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Pula a fogueira, Iaiá
Uma das origens da fogueira da festa junina, julga-se, é que Isabel teria acendido uma fogueira para avisar Maria sobre o nascimento de seu filho, que mais tarde seria o nosso conhecido São João Batista. Assim, Maria poderia auxiliá-la nos cuidados pós-parto. No entanto, diz o Wikipedia que isso é uma mera adaptação católica da verdadeira origem — pagã, inclusive — da festa junina: uma celebração ao solstício do verão. Assim como o Natal se tornou uma tradição católica a partir de uma festa pagã — o solstício de inverno, olha que coincidência —, a fogueira do "Midsummer” foi virando fogueira de São João, nascido em 24 de junho — viradinha de estação, outra coincidência. E entre fogueiras e salsichões no espeto, São João já completou uma porção de aniversários.
Meu primeiro par de quadrilha, a dança típica das festas juninas, foi um menino chamado Clinger, lá no Jardim Escola Quem Me Quer. Nunca entendi os chamamentos em francês numa festa caipira, logo, deduzi que os franceses, justo os aristocratas a quem a classe média brasileira queria imitar, eram todos caipiras. Éramos crianças vestidas com o menor aprumo possível, num esforço pueril de nossos pais a nos transformar em pequenas criaturas cafonas. Num mundo de crianças vestidas de saias rodadas e remendadas, acender fogueiras pode ser um apocalipse. Então, as tias, de saias ainda mais rodadas, nos brindavam com fogueirinhas de papel celofane, enquanto subia aos céus a fumacinha das grandes comilanças: mesmo sem fogueira de fato, a gente era feliz e não sabia.
Tanto me marcou a tradição das festas de São João — até porque, aos seis anos eu jamais saberia falar "solstício” —, que ao ter meu filho mais velho, Guilherme, em junho de 2003, não tive dúvida alguma sobre o motivo de sua primeira festa de aniversário. A varanda da pobre casa foi tomada por bandeirolas, meio murchas, é bem verdade, mas repletas de sentimentos. Fizemos cachorro-quente pela facilidade, porque nos meus sonhos eu teria feito cocadas, broas de milho, quentões e milhos cozidos banhados em manteiga de garrafa. Todas as menininhas usavam vestidos de roda, os meninos tinham seus dentes pintados de Jordana preto. Quis o destino e as tabelinhas mal-feitas que o filho do meio, Alexandre, nascesse também em junho, bem pertinho do irmão. E repeti com ele a comemoração de balancês.
De algum modo, com a geração mais nova, me transportei aos anarriês e alavantus de antigamente, e dei algo de bonito para meus filhos em seus primeiros anos de vida: a pura nata das mais lindas tradições brasileiras. Acendi minha fogueira para o mundo, esperando que ele me ajude no pós-parto de Guilherme e de Alexandre. E, tal qual São João, a quem se celebra nos meses de junho, é em clima de bandeirolas verdes e amarelas que espero uma dádiva: que também eles completem uma porção de aniversários. Que também eles mantenham viva a beleza da nossa rica história brasileira. E que pulem, como eu, muitas fogueiras. De solstícios ou de São João.
Ana Blue
Blue Light
O que dizer dessa pessoa que a gente mal conhece, mas já considera pacas? Ana Blue não tem partido, não tem Tinder, é fã de Janis Joplin, parece intelectual mas tem vocação mesmo é pra comer. E divide a vida dela com você, todo sábado, no Blue Light.
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