Um pouco de história da velha Nova Friburgo - 30 de abril a 2 de maio 2011

domingo, 31 de julho de 2011
A história do nosso Rio Bengalas Não sabemos como, e nem quando, surgiu o nome de “Rio das Bengalas” para o nosso rio — nome então dado por abundar em suas margens uma planta cujo caule podia ser utilizado na confecção de bengalas, tão em moda naqueles velhos tempos. O que sabemos é que se tratava de um autêntico rio de planície, cheio de curvas e de alagadiços, desde o seu início na junção dos rios Santo Antônio e Cônego até o ponto em que, na Serra do Catete, se despejava morro abaixo. Nos anos 1990, quando trabalhávamos na construção do Friburgo Shopping, o problema surgido com a cravação de uma das estacas junto à praça nos obrigou a remexer o terreno cerca de dez metros de profundidade. Lá do fundo, junto com a terra retirada vieram seixos rolados o que prova que por ali, há centenas ou milhares de anos passou o Rio das Bengalas. A primeira vez em que vimos a sua presença assinalada foi no plano da Vila de Nova Friburgo encontrado nos arquivos do nosso Pró-Memória. Naquele tempo, no meio da Floresta Atlântica que englobava toda a nossa região, ele era muito mais volumoso e nele havia até um “porto”, o “porto do Dutra”, nome este várias vezes mencionado no segundo livro das Atas da Câmara da Vila de Nova Friburgo. A nossa surpresa pelo aparecimento desse nome nos levou a transcrevê-lo inicialmente como “pasto do Dutra”. A grafia dos secretários de então “eram duras de roer”. Mas, com a sua repetição nas atas daquele tempo nos levou a ver que era mesmo a palavra “porto” que estava escrita e eu passei a imaginar o seu porquê. Embora o rio daquele tempo fosse muito mais largo e volumoso, não podia haver uma explicação para um porto em suas águas. Pensei um bocado e achei uma dica. Por ali, onde hoje está o bairro de “Duas Pedras” e junto à casa de um Antônio Dutra que lá morava, passava pelo Rio das Bengalas o “caminho de Cantagalo”, por onde transitavam as inúmeras tropas de café vindas de Cantagalo e mais os viajantes que para lá, ou para Banquete, iam e vinham. Não havia ali uma ponte sobre o rio. A travessia era feita a vau. Naturalmente, quando o rio estivesse um pouco mais alto e algum viajante não quisesse molhar as botas e as pernas na travessia, lançava mão de alguma canoa pertencente ao Dutra. Talvez, até por gozação, tenha sido este esse o motivo daquele nome. Desde o tempo do início da Vila os ziguezagues do Rio das Bengalas sempre trouxeram problemas para ela. Era só chegar o verão e as copiosas chuvas daquele tempo traziam-lhe enchentes e consequentes estragos. E isto sem falar dos alagadiços do seu entorno e da mosquitada que neles deviam proliferar. A primeira retirada de uma das voltas do Rio Bengalas foi feita junto e antes da ponte do Suspiro, onde hoje se ergue o Clube de Xadrez. Foi feita no governo Bazet, em 1833. Outras vieram mais tarde, como a retificação dos trechos entre a Ponte do Suspiro e a Rua Sete de Setembro e desta até à Chácara do Gambá, em frente à Haga dos nossos tempos. Esta última permitiu, pela encosta do morro, a abertura de um novo trecho do caminho para Cantagalo e um alívio para a Ponte do Suspiro com a retirada das tropas que sobre ela passavam. Ainda no tempo do Império foi retificado o grande trecho entre o início do rio e a Ponte do Suspiro, trabalho este feito pelo governo da Província. Terminaram aí as retificações dentro da Vila. A maior e muito importante delas, de vários quilômetros de extensão, foi feita no século passado pelo DNOS entre a altura da Fábrica Haga até próximo à barragem da Energisa, na Serra do Catete. Com esta última dragagem desapareceu um grande trecho pantanoso que acompanhava o rio e ruas puderam ser feitas nas suas margens (RJ 116). Nova Friburgo, até os anos 30 do século passado, era uma cidade pequena e pouco passava da Praça Paissandu, ao Sul, e da Ponte da Estrada de Ferro, na altura da atual Fábrica Haga, ao Norte. As águas do Rio Bengalas eram limpas e transparentes. Nela havia peixes: os lambaris e os bagres. Nós mesmos, quando meninos, algumas vezes nele fizemos pescarias. Os tempos passaram e a cidade cresceu. O Rio das Bengalas daquele tempo transformou-se no Rio Bengalas de hoje. As administrações municipais passadas não enfrentaram o problema do tratamento dos esgotos da cidade e ele transformou-se no seu coletor geral. Mexer nos esgotos não dava votos. Aquela água transparente de então tornou-se uma água estéril, imunda e fedorenta, situação agravada por passar o rio a ser depósito de lixo dos mal-educados de suas margens. Acendeu-se enfim uma luz no fim do túnel. Neste ano passado os esgotos da cidade começaram a ser coletados e tratados. Esperamos que em breves anos a vida volte às suas águas e os futuros garotos da nossa cidade possam nele pescar os seus lambaris.
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Carlos Jayme Jaccoud

Um pouco de história

Carlos Jayme Jaccoud é historiador.

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