Consta nos anais da história que foi em 21 de fevereiro de 1874 que chegou ao Brasil [Espírito Santo] a primeira expedição de italianos a bordo do vapor “Sofia”. Então, de acordo com esse registro histórico, temos o marco inicial da grande migração de italianos, população hoje calculada em mais de 30 milhões de descendentes.
Segundo a historiadora Janaína Botelho, cerca de 3,8 milhões de estrangeiros entraram no Brasil entre 1887 e 1930, com os italianos formando o grupo mais numeroso, vindo a seguir os portugueses e os espanhóis.
“Os italianos, conhecidos como alegres e emotivos, de sotaque cantante, eram vistos como laboriosos lançando-se à faina da lavoura, carpintaria, comércio, indústria e no campo das artes. Imigraram para Nova Friburgo a partir do final do século XIX as famílias Spinelli, Lo Bianco, Lívio, Bizzoto, Tessarollo, Merecci, Bianchini, Cantelmo, Vassallo, Miele, Mastrangelo, Cariello, Vanzilotta, Senna, Vitiello, Pecci, entre outros”.
Os Lobianco…
Antônio Lobianco, italiano natural de São Francisco de Paola, chegou ao Brasil em 1930, aos 16 anos. Trabalhando pesado, ano após ano, durante décadas, construiu um respeitável patrimônio e contribuiu de forma consistente para o desenvolvimento econômico de Friburgo, assim como seus irmãos e respectivos descendentes. Até seu falecimento, em 2015, aos 100 anos, seu Antônio participava com entusiasmo das atividades das entidades comerciais locais, com invejável lucidez.
Ele construiu empresas e carimbou o termo tradição em diversos negócios da família, como o Bar Universal, a fábrica de massas São Francisco, a fábrica de biscoitos amanteigados Curumim e a loja Galeria Universal. Da mesma forma, os outros Lobianco’s, por várias gerações, até hoje. Antônio Lobianco foi um dos fundadores da Câmara dos Dirigentes Lojistas, que o homenageou, juntamente com o Sincomércio, com uma placa comemorativa por ocasião de seu centenário.
Os Mastrângelo...
Já a família Mastrangelo começou sua trajetória com um pequeno negócio de fazer e consertar sapatos, no início do século passado. O imigrante Luiz Mastrangelo chegou ao Brasil em 1897, e mandou buscar a esposa e o filho José em 1899, este com apenas 2 anos de idade. Foi esse José - nascido em San Pietro al Tamagro (Salerno) - que se tornaria, aqui, um exímio sapateiro, pioneiro no ofício nos idos de 1920/1930. Hoje, a 4ª geração deste núcleo dos Mastrangelo, que continua no ramo, - como comerciantes e lojistas, há mais de 50 anos -, está representada na pessoa de José Luiz, proprietário de tradicional sapataria na Avenida Alberto Braune e presidente da Casa d’Itália.
“Meu avô era um mestre, dedicado e caprichoso, atento aos mínimos detalhes de um par de sapatos feitos sob encomenda. Ele tinha um armário cheio de gavetinhas, e cada uma delas guardava o molde (a forma), de um cliente. A clientela dele incluía pessoas da sociedade, que frequentavam bailes, principalmente pais e alunos das escolas particulares, e autoridades, tanto daqui quanto de Niterói e Rio de Janeiro. Ficou tantos anos debruçado sobre aquelas formas de ferro, costurando e colando, que acabou intoxicado pela cola. Morreu com sérios problemas respiratórios, aos 81 anos, em 1979”, lembrou.
Já o pai, Mário, nascido em 1924, possuía tino comercial, vocação natural para antecipar o futuro. Apesar de ter começado a trabalhar ainda adolescente, com o pai, não se via como sapateiro, mas como dono de sapataria. E trabalhou duro para chegar onde queria. E chegou. Comprou um imóvel na Avenida Alberto Braune, montou sua primeira loja, a Rex Calçados, no térreo, e fez moradia na sobreloja.
“Meu pai aprendeu muito com meu avô, mas tinha seus próprios sonhos. E não parava de acompanhar a evolução das coisas, observar as novidades, avaliar como crescer cada vez mais. A concorrência, por exemplo, à medida que via as conquistas dele, ia crescendo cada vez mais e ele se incomodava com isso. E como ele mesmo gostava de contar, tinha sido bom aluno nas contas de somar e multiplicar, mas péssimo em dividir e subtrair”, conta, rindo, para em seguida lembrar de um feito típico de um homem de negócios:
“Um dia ele teve a ideia de combinar com amigos que trabalhavam nas fábricas de oferecer crédito para os operários comprarem na sapataria. Para cada cliente que o amigo trazia, ele dava uma comissão quando recebia o pagamento. Funcionava como uma espécie de cartão de crédito. Acho que ele criou o primeiro sistema de crediário em Friburgo. E deu muito certo”, contou. Seu pai, o Mário, morreu aos 90 anos, em 2014.
Uma andorinha chamada Fausta
Uma querida figura da comunidade italiana é Fausta Giusti Sidoni, que chegou ao Brasil em 1954, aos 21 anos, e em 1957 mudou-se para Friburgo. Artista plástica e escritora, até o momento publicou três livros: “O voo de uma andorinha”, “O despertar de uma andorinha” e, o mais recente, “A andorinha sem fronteira”, em dezembro passado. Quanto aos seus quadros, já foram apreciados em várias cidades, em mostras individuais e coletivas, inclusive em Áquila, sua cidade natal, e na Suíça. Fausta Sidoni é Cidadã Friburguense, título recebido em 2009, e, por indicação de conterrâneos e amigos, recebeu em 2016 a medalha “Somos quem fomos”, da Câmara Municipal, em homenagem a todas as colônias de Friburgo.
“Eu amo o Brasil. Cheguei muito jovem aqui, vim para casar e nada sabia deste país. Mas essa terra acolhedora, esse povo alegre e de braços abertos para todo mundo é inigualável, não existe em nenhum outro lugar. Talvez o brasileiro seja esse povo risonho e otimista pela generosidade desta terra. Tudo aqui é farto, fácil, todo o solo é aproveitável, realmente, plantando e tendo água, tudo dá. É um país tão grande que podia até se dividir em outros dez. Talvez, então, seria mais fácil de governar, controlar as coisas, ser mais justo, igual para todos. É preciso olhar em volta, pensar mais no coletivo e, principalmente, se preocupar com o amanhã. Trabalhar agora para construir um futuro justo e bom para todos. Esse país e o brasileiro merecem viver em paz e ser feliz”, disse dona Fausta, mãe de um casal de filhos brasileiros.
Uma gente fadada à prosperidade
“A mobilidade social ascendente dos imigrantes que se estabelecem nas cidades é inquestionável. Verificamos esse fenômeno no êxito desses imigrantes em atividades comerciais e industriais. Os italianos que imigraram para trabalhar nas plantações de café como colonos no Centro-Norte Fluminense raramente prosperaram. Já os que imigraram para Nova Friburgo ascenderam economicamente nos ramos industrial, comercial e de prestação de serviços.
Os núcleos urbanos, ainda que incipientes, ofereciam melhores condições de ascensão social do que o campo. Giovanni Giffoni era proprietário de um armazém de secos e molhados, do Café Colombo, de um bilhar, além de ser importador de vinhos italianos. Igualmente possuía uma fazenda de café e residia em uma das residências mais belas e elegantes de Nova Friburgo. Posteriormente tornou-se a Casa d’Itália e hoje, no local, o Edifício Itália.
Outro ilustre italiano foi Carlos Éboli. Nascido em 1832, chega ao Brasil na segunda metade do século XIX. Foi responsável, junto à Companhia de Jesus, pela vinda do Colégio Anchieta para Nova Friburgo. Éboli, objetivando um empreendimento grandioso, construiu o maior estabelecimento hidroterápico da América Latina em Nova Friburgo. Anexo ao prédio da hidroterapia edificou o Hotel Central, para servir aos hóspedes. No outrora prédio do hotel funciona atualmente o Colégio N.S. das Dores.
Os italianos ganharam no executivo municipal um importante prefeito: Dante Laginestra, que governou no período de 1935 a 1946, favorecendo a já expressiva e articulada colônia italiana. Porém, os Spinelli são o exemplo mais exponencial da prosperidade dos imigrantes italianos em Nova Friburgo.”
(Fonte: Blog História e Memória, trecho de artigo de Janaína Botelho, historiadora e professora, publicado em A VOZ DA SERRA).
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