Flip (Festa Literária Internacional de Paraty) de 2016 homenageia, pela segunda vez, uma mulher: a escritora Ana Cristina Cesar. Nascida em Niterói (1952), foi um grande expoente da Poesia Marginal ou Geração Mimeógrafo, movimento que esboçava a contracultura, buscando meios alternativos de divulgação e distribuição das obras produzidas. Neste sentido, seus textos detêm uma estética ímpar, emergindo o insólito do cotidiano e enfatizando as próprias experiências e (des)construções existenciais, através de um discurso, em primeira pessoa, que cultua o instante, o minuto, o momento.
Por meio da imersão que sua escrita proporciona (seja em fragmentos de diário, cartas ficcionais, linhas em prosa e, sobretudo, poemas), temos uma literatura que agride e afaga, uma delicadeza que contrasta com a energia pulsante em sua linguagem. Linguagem esta multifacetária e inesgotável, porque se distende em incontáveis possibilidades, numa espécie de “pacto” entre o eu-lírico e o leitor, produzindo uma literatura que é sempre presente, constante e de múltiplos sentidos.
Em um de seus mais conhecidos poemas, incluído no livro “Os cem melhores poemas brasileiros do século” (Editora Objetiva, 2001), percebemos como o discurso inquieto de si dialoga com o mundo, valendo-se do tom coloquial e fortemente imagético: “olho muito tempo o corpo de um poema / até perder de vista o que não seja corpo / e sentir separado dentre os dentes / um filete de sangue / nas gengivas” (Ana Cristina Cesar, “A Teus Pés”). Suas principais obras são “Cenas de Abril” (1979), “Correspondência completa”, “Luvas de pelica” (1980) e “A teus pés” (1982). Vale ressaltar que, em 2013, a Companhia das Letras publicou o livro “Poética”, uma reunião da produção literária da autora.
Ana Cristina Cesar possuía uma sensibilidade rara e vivenciava inúmeras contradições. Sua figura era enigmática, o que despertava a atenção e conquistava a amizade de várias figuras culturais da época. Em meio a todo o turbilhão poético que a compunha, Ana sofria uma depressão constante e profunda, somada a uma atração pela morte e a um humor, por vezes, instável. Cometeu suicídio em 29 de outubro de 1983, aos 31 anos, atirando-se do apartamento de seus pais em Copacabana, no Rio de Janeiro.
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