Que me desculpe o jornalista Rodrigo Pinto, em seu artigo Pancadão na democracia, quando cita os que abominam tal ritmo, classificando-os de filhotes da ditadura. Mas o mesmo se mostra tão alienado quanto os frequentadores e adeptos de tal diarreia musical ao tentar defender músicas sem melodia, cujas letras são de uma baixaria sem limites que ao fazerem a alegria de uma meia dúzia de alucinados, incomodam e ferem o bom gosto de uma maioria. Querer chamar de arte, expressão cultural, músicas que incitam a violência, o sexo e as drogas é brincadeira.
O citado jornalista e os adeptos desse som alucinado e desvairado esquecem uma lei fundamental da convivência humana, que diz: “O direito de uma pessoa termina quando começa o de outrem”. Exigir das pessoas que trabalham a semana inteira e querem paz e sossego nos seus fins de semana a convivência pacífica com um som ensurdecedor, em flagrante desrespeito à lei do silêncio, é querer demais.
É de uma candura suspeita afirmar que esses bailes “animam uma centena de jovens numa só noite” e omitir que nesses mesmos locais o consumo de álcool e drogas muitas vezes termina em morte; isso sem falar do risco de provocar surdez e doenças nervosas, um complicador a mais. Não são poucos os convites que seduzem os jovens para festas de funk que duram o dia e a noite inteira; nesses locais, o som muito alto e constante tem o poder de anular reflexos e a capacidade de discernimento, o que torna muitos jovens presa fácil de pessoas inescrupulosas.
Rodrigo Pinto esquece que existem pessoas, e felizmente não são ainda a minoria, de bom gosto musical e com capacidade e visão intelectual para discernir entre o aproveitável e o imprestável; entre o lixo e as obras de bom gosto ou aceitáveis. O problema é que, ao fugirem da mediocridade e externarem publicamente suas opiniões, provocam reações daqueles acostumados ao mau gosto.
É um erro querer imputar aos moradores das favelas um amor por tais ritmos. Naqueles morros em que impera a lei do tráfico, o poder de escolha das pessoas de bem fica à mercê dos traficantes, portanto, não serve de parâmetro. Por outro lado, quando o espetáculo é de boa qualidade e o cidadão tem o poder de opção, o povão sempre prestigia, haja vista a frequência de público dos concertos de música clássica na Quinta da Boa Vista.
Outro erro é querer imputar à polícia o direito de vetar tais espetáculos. Como em todo o estado de direito a polícia cumpre ordens superiores, não agindo por conta própria, a não ser se houver ameaça iminente à ordem pública. Se houve veto a um baile funk no Circo Voador, esse veto certamente não partiu de nenhum comandante da Polícia Militar. Por outro lado, ao subir os morros para acabar com uma festa funk, financiada pelo tráfico, a incursão policial poderá provocar morte de inocentes, prato cheio, no dia seguinte, para a imprensa sensacionalista.
O estado tem a obrigação de zelar pelo bem-estar da população, principalmente no que se refere à saúde, educação e segurança. Sempre que esse tripé for ameaçado, o cidadão tem o direito de reclamar e exigir que esses princípios sejam respeitados. O cumprimento desse preceito é atribuição das autoridades. Azucrinar o ouvido e a paciência dos outros é falta de cidadania e, principalmente, falta de educação.
Max Wolosker Neto, médico e jornalista.
E-mail: woloskerm@gigalink.com.br
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