Acontece a todo instante. O cliente entra na loja, escolhe a mercadoria e ao se dirigir ao caixa o atendente pergunta: “Débito ou crédito?”, e agora, mais ainda, “Dinheiro ou cartão?”. Porque é o seguinte: se pagar com dinheiro vivo tem desconto, mas, se a resposta for cartão, não. Com taxas e prazos dilatados, no fim das contas, é o consumidor que paga essa conta, mesmo que indiretamente, porque, segundo o lojista, “do valor da venda são descontadas as taxas e ainda espero 48 horas - no caso de débito - para o dinheiro entrar na minha conta”.
Leis e portarias sobre essas questões não faltam, principalmente a que determina a colocação dos preços à vista e à prazo nas mercadorias expostas nas vitrines, e valor dos juros. Também tem portaria dizendo que não pode haver diferenciação entre pagamento em dinheiro e cartão ou cheque. Mas há. De cada dez lojistas, oito adotam essa opção.
Portanto, a maior parte dos consumidores e lojistas assume e defende essa prática. Também é fato que muita gente ignora ou desconhece que isso é uma infração. Mas, não pode fazer, mas não tem como proibir. E ambas as partes se sentem à vontade, afinal, ninguém está sendo prejudicado, ninguém está enganando ninguém. Só que, existe uma portaria e lei do Ministério da Fazenda, que trata da questão. Se é acatada ou não é outra história (Veja abaixo).
Uma questão de interpretação
Daí surgem mil questionamentos e outras tantas interpretações. Se essa prática está consolidada, quem utiliza o plástico estaria pagando mais caro pelo mesmo produto? Por exemplo, se o consumidor opta pelo pagamento com cartão de crédito ou débito, o preço é um, mas se ele escolhe pagar em dinheiro o preço é outro, e tem desconto. Na verdade, nesse tipo de negociação o que o comerciante está fazendo é repassar/descontar o custo que ele tem com a administradora do cartão de crédito, para o dinheiro vivo.
O que no entendimento do Superior Tribunal de Justiça é algo abusivo, conforme decisão sobre recurso da Câmara dos Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte, por exemplo, que queria impedir que o Procon de Minas Gerais aplicasse multas em empresas por cobranças diferentes.
“Dar desconto para pagamento em dinheiro ou cheque e cobrar preço diferente para pagamento com cartão de crédito pelo mesmo produto ou serviço é uma prática abusiva e o estabelecimento que insistir nesta condição de venda estará sujeito a penalidades, que podem e devem ser aplicadas pelo Procon”.
Há controvérsias. Veja, por exemplo, o que disse uma comerciante: “Você compra uma blusa por R$ 152 e quando saca o cartão para pagar, a vendedora avisa que no cartão é mais caro, vai custar R$ 167. Aí você reclama. Mas, se você diz que vai pagar com dinheiro, a vendedora diz que ‘no dinheiro’ vai ter um desconto, digamos, de R$ 15. Disso você reclama? Não. Você vai até a agência mais próxima, saca o dinheiro e paga cash. Por que essa prática deve ser penalizada? Como fica o nosso direito de negociar diretamente com a freguesia? Isso não devia ser interpretado como uma infração, mas como uma forma legítima de negociação”, argumentou.
Ao que uma cliente que participava da conversa, emendou: “A mim, como consumidora, quero é pagar menos, e confesso, seja do jeito que der. Por que não posso escolher a forma de pagar? A quem estou, ou estamos prejudicando? Até gostaria de saber qual é o critério para decidir que tem que ser assim ou assado. Ora, se fico sabendo que pagando em dinheiro vou ter um desconto, eu vou pagar em dinheiro”, se defendeu.
A proprietária de uma perfumaria, que também oferece bijuterias e acessórios, reclama dos juros e do prazo para o dinheiro entrar na conta da loja. “Mais da metade das minhas vendas são feitas em espécie e neste caso dou desconto. Afinal, em pagamento com cartão de débito, sou descontada em 2,9% e o dinheiro só entra na conta 48 horas depois. Se a venda for feita numa sexta-feira, só vou receber na terça. E no crédito, além dos 30 dias de espera para receber, pago uma taxa de 3,4%. É complicado, no total nossa margem diminui muito e acho legítimo optar por outra forma de pagamento para defender o nosso direito de negociar, dentro dos limites das leis vigentes, afinal, a loja é minha, e os riscos também e investimentos também”, enfatizou a empresária.
O que diz a lei
Existe uma portaria do Ministério da Fazenda, a 118/94, que em seu artigo 1º, inciso I dispõe: “Não poderá haver diferença de preços entre transações efetuadas com o uso do cartão de crédito e as que são em cheque ou dinheiro”. E, o artigo 36 da lei 12.529/2011 classifica como infração à ordem econômica discriminar adquirentes ou fornecedores de bens ou serviços por meio da fixação diferenciada de preços, ou de condições operacionais de venda ou prestação de serviços (inciso 10) e recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, dentro das condições de pagamento normais aos usos e costumes comerciais (inciso 11). Já o Código de Defesa do Consumidor, artigo 39 assim dispõe: “É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (...) V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva; (...) X - elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços.”
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