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Por que uma marcha é “mais forte” do que a outra?
Uma das primeiras coisas que qualquer criança que se interesse por carros ou motos irá aprender sobre a condução é que as marchas servem para que o motorista possa escolher entre ter “mais força” ou “mais velocidade”. A maior parte dos condutores, todavia, não vai muito além disso, e jamais chega a entender de fato por que a troca de marchas produz este tipo de efeito sobre o deslocamento do veículo.
Colocando da forma mais simples possível, o conjunto de peças capitaneado por bielas e virabrequim tem a função de transformar o sobe e desce dos pistões em movimento circular, cuja força de rotação é o torque que já descrevemos por aqui, em edição anterior. Esse movimento circular, contudo, ainda passará por duas taxas de conversão antes de alcançar as rodas e ser traduzido em movimento. A primeira dessas taxas é fixa, e cabe ao diferencial. Já a segunda é variável, e corresponde justamente a cada uma das relações de marcha disponíveis em cada veículo.
Para aproveitar da melhor forma as curvas de potência e torque do motor, o sistema de transmissão adota engrenagens com diferentes números de dentes, que irão determinar o grau de multiplicação do trabalho a ser realizado. A relação utilizada em cada fase do movimento irá definir quantas voltas a engrenagem motora terá de dar para cada volta correspondente da engrenagem movida.
Parece complexo, mas a lógica é simples. Em essência, a primeira marcha é mais forte do que a quinta porque, como seu índice de multiplicação é muito menor, o motor terá de girar muito mais vezes para percorrer a mesma distância. Colocando de outra forma, ele terá convertido muito mais energia para realizar o mesmo trabalho, igualmente consumindo mais combustível. Mudando nosso ponto de vista para o extremo oposto, poderíamos explicar a mesma situação dizendo que em quinta marcha o veículo terá de percorrer distância muito maior a cada explosão do motor, e por isso mesmo a resistência oferecida para fazer girar as rodas será proporcionalmente mais severa. Daí a sensação de que a quinta marcha é mais fraca do que as demais.
A leitura das relações de transmissão também é mais simples do que parece. Imagine, por exemplo, um sistema no qual a engrenagem motora tem 15 dentes, e a movida possui 30 dentes. Ora, neste cenário, duas voltas da engrenagem motora irão corresponder a uma volta da movida, estabelecendo-se uma relação – ou redução – de 2:1. Disso concluímos que quanto maior o indicativo da relação, mais curta será a marcha. E vice-versa, obviamente.
As relações ideais para cada veículo serão determinadas a partir de características do motor, além de peso e arrasto aerodinâmico do veículo. Todo carro, por exemplo, deve ser capaz de arrancar numa rampa de pelo menos 35%, completamente carregado, sendo este um requisito que serve para determinar a relação da primeira marcha. Da mesma forma, é desejável que a última marcha permita que a velocidade final seja atingida com o motor na rotação de potência máxima.
Para encerrar o tema, há que se observar que o diâmetro dos pneus também irá afetar a relação final. Por isso, se o motorista decidir – contra todas as recomendações – utilizar pneus maiores ou menores, estará alongando ou encurtando as marchas de seu carro, respectivamente. Em graus muito mais sutis, este fenômeno se observa também gradativamente, à medida que os pneus se desgastam com o uso e perdem um pouco de suas medidas originais.
Márcio Madeira da Cunha
Sobre Rodas
O versátil jornalista Márcio Madeira, especialista em automobilismo, assina a coluna semanal com as melhores dicas e insights do mundo sobre as rodas
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