Cuide bem do seu amor

sábado, 10 de junho de 2017

Namorar no carro, ou passear de moto a dois, são o tipo de lembrança que facilmente pode ser relacionada a uma das fases mais prazerosas da vida. A realização pessoal pela conquista da habilitação, os sabores da vida adulta experimentados pelas primeiras vezes, os dissabores desta mesma vida ainda distantes no horizonte, a inigualável sensação de liberdade, as arrebatadoras paixões da juventude, o futuro inteiro pela frente, os sonhos ainda pintados em cores tão possíveis... Não, ninguém vai negar: namorar no carro ou na moto é bom demais, faz parte dos tesouros que efetivamente acumulamos na vida.

Quando alcançamos certa idade, 18 anos parecem passar voando. Mas quando estamos partindo do zero, com toda aquela ansiedade para tomar as rédeas da própria vida e fazer direito tudo que as gerações anteriores não fizeram, a maioridade simplesmente parece que não vai chegar nunca. E então, após uma vida inteira de espera, todos estes desejos e hormônios reprimidos são liberados quase ao mesmo tempo, e o que era para ser uma fase maravilhosa de uma história que apenas começava a ganhar forma, tantas vezes acaba se transformando numa abreviação cruel e desnecessária de tudo que ainda estava por vir.

Poucas coisas podem ser mais tristes do que a tragédia da juventude no trânsito. É absolutamente impossível mensurar o peso, o tamanho da chaga que se abate sobre o Brasil todos os anos, dia após dia, neste desperdício de energia juvenil, nessa sangria de renovação, nessa dor implacável que vai contra a natureza e faz com que pais velem seus filhos, avôs velem seus netos. Nessa displicência cultural que classifica como fatalidade algo que pode e precisa ser mudado, e que deveria ser tratado como prioridade em termos de políticas públicas.

De forma alguma este texto tem a intenção de apontar falhas ou atribuir responsabilidades ao que já aconteceu. Ninguém está livre deste tipo de tragédia, sobretudo enquanto a sociedade como um todo não se posicionar efetivamente no combate à mais evitável e cíclica de nossas catástrofes. Não, o objetivo é simplesmente o de voltar os olhos ao futuro e convidar a todos a uma convivência mais pacífica, no trânsito e fora dele, e também a uma ponderação mais efetiva a respeito dos riscos de se conviver com quem se recusa a adotar uma postura cuidadosa ao conduzir.

É de cortar o coração, por exemplo, ver tantos jovens – a maioria meninas – na garupa de motociclistas irresponsáveis e imprudentes. É duro constatar que tantas vezes quem morre é o carona, é quem estava parado no ponto de ônibus, é quem trafegava no sentido oposto e foi atingido sem qualquer chance de reação.

Por isso, se você está habilitado a conduzir, e se você tem alguém para levar consigo, seja grato e inteligente, e trate de construir lembranças gostosas, para você e essa pessoa que confia em ti. Saboreie o que a vida tem de melhor, valorize o privilégio de ter saúde, e cuide bem do seu amor. Porque a vida passa muito rápido, e cedo ou tarde ela irá ensinar que não existe elogio maior do que escolher alguém para dividir a existência, nem tampouco confiança maior do que colocar a própria integridade física nas mãos de outra pessoa.

E se, por outro lado, seu namorado ou sua namorada é impaciente no trânsito, costuma correr, andar perto demais de quem vai à frente, realizar ultrapassagens arriscadas, e se recusa a mudar de postura a este respeito, então considere sim a possibilidade de desfazer esses laços e seguir caminho separado, enquanto ainda tem a chance. Porque os riscos se multiplicam quando são rotineiros, e porque ninguém que coloque sua vida em risco deliberadamente te ama de verdade ou merece desfrutar do teu amor.

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Márcio Madeira da Cunha

Sobre Rodas

O versátil jornalista Márcio Madeira, especialista em automobilismo, assina a coluna semanal com as melhores dicas e insights do mundo sobre as rodas

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