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Os povoados da Magna Cantagalo
Cantagalo: berço do Centro-Norte Fluminense—Parte VI
Alguns núcleos de povoamento foram se desmembrando de Cantagalo no decorrer do século XIX: Santa Maria Madalena, Carmo, Duas Barras, São Sebastião do Alto, Itaocara, etc. Com exceção de Sumidouro e parte de Bom Jardim, que eram freguesias de Nova Friburgo, todas eram povoações pertencentes à Magna Cantagalo. As povoações de antanho passavam por três fases administrativas: Capela, Curato e Freguesia. Se possuíssem mera Capela assistida por um capelão, denotava ser o lugar de pouca importância. Promovidas a Curato, sob a tutela de um Cura, um padre visitante, essa condição lhe dava maior dignidade, podendo no local, a partir de então, serem efetuados os registros de nascimento, casamento e óbito, competência àquela época pertencente à Igreja. Já a condição de Freguesia ou Paróquia era outorgada a comunidades mais expressivas.
Itaocara, antiga Aldeia da Pedra, foi fundada por Capuchinhos italianos que objetivavam catequizar os índios que habitavam a região. Durante dez anos Itaocara pertenceu a Cantagalo, mas foi desmembrada para fazer parte de Campos, para ulteriormente voltar a fazer parte de Cantagalo até se tornar independente. Quando Itaocara for erigida à categoria de município, será de Cantagalo que irá tirar a maior parte de seu território. Com relação a Carmo, a uberdade de seu solo e a altitude propícia à cultura do café, somado a sua proximidade com o Porto do Cunha (MG), cujo intercâmbio com a cidade mineira era intensa, favoreceu o seu crescimento. O arraial do Carmo surgiu em 1832, mas sua ocupação remonta ao final do século XVIII. Em 1846, a localidade foi elevada à categoria de Freguesia sob a invocação de Nossa Senhora do Carmo. Com relação a Duas Barras, foi na fazenda Tapera que, em 1835, o padre Francisco José de Oliveira doou um lote para a construção da capela. Foi elevada a Curato em 1836 e Freguesia em 1856, tudo isso sob a invocação de Nossa Senhora da Conceição das Duas Barras do Rio Negro. Duas Barras foi outro grande produtor de café, geraria o aristocrata Barão de Duas Barras, cuja família nos legaria sua belíssima residência em Nova Friburgo, onde atualmente se localiza a Faculdade de Odontologia.
Foi a estrada Cantagalo-Macaé—local por onde passava intenso tráfico de escravos que desembarcavam no Porto de Macaé clandestinamente, já que o tráfico estava proibido desde 1831—que originou a ocupação de Santa Maria Madalena. Aventureiros começaram a explorar terras devolutas e incultas e por volta de 1840 o padre Frouthè doou terras à comunidade para a construção da capela de Santa Maria Madalena, dando nome ao lugar. Foi elevada a Curato em 1851 e a Freguesia em 1855, logo se destacando como um dos principais centros agrícolas de Cantagalo. Já São Sebastião do Alto de Cantagalo inicia sua ocupação ao final do século XVIII, quando garimpeiros buscavam ouro nos rios Negro e Grande, que a circundam.
No entanto, somente em 1852 foi elevada a Curato e em 1855, a Freguesia. A prosperidade da freguesia de São Sebastião do Alto ensejou a formação do que se poderia denominar de “aristocracia cafeeira altense”, integradas por opulentos fazendeiros de café, a exemplo do Barão de Rimes e o Barão de Castelo. Esses são apenas alguns exemplos dos povoados que foram surgindo ao longo do século XIX e que passaram por fases como Capela, Curato e Freguesia, todas pertencentes à Magna Cantagalo.
É interessante destacar que todos esses antigos povoados levam a designação de um santo em sua formação. Os municípios que perderam tal designação foi em razão do deslocamento da importância de uma localidade para outra, que não tinha nome de santo, a exemplo de São José do Ribeirão, que perdeu em importância para a outrora fazenda Bom Jardim. Outro motivo foi a vontade política, a exemplo de Trajano de Moraes, que se chamava São João Batista da Ventania, perdendo essa denominação por veleidades políticas. Por isso, apenas alguns municípios não levam o nome de seu Orago. O caso de Nova Friburgo é atípico. Já nasceu vila sem passar pelo trâmite Capela, Curato e Freguesia. Mas isso ocorreu em razão de um sistema especial, pois foi a primeira experiência encetada no Brasil de um núcleo colonial baseado na organização do trabalho empregando mão de obra livre.
Foi o primeiro governador republicano do Estado, Francisco Portela, que resolveu punir e esfacelar o território da monarquista Cantagalo em vários municípios autônomos, com o propósito de enfraquecê-la politicamente. Francisco Portela objetivava na divisão político-administrativa do Estado dar origem a currais eleitorais submissos a ele. A monarquista Cantagalo foi um dos municípios mais afetados por essa fúria separatista que teve seu território retalhado em várias unidades políticas autônomas, a saber: Itaocara, Duas Barras, Cordeiro, Macuco, etc. Com o retorno da antiga oligarquia rural ao poder, Cantagalo recuperaria alguns desses territórios, mas a sua área ficou reduzida a menos de um terço da original. A Magna Cantagalo se desintegra ao final do século XIX. Cantagalo pagava um preço alto por ter sido um território de monarquistas e a alcova de escravocratas. Na próxima semana “Os barões do café”.
Janaína Botelho é professora de História do Direito na Universidade Candido Mendes e autora do livro “História e Memória de Nova Friburgo”. historianovafriburgo@gmail.com

Janaína Botelho
História e Memória
A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.
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