Bom Jardim: um diálogo com a história de Nova Friburgo - Última parte

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Na semana passada discorremos sobre a formação do município de Bom Jardim, que se desmembrou da Magna Cantagalo por conta da retaliação que sofreu esse município monarquista por parte dos republicanos. Destacaram-se na República Velha, em Bom Jardim, os coronéis Luiz Corrêa da Rocha Sobrinho, Eugênio José Erthal e Antônio José Maria Monnerat. Porém, a liderança política era do coronel Luis Corrêa da Rocha Sobrinho (1863-1947), descendente de um dos primeiros sesmeiros da região. O seu avô, Mathias Corrêa da Rocha, possivelmente foi um dos primeiros a obter sesmarias nos Sertões do Macacu (Cantagalo), a exemplo das fazendas Santa Bárbara e Nossa Senhora da Soledade. O seu pai chegou a possuir 25 fazendas no noroeste fluminense. Mas sua maior propriedade era a histórica Fazenda Bom Jardim, que deu nome ao município, igualmente uma das primeiras sesmarias daqueles sertões. Sua fazenda dispunha de catadores, brunidores, descascadores e separadores movidos por motor hidráulico. A torrefação de café possuía os aparelhos mais modernos, que beneficiavam 80 arrobas desse produto diariamente. Quando o general norte-americano John Pershing veio ao Brasil, desejando conhecer o cotidiano de uma fazenda de café na velha província fluminense, foi a fazenda Luís Corrêa da Rocha Sobrinho a indicada a visitar. Na tentativa de lidar com o problema da falta de mão de obra, devido ao fim da escravidão, Corrêa da Rocha contratou colonos chineses para trabalhar em suas propriedades. Uma lei estadual de n° 26 de 14/11/1892 incentivava a contratação de chineses e japoneses em número de 100 a 120 mil. Anualmente, deveriam entrar no país entre 10 a 20 mil chineses das etnias Hakka e Punti. No final de 1893, os chineses foram objeto de curiosidade numa parada na estação de trem, em Nova Friburgo, ficando o fato registrado na imprensa local. Os chins, como eram chamados, iriam trabalhar em um engenho de propriedade da família Corrêa da Rocha.

Luis Corrêa da Rocha Sobrinho foi vereador nos períodos de 1894-95 e 1901-1907, sendo presidente da Câmara em dois triênios. O seu sucessor na política foi o seu filho Péricles Corrêa da Rocha. Antes da reforma constitucional de 1920, a administração municipal era exercida pela Câmara Municipal que tinha poderes legislativo e executivo. A Lei 1.670/20, regulamentada pela lei orgânica das municipalidades (Lei 1.734/21), introduziu a figura do prefeito e a partir de então a Câmara Municipal possuía apenas o Poder Legislativo, ficando o Poder Executivo a cargo do prefeito. Péricles Corrêa da Rocha foi o primeiro prefeito de Bom Jardim, exercendo mandato no período de 1922 a 1927. Exerceu, outrossim, o mandato de deputado estadual nos anos de 1927 e 1928. A economia de Bom Jardim girava em torno da cultura do café e da lavoura branca. Em 1920, produzia 5.000 toneladas de café, 30.000 sacos de feijão, 20.000 de milho e 8.000 de arroz. O desenvolvimento da infraestrutura de Bom Jardim deve-se aos Corrêa da Rocha. A energia elétrica chegaria ao município em 1917. Inicialmente, a luz elétrica foi instalada nas fazendas locais, mas posteriormente foi criada a Companhia de Eletricidade, a "S.A. Luis Corrêa”, de propriedade de Corrêa da Rocha. Deve-se a Péricles a instalação dessa companhia nesse município. A cachoeira da Fazenda Bom Jardim e outras cachoeiras no curso do rio São José, serviram a companhia elétrica. Parece-nos ter contado com a consultoria de Julius Arp, industrial alemão e proprietário de uma empresa similar em Nova Friburgo. Péricles instalou igualmente em Bom Jardim a fábrica de confeitos Busi. Os Corrêa da Rocha, típicos coronéis da República Velha, sofrerão um baque político na Revolução de 30. Na ocasião da revolução, Péricles Corrêa da Rocha era prefeito de Bom Jardim. Exercendo mandato entre os meses de janeiro e outubro foi deposto assumindo a Junta Governativa. Mas essa reviravolta na política beneficiaria o desenvolvimento em outra região, Itaocara, outrora distrito de Cantagalo. Em 1896, a falida Companhia Engenho Central Rio Negro fora adquirida por Luis Corrêa da Rocha dos filhos do Barão de Nova Friburgo, entre outros sócios. Será na gestão de Péricles que o Engenho Central do Rio Negro irá desenvolver-se enormemente, tornando-se um "Estado dentro de um Estado” na região, inclusive com moeda própria. Péricles administrou o engenho no período de 1930 a 1956, modernizando a empresa e colocando-a entre os maiores engenhos de beneficiamento de açúcar do país. Passando a se chamar Engenho Central Laranjeiras, essa empresa provocaria uma imigração em massa de trabalhadores para a região, mormente de mascates árabes. Em 1943, Bom Jardim passou a denominar-se Vergel, mas quatro anos depois retorna ao seu nome original. É lamentável que a história desses atores históricos esteja esmaecida e seja desconhecida até em Bom Jardim. Pesquisar a história de Nova Friburgo, dialogando com essa rica história regional, deve ser o ofício dos historiadores locais.

 

Janaína Botelho é professora de História do Direito na Universidade Candido Mendes e autora de diversos

livros sobre a história de Nova Friburgo. Curta no Facebook a página "História de Nova Friburgo”

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Janaína Botelho

História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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