Praças públicas - função higiênica e espaço de socialibidade

sábado, 31 de julho de 2010

Na semana passada fui convidada pela Associação de Engenheiros e Arquitetos para participar do programa Hora Técnica, exibido na TV Zoom. O assunto foi sobre as praças, contando com a presença do arquiteto Luiz Cláudio, responsável pelo projeto urbanístico das praças da cidade. A mencionada associação conta atualmente com um presidente, José Augusto Spinelli, que para nossa sorte gosta de história e por isso o assunto “praça” foi abordado numa linha de tempo passado e presente. Nossos antepassados nos legaram muitas praças: A Praça Getúlio Vargas, Praça Paissandu, Praça do Suspiro, Praça da Alegria (atual pátio da Prefeitura), que ficava na entrada da vila, e por último a Praça Cantagalo (depois Primeiro de Março), localizada na vilagem. De todas as praças, a única extinta foi a Praça da Alegria, desapropriada a pedido de Bernardo Clemente Pinto para se transformar em estação de trem. Mas por que Nova Friburgo possuía tantas praças em um exíguo perímetro urbano?

No século XIX, grassam em todo país epidemias de febre amarela, cólera e varíola. Atribuía-se essas doenças aos miasmas, emanações pútridas que se desprendiam de animais e vegetais em decomposição, corrompendo o ar atmosférico e desencadeando diversas doenças. Os médicos higienistas acreditavam que as doenças vinham do ar, pois a descoberta dos micróbios só aconteceria em 1862, mas levaria algum tempo para ser difundida e aceita. Preconizava-se o plantio de árvores e boulevards nas vilas e cidades para higienizar o ar “corrompido” pelos miasmas. Logo, as praças públicas, os passeios como eram denominados, tinham muito mais uma função de atender a uma política pública higienista do que se tornar um espaço de sociabilidade. Basta uma leitura do Código de Posturas de 1848 de Nova Friburgo, para perceber que a Câmara estava muito mais preocupada com a salubridade da vila do que propriamente com o lazer de seus habitantes.

A rigor, a primeira praça foi a Praça Paissandu, anteriormente denominada de Praça do Pelourinho, pois sempre que uma vila era instalada, se estabelecia “pelouros de justiça”, um ato simbólico da demonstração da autoridade real. Já a Praça Getúlio Vargas, outrora Princesa Izabel, homenagem que o município lhe fez em virtude de uma visita da princesa à vila, somente a partir de intervenção do arquiteto e paisagista Glaziou começou a ser de fato frequentada. No entanto, durante todo o século XIX, o comportamento rural fazia com que a população, transgredindo as posturas, fizesse dessa praça pasto de animais. De todas as praças a mais frequentada no século XIX foi a Praça do Suspiro. Deve-se ao fato da existência da fonte do suspiro, que além do romantismo que dela se evocava, “amor, saudade e ciúme”, acreditava-se no poder curativo de suas águas, fazendo lenir as dores dos que sofriam e “ressuscitava os quase-mortos”. Dizia a lenda que quem bebesse da Fonte Encantada do Suspiro a ela se prenderá por toda a vida! O viajante que bebia de sua água, certamente voltaria a Friburgo, porque a saudade lhe encheria o coração. O dia 2 de dezembro de 1865, data do aniversário natalício de D. Pedro II, foi escolhido para a inauguração da Praça do Suspiro, completando ela 145 anos em dezembro próximo. Quando da abolição da escravidão, recebeu o nome de Praça 13 de Maio, mas não se sabe por que em algum momento da história essa praça perdeu esse nome.

A teoria microbiana derrubou a teoria dos miasmas, ou seja, descobriu-se que as doenças provinham dos micróbios e não do ar, e as praças públicas no século XX prestam-se tão somente a espaços de sociabilidade. Atualmente, devido ao efeito estufa, nos parece que as praças voltam a sua função originária de higienizar a cidade, minimizando o impacto de poluição do ar e melhorando a qualidade de vida dos que vivem nas cidades. Mas há muito que fazer. Além de preservar as praças que nossos antepassados nos legaram no centro da cidade, não devemos nos esquecer das praças dos bairros periféricos como Olaria, Cônego e Conselheiro Paulino e criar novas, como no bairro de Mury. Finalmente, Gilberto Freyre nos informa que os homens brasileiros, à maneira dos gregos, gostavam das camaradagens fáceis e ligeiras da rua e da praça pública. Era na rua e na praça pública que discutiam política e realizavam negócios ou transações. Em Nova Friburgo, depois do trem, as praças estão sempre na memória das pessoas, o que demonstra a sua importância como espaço de sociabilidade.

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Janaína Botelho

Janaína Botelho

História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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