Este ano, por exemplo, um bebê com micro-encefalia foi adotado por um casal que mora em outra cidade, segundo relato da juíza Adriana Valentim. “E adolescentes têm mais chances de serem adotados por famílias estrangeiras”, acrescentou.
Titular da 1ª Vara da Infância e Juventude e do Idoso da Comarca de Nova Friburgo desde fevereiro deste ano, a juíza Adriana Valentim citou a Casa de Acolhimento Vila Sorriso (Cavis), em Mury, uma instituição vinculada à secretaria de Assistência Social, com capacidade máxima para 20 crianças, com idades de 0 a 17 anos. Entre outras questões, abordou a importância da assistência médica e psicológica que crianças e adolescentes devem receber para sanar eventuais traumas. “Geralmente, elas precisam de tratamentos para se recuperarem física e emocionalmente”, revelou.
Sobre esta situação, Adriana acentuou o delicado estado em que essas crianças se encontram quando chegam à Cavis. “Lidar com crianças e adolescentes marcadas por sérios problemas familiares é uma situação delicada, que exige uma atenção redobrada e projetos que efetivamente melhorem as condições de vida deles. Recuperar a sua auto-estima é fundamental. Afinal, são crianças marcadas por lares desfeitos, e, não raro, violentos”, reiterou.
Segundo a juíza, antes de mais nada, a principal preocupação das autoridades, ao avaliar as condições onde estão inseridas, é verificar se existe uma real situação de risco. Neste caso, o Conselho Tutelar vai ao domicílio indicado para atestar riscos, depois informa o Juizado, que então autoriza o recolhimento dessas crianças. “Quer dizer, esse encaminhamento só ocorre depois que o Conselho faz uma prévia e cuidadosa análise sobre a existência de algum membro da família extensa, ou seja, se há uma avó(ô), tia(o) em condições de acolher essa criança. Só quando se esgotam todas as possibilidades de haver algum parente é que a criança é encaminhada para o abrigo”, explicou a doutora Adriana, referindo-se à Cavis.
Ao assumir a 1ª Vara, Adriana Valentim mapeou a situação do município, observou os procedimentos para adoção, os estudos técnicos realizados para determinar quais crianças estariam em condições legais de serem adotadas.
“Ao chegarem à Cavis, as crianças são assistidas por uma equipe composta por psicóloga e assistente social. A impossibilidade de a criança ser reintegrada à família biológica leva em conta diversos fatores: falta de moradia e alimentação; abandono; pai e/ou mãe vivendo nas ruas, envolvidos com drogas; reiterados atos de negligência, abuso sexual, entre outros. Qualquer desses fatores leva o Ministério Público a entrar com uma ação de destituição do poder familiar. É o primeiro passo para considerar a possibilidade de uma posterior adoção. Esse poder passa para uma família substituta, que depois pode ser também substituída por uma família ou pessoa que queira adotar definitivamente uma criança”, esclareceu a juíza.
Apadrinhamento
No momento, a juíza está empenhada em colocar em prática, no início de 2018, um projeto de apadrinhamento dos jovens com idades entre 8 e 17 anos. A ideia é que essas crianças tenham a oportunidade de conviver com uma ou mais pessoas, em determinado dia ou período. Para passear, ir ao cinema, tomar um sorvete, enfim, participar de uma atividade comum às famílias, num dia qualquer da semana, uma vez por mês, num fim de semana. Poder “estar” em um lar estruturado, se sentir acolhido e desejado, para viver o cotidiano daquele lar. Passar o Natal, a Páscoa. Ou viajar nas férias. Pode também ser um padrinho que ofereça um determinado tratamento, dentário, psicológico, esportivo.
“Neste caso, esses serviços seriam oferecidos por dentistas, médicos, professores, que dispusessem de um tempo para ir ao Cavis se dedicar a uma ou mais crianças, uma vez por mês, ou como fosse possível. Empresários de diversos setores, da construção, do setor de alimentos, por exemplo, comerciantes, em geral, poderiam ajudar na manutenção da sede da Casa Acolhedora, ou das necessidades do dia a dia, do funcionamento da entidade. Enfim, há várias formas de colaborar para melhorar as condições de vida dessas crianças”, sugeriu Adriana, acrescentando que ambas as partes são preparadas para viver esse tipo de relação, que pode ser passageira, mas não impede que se torne uma relação de amizade duradoura. “São relações próprias de padrinhos e madrinhas com seus afilhados”, reiterou Adriana.
Para divulgar esses projetos, a juíza está criando um blog a ser lançado ano que vem para divulgar toda essa demanda e atrair parcerias para o bom andamento do trabalho realizado na Casa Acolhedora Vila Sorriso. “Também pretendo convidar artistas, poetas e escritores para conhecer o espaço, interagir com as crianças. Quem sabe quantos talentos não podem ser descobertos ali? Essas crianças precisam de tudo isso, de uma casa que não seja apenas um abrigo, mas uma casa com jeito de lar, onde vive uma família. Elas precisam sentir o que é viver assim e serem olhadas com mais atenção e carinho, até que sejam adotadas”, encerrou Adriana Valentim.
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