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A história da fonte do suspiro - 17 de março 2011
domingo, 31 de julho de 2011
Os olhos de um velho muito se parecem com os de uma criança. Com facilidade eles se enchem de lágrimas e, até, elas podem escorrer pela face abaixo. Na semana passada, de volta de uma “fugida” da poeira de nossa terra, já que nada poderia fazer para ajudar, passei pelo Suspiro e lá no canto, onde por mais de oito décadas pude apreciar a Fonte do Suspiro, não vi nada. Ou melhor, vi um buraco no seu lugar. Confesso que chorei de tristeza com o que vi.
Resolvi recontar aqui a sua história. Presumimos que ela comece logo depois da chegada dos suíços. Há quase dez anos passados aqui, escrevemos que pensávamos que a descoberta da Fonte do Suspiro só pôde ter sido feita por um poeta. Dissemos, quem mais se não um poeta, naquele primeiro quarto do século XIX, inspirado pelo bucólico cenário que ali encontrou, podia ter semelhante pensamento? Provavelmente debaixo de um “azulíssimo” céu daquele tempo, penetrando no bosque que certamente ali existia, deparou-se com o pequeno e ondulante córrego que por entre as pedras descia das montanhas. Paz absoluta. Silencio só quebrado pelo estalar das folhas secas sob seus pés, do cascatear do filete de água e do chilrear dos pássaros, como se tudo formasse uma grande orquestra silvestre. Podemos imaginar aquele suíço, ou português, ou luso-brasileiro, emocionado com tanta beleza, inclinar-se sobre a fonte cristalina, encher o côncavo da mão, beber um gole daquela água quase gelada, aspergir o resto sobre a fronte e batizar: Fonte do Suspiro! Quem mais, senão um poeta?
A primeira notícia sobre o nome “Suspiro” em nossa história data de 7 de setembro de 1837. Naquele dia, Guilherme Salusse pede à Câmara o aforamento das terras existentes entre a “Chácara do Suspiro” e as do Padre Joye. Várias outras referências são encontradas nos livros de atas da Câmara mas, até novembro de 1854, todas elas mencionam, apenas, a “fonte” ou o “córrego” do Suspiro.
Em 8 de agosto de 1846, a Câmara resolveu que se fizesse uma subscrição para a limpeza da fonte e que “com um frontispício de pedra lavrada e bicas de metal fosse construída uma fonte no Suspiro”. Os senhores vereadores Viviand e Balmat foram designados para mandarem levantar a planta e fazerem um orçamento.
Passaram-se os anos e a ideia de uma fonte nos Suspiro e a da subscrição pública para a sua execução, de quando em vez, voltava a ser assunto da Câmara. Mas ficava tudo no “blá, blá, blá”. Finalmente, na sessão de 8 de junho de 1865, um orçamento meticuloso foi apresentado. Custaria a fonte 1:035$000 réis (um conto e trinta e cinco mil réis, diziam na época). A obra foi levada a praça com a condição de que o seu executor, à proporção em que fosse executando a obra, iria recebendo o que fosse arrecadado pela subscrição que se faria e que, no final, a Câmara pagaria o saldo.
Em 30 de agosto de 1865 o vereador Mindelino de Oliveira propôs que a pedra fundamental da Fonte do Suspiro fosse lançada no dia 7 de setembro daquele ano e que a cerimônia fosse cercada de toda a pompa e propôs uma série de formalidades para a cerimônia. Não sabemos se ele esqueceu de convidar São Pedro para a solenidade que, provavelmente pelas chuvas, não foi realizada. O fato é que passou-se o dia 7 de setembro de 1865 e nada consta dos livros de Atas da Câmara sobre o lançamento da dita pedra fundamental que, acreditamos, nunca tenha acontecido.
Em 14 de outubro daquele ano, a Câmara declara já ter arrecadado 720$000 em subscrições para a dita obra e foi votado que este valor fosse entregue ao executor da obra, um senhor Albino Barbosa, contra recibo. No dia 31 daquele mês o senhor Albino Barbosa informa já estarem concluídas as obras da Fonte, faltando apenas a colocação de um vaso de pedra (?).
Finalmente, no dia 2 de dezembro de 1865 foi festivamente inaugurada a Fonte do Suspiro.
Vinte quatro anos depois, em 6 de fevereiro de 1889, o sr. Presidente da Câmara informou ao plenário “que o senhor desembargador Caetano José de Andrade Pinto, proprietário nesta Vila, o procurara manifestando o desejo de fazer, à sua custa, a obra de pedra de cantaria com assentos nos dois lados do Chafariz do Suspiro”. E assim, com a ajuda desse desembargador, completou-se a beleza daquela fonte que, por mais de um século, embelezou a Praça do Suspiro.
Mas os anos passaram. No século passado a febre imobiliária começou a se fazer sentir e a cegueira humana voltou-se, também, para aquele paraíso verde. Uma estrada foi aberta entre as suas matas, ruas foram cortadas no seu alto e prédios foram construídos. A “mais pura água de Nova Friburgo” deixou de existir. Passou a só ser usada para lavagem de automóveis naquela Praça.
12 de janeiro de 2011. A mais violenta das chuvas já caídas na região levou quase tudo para baixo. A encosta por onde um dia desceu a cristalina água da Fonte do Suspiro foi levada de roldão e tudo foi destruído no seu caminho. A Fonte do Suspiro, de saudosa memória, desapareceu.

Carlos Jayme Jaccoud
Um pouco de história
Carlos Jayme Jaccoud é historiador.
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