Prefeitura de Nova Friburgo completa 100 anos nesta sexta-feira

Instituição nasceu de uma rivalidade entre o líder político Galdino do Valle Filho e Nilo Peçanha, então presidente do estado
quinta-feira, 18 de agosto de 2016
por ​Girlan Guilland
Prefeitura de Nova Friburgo completa 100 anos nesta sexta-feira

Como ​se pode facilmente nota​r em sua rica historiografia​, ​datas importantes quase não constituem novidades em Nova Friburgo. Tanto que passam despercebidas. Mas ​ainda assim algumas surpreendem, como o centenário da prefeitura friburguense, comemorado nesta sexta-feira, 19.

Acontecimento dos mais expressivos — a menos de dois anos do centenário ​do município, criado por um decreto real — os 100 anos da prefeitura ocorrem coincidente​mente em um ano eleitoral. Situação que o destino reservou aos dias atuais, nem por isso sendo, de fato, “comemorada” à altura. Ou mesmo lembrada, como deveria.

Para melhor compreensão do tema, recorramos à própria história: no Brasil, desde os tempos coloniais e, durante o Império, as câmaras municipais detinham o poder máximo nos povoados urbanos. Compostas por juízes, ​vereadores (oficiais da Câmara) e um procurador, todos eleitos por homens de posses, as casas que hoje são os Legislativos, eram chamadas de “Senado da Câmara”.

Nova Friburgo, tão logo foi criada a Vila (desmembrada de Cantagalo em 3 de janeiro de 1820) teve sua instalação oficializada, criando, seu governo municipal, de acordo com um regime especial, contando com um diretor, subordinado ao inspetor na Colônia. Somente em 1829, teria através “dos homens bons” a primeira eleição municipal friburguense, a partir da qual se iniciava o processo para ​dar fim ​ao status colonial da vila. 

O primeiro presidente eleito ​da Câmara friburguense foi o médico dos colonos​, o francês Jean Julien​ Bazet​ (que exerceu o cargo, que equivalia ​ao de prefeito, por três ocasiões: 03/2/1829 a 11/01/1833; 16/01/1838 a 07/01/1845 e 20/01/1846 a 20/05/1849).

No Brasil não era diferente. As câmaras eram o centro das decisões, nos tempos de colônia e depois, durante o Império. Com a Independência (1822), reorganizadas as estruturas político-administrativas, perderiam autonomia, mas continuavam acumulando poderes executivo, legislativo e judiciário, como principal instância representativa do poder local. 

Em nível nacional, só com a proclamação da República, em 1889, as câmaras seriam dissolvidas. Criado o Conselho de Intendência, com integrantes nomeados pelos governos estaduais, e constituindo novo órgão de poder municipal. O governo republicano desmembrou os poderes executivo, judiciário e legislativo, este a cargo das Câmaras, que foram recompostas.

​Em 1916​, Nova Friburgo seguia o ritmo normal de sua trajetória pré-centenária, comemorando cinco anos da sua energia elétrica e a consequente industrialização, com a pioneira fábrica de Rendas Arp. Na política, no entanto, reservavam-se dias de muita efervescência. 

Uma intensa batalha jurídica vinha sendo ​travada por causa da eleição à Câmara de Vereadores, conquistada pelo grupo político do médico Galdino do Vale Filho, garantindo-lhe a continuidade à frente do poder municipal.

No artigo 2º do mesmo decreto que criou o órgão, governador projetou obras dos primeiros oito quilômetros da rede de esgoto 

Além de ter assumido diversas vezes a presidência da Câmara, desde 1914, Galdino fazia oposição ao líder político Nilo Peçanha (de quem já fora aliado), e comandava o poder estadual nos primeiros anos do século 20 (até 1923). Presidente do estado (cargo equivalente hoje ao de governador), Nilo Peçanha interveio no processo e conseguiu, ainda que momentaneamente, mudar o resultado no Tribunal de Relação estadual, nomeando, então, um interventor, Sílvio da Fontoura Rangel. 

Mais adiante, Galdino conseguiria reverter o quadro junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) e, neste momento, acontece o fato histórico que hoje, 19, completa 100 anos.

A resposta de Nilo Peçanha, não poderia ser mais firme. A fim de abafar a tentativa galdinista de assumir o poder friburguense, em 19 de agosto de 1916, através do decreto 1.502, o presidente do estado criou a Prefeitura de Nova Friburgo, em contraposição à Câmara, conforme relatava a edição do jornal A Paz de 20 de agosto, nomeando como primeiro prefeito Everard Barreto de Andrade.

Nos seis anos subsequentes, até 1922, ano em que seriam realizadas eleições diretas para prefeito, o Executivo Municipal ainda ficaria sob domínio e liderança do grupo nilista, tendo Everard à frente da prefeitura, e Sílvio da Fontoura Rangel, este deputado estadual com base eleitoral em Vassouras, no comando da Câmara friburguense. 

Galdino passou, então, a liderar campanha pelas eleições diretas para o cargo de prefeito. Outro momento de importante conflito aconteceu em 1919: Galdino Filho conseguiu eleger a totalidade dos vereadores friburguenses e, em represália, mais um recurso no Tribunal da Relação obteve a anulação do resultado. Nilistas mantiveram o domínio do poder local, provocando vários conflitos armados.

Após conquistar as eleições para o Executivo, em 1922, Galdino se elegeu prefeito e depois também deputado federal. Até 1930, seu grupo político comandaria o poder em Nova Friburgo representando, prioritariamente, os empresários e comerciantes que, a partir de 1917, estavam organizados em torno da Associação Comercial e Agrícola de Nova Friburgo, fundada ao final daquele ano.

Nova Friburgo, prestes a completar seu primeiro centenário, já tinha luz elétrica e sua primeira indústria ganharia no segundo artigo do mesmo decreto 1.502 — que criou a Prefeitura — seus primeiros “oito quilômetros de rede de esgotos, abrangendo a área beneficiada pelo serviço de iluminação pública”.

Qual terá sido a intenção de Nilo Peçanha ao sacramentar no mesmo decreto duas decisões tão díspares? Economizar papel é que não foi. Mas certamente quis dar um recado. Qual seria? Quem saberá interpretá-lo ou respondê-lo, 100 anos depois? A política e suas mensagens subliminares se perpetuam ao longo do tempo. E olha que Nova Friburgo só vai fazer 200 anos.

Na mesma ocasião, outras três prefeituras

Além de Nova Friburgo, o presidente Nilo Peçanha criou, na mesma época, as prefeituras de Petrópolis, Paraíba do Sul e Itaperuna. No caso friburguense, no mesmo decreto, em seu artigo segundo, o presidente do estado ousou projetar os primeiros “oito quilômetros de rede de esgoto” da área urbana, seguindo o mesmo trecho beneficiado pela iluminação pública.

A sede da Prefeitura de Nova Friburgo, porém, não foi instalada onde ela está hoje: em 1916, o prédio em que funciona atualmente o Palácio do Governo era ainda o prédio original da estação ferroviária. 

No caso da Câmara Municipal — que foi então o único Poder durante os primeiros 98 anos de existência de Nova Friburgo e cujo vereador mais votado acabava sendo o presidente do Legislativo e, assim, acumulava também funções administrativas —, sua sede, desde a instalação da Vila, ficava no Chateau du Röi (Chatô do Rei), que era a sede da antiga Fazenda do Morro Queimado, e onde atualmente localiza-se o Colégio Anchieta.

Além do Chateau, a sede do poder local teve outras localizações: na rua da cadeia, hoje Monte Líbano; no antigo Externato São José (atualmente Willisau Center, na Praça Dermeval Barbosa Moreira), no Palacete do Barão de Duas Barras (onde hoje fica a UFF) e no Solar do Barão, Praça Getúlio Vargas (onde funciona a Fundação Dom João VI/Pró-Memória). 

Atualmente, a Câmara Municipal está instalada no Palácio Amâncio Mário de Azevedo, na Rua Farinha Filho, e a sede do Poder Executivo municipal é o Palácio Barão de Nova Friburgo, antiga estação ferroviária, na Avenida Alberto Braune, 225, onde está instalada desde o dia 6 de setembro de 1969.

FONTES: Fundação D. João VI/Pro Memória de Nova Friburgo (djoaovi.com.br) / Da “Suíça Brasileira” ao “Paraíso Capitalista”: A Construção da Hegemonia Burguesa em N. Friburgo, Prof. Dr. Ricardo da Gama Rosa Costa/FFSD - História / Marieta de Moraes Ferreira, ‘A República na velha província’ (RJ).

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
TAGS: História de Nova Friburgo
Publicidade