Vila Amélia: um lugar de memória

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015
Foto de capa

Durante cinco décadas, o lindo palacete localizado no bairro Vila Amélia abrigou a delegacia e a carceragem de Nova Friburgo. A fim de atender à requisição da Promotoria de Proteção aos Interesses Difusos e Direitos Coletivos, foi realizada em dezembro de 2001 uma perícia na cadeia pública de Nova Friburgo, junto às dependências da 151º Delegacia de Polícia. Foi o primeiro trabalho técnico de perícia criminal realizado para auxiliar na remoção da cadeia do município de Nova Friburgo. Eram dez celas na carceragem.

No exame das celas para avaliação de suas condições, uma pequena área interna contendo um vaso sanitário sobre o qual era igualmente local de banho e lavagem de roupas dos detentos. Por serem as grades das celas recobertas em sua maior parte por chapas metálicas, prejudicava a ventilação. A cobertura das celas por laje de cimento sem nenhuma outra proteção produzia um aquecimento brutal em dia de sol. A temperatura interna das celas chegava a 38°C.

Em todas as celas uma forte umidade com mofo intenso devido ao limo nas paredes sempre úmidas e gotejamento no teto. Apesar das celas serem muito pequenas dentro delas ficavam guardados todos os materiais pessoais, higiênicos, alimentares, diminuindo ainda mais o espaço existente. Os detentos tinham direito a uma hora de banho de sol por dia e o restante do tempo permaneciam trancados dentro das celas durante vinte e três horas. Tendo em vista os dados colhidos pelo Instituto de Criminalística Carlos Éboli a forma de detenção de presos na cadeia de Nova Friburgo foi considerada altamente insalubre e lesiva a saúde física humana.

Nunca se poderia imaginar que um local de tão sombrio e tenebroso tivesse sido no passado um dos mais aprazíveis da cidade, uma linda chácara de pera ferro de um imigrante português. Em princípios do século 20, a Vila Amélia pertencera ao casal português Antônio e Carolina Pinto Martins. Pais de sete filhos, seis homens e uma mulher, a única filha da família, Amélia, é quem daria o nome a charmosa chácara de Nova Friburgo: Vila Amélia. Antônio Pinto Martins tinha comércio no Rio de Janeiro, a firma Pinto & Martins e mudou-se para Nova Friburgo investindo em uma chácara, no ramo de hortifrutigranjeiros.

A chácara do português Antônio Martins era exatamente onde hoje é o bairro da Vila Amélia. Predominava na chácara plantação de peras ferro, mas havia igualmente plantação de macieiras, morangos, aspargos, entre outros produtos. Martins trouxe de Portugal uma árvore que florescia a “flor de tojo”, cujo pólen servia para o seu apiário. O seu mel era o mais apreciado na cidade.

O Córrego do Relógio, que passa pelo atual bairro da Vila Amélia, era circundado por videiras que produziam as mais saborosas uvas de Nova Friburgo. As videiras desciam pelo córrego sobre uma pérgula de ferro e forneciam sombra aos que por ali passeavam nos dias de sol causticante. Na chácara da Vila Amélia, os Martins recebiam pessoas importantes da cidade. Os que passeavam pela Praça do Suspiro geralmente percorriam as margens do Córrego do Relógio apreciando suas videiras até alcançar a chácara de Antônio Martins para adquirir o seu famoso mel ou as deliciosas peras ferro, já que a sua chácara atraía a atenção dos veranistas. Todas essas descrições são recolhidas de um cronista da época.

O prédio da antiga chácara tem mais de 100 anos e é de propriedade da Afape — a Associação Friburguense de Pais e Amigos do Educando. Foi alugado pelo governo do estado por mais quase 50 anos para servir de delegacia e de carceragem. Como o Instituto de Criminalística Carlos Éboli condenou as suas instalações para servir como delegacia e carceragem, devolveu-o a Afape.

Infelizmente, esse órgão não possui condições financeiras para restaurar e manter esse imóvel histórico. A Afape tinha intenção de construir um condomínio residencial na antiga chácara, mas por ter sido esse imóvel objeto de um tombamento provisório por parte da prefeitura municipal não pode levar adiante esse projeto.

Visitando o lindo prédio da antiga chácara, não obstante ter sofrido algumas reformas grotescas, ainda nos deparamos com algumas preciosidades: O vitral que se estende pelos dois pavimentos, a imponente escada de madeira ainda bem conservada e alguns azulejos, semelhantes ao da  chácara do chalet, no Country Clube. Esse lindo prédio da Vila Amélia é de fato, um lugar de memória.  

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Janaína Botelho

Janaína Botelho

História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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