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Memória sobre o nazismo em Nova Friburgo - 21 de julho 2011
Nascido na Alemanha em 19 de abril de 1911, Johannes Edward Schlupp fez sua formação inicial e cursou Teologia em sua terra natal. Ainda muito jovem foi solicitado a assumir o trabalho evangélico no Brasil. Aprendendo o português, chegou ao país em 1933, trabalhando inicialmente como pastor auxiliar de uma comunidade evangélica em Petrópolis. Nessa ocasião, pouco antes da Segunda Guerra Mundial (1939-45), havia uma comunidade luterana em crise e dividida em razão de divergências quanto ao nazismo: a de Nova Friburgo. E foi para lá que Johannes Schlupp foi encaminhado para apaziguar os ânimos entre os luteranos. O proselitismo em relação ao nazismo gerava tensões em Nova Friburgo entre a comunidade evangélica luterana. O nacionalismo alemão, através do partido nazista, conseguira tirar a Alemanha da crise em que se encontrava. Em 1933, mais de um terço da mão de obra ativa encontrava-se desempregada gerando uma miséria no país a níveis nunca anteriormente alcançados. Um regime que propusesse o bem-estar geral e tirasse a Alemanha da crise, somente poderia lograr êxito. Daí o prestígio de Adolf Hitler. Segundo o Pastor Schlupp, foi a infiltração de pessoas com ideias absurdas, a exemplo do racismo, que levou a Igreja Luterana a entrar em conflito com o partido nazista. Essa celeuma se refletiu em toda a comunidade internacional luterana e se estendeu a Nova Friburgo, provocando um cisma entre os evangélicos. Existia no município a “Deutscher Schul und Kirchenverein”, ou seja, a Sociedade Alemã da Escola e Culto. Em razão das divergências em relação ao nazismo, houve uma cisão dessa sociedade que originou outra pró-nazismo, denominada Sociedade Alemã. Com a separação, a Deutscher Schul und Kirchenverein abandonou o nome alemão e adotou a designação de Sociedade Esportiva. As duas sociedades separaram inclusive as duas escolas alemãs. Uma funcionava na Av. Rui Barbosa e a outra antes da Ponte da Saudade. Essa animosidade atingiu a comunidade evangélica ao ponto de não se cumprimentarem e igualmente os poderosos industriais alemães estabelecidos em Nova Friburgo. De um lado, estavam os proprietários das Fábricas Arp e Filó, o Conselheiro Julius Arp e Otto Siems, além de Hans Gaiser, contrários ao movimento nazista. De outro estava Maximilian Falck, apoiando a dissidente Sociedade Alemã, recém-formada e que defendia de forma incondicional o Partido Nazista. A Sociedade Alemã se estabeleceu na Rua Gal. Câmara (atual Augusto Spinelli), onde atualmente funciona a Secretaria de Promoção Social da PMNF. Esse prédio, no decorrer da Segunda Guerra, seria desapropriado dos alemães pelo governo. Foi essa a situação encontrada em Nova Friburgo pelo jovem Pastor Schlupp, que conseguiu apaziguar os ânimos e minimizar as tensões entre os luteranos. Sua orientação para a união dos evangélicos luteranos foi a de que deveriam ficar afastados da política interna da Alemanha e manter-se unidos em razão de possuírem a mesma cultura, tradição e professarem o mesmo credo. Foi graças ao seu êxito, contemporizando os dois lados, que Julius Arp solicitou para que ficasse e garantisse a paz obtida. E de oito semanas, tempo previsto para sua permanência, o jovem pastor Johannes Schlupp permaneceu 44 anos em Nova Friburgo, onde se casou e constituiu família.
O estabelecimento dos industriais alemães em Nova Friburgo, a partir de 1910, auxiliou em muito a desassistida comunidade alemã. Nova Friburgo era uma cidade pacata de veraneio quando o Conselheiro Julius Arp obteve a concessão do fornecimento de energia elétrica para garantir a energia necessária para as indústrias que seriam instaladas. Os primeiros colonos alemães que vieram para a então vila de Nova Friburgo, em 1824, não tiveram, como os suíços, o auxílio de uma assistência filantrópica. Na Praça do Pelourinho, atual Marcílio Dias, os luteranos construíram um templo modesto, que foi demolido posteriormente pelas autoridades locais. Em 1856, foi construído outro templo de pau a pique, mas era proibido dar o aspecto de igreja aos templos protestantes. Não poderia haver torres, sinos ou qualquer símbolo de seu credo e a fachada deveria ser idêntica a de uma casa residencial. Foi essa construção tosca que o jovem Pastor Schlupp encontrou quando chegou a Nova Friburgo. Mas os industriais alemães deram mais dignidade aos luteranos estabelecidos no município, até porque professavam a mesma crença e frequentavam os mesmos templos. Todos os técnicos trazidos da Alemanha e suas famílias eram igualmente luteranos. Em junho de 1952, foi inaugurado um novo templo na Av. Galdino do Vale Filho à altura dos novos ilustres frequentadores. O antigo templo foi vendido aos metodistas.
A trindade teutônica formada por Julius Arp, Maximilian Falck e Otto Siems, bem como Hans Gaiser auxiliaram, além da construção do templo, na melhoria do cemitério e em várias obras assistenciais. Quando faleceu o filho do Pastor Sauerbronn em 1824, o infante foi impedido pelo vigário Jacob Joye de ser enterrado no cemitério da vila, e foi-lhe reservado um local no morro, onde hoje se localiza o cemitério dos luteranos. Era um local ermo na ocasião e desde então nunca mereceu a atenção das autoridades municipais. Com o auxílio desses industriais o cemitério luterano teve uma grande reforma, com a duplicação de sua área e pavimentação de seu acesso. Mas quando a Segunda Guerra Mundial eclodiu e o Brasil entrou na guerra, muitos alemães em Nova Friburgo foram presos e levados para Niterói. O Pastor Schlupp os acompanhou. Os cultos e as reuniões dos luteranos foram proibidos. Casamentos e batizados deveriam ter autorização expressa. Foi uma época difícil para os alemães, apesar de grande parte deles ser de nacionalidade brasileira. Como vimos, o jovem Pastor Schlupp tinha muitos motivos para permanecer em Nova Friburgo por mais de quatro décadas para proteger a suas ovelhas.
Janaína Botelho
História e Memória
A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.
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