Este ano não vai ser igual àquele que passou...

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015
por Jornal A Voz da Serra
Este ano não vai ser igual àquele que passou...
Este ano não vai ser igual àquele que passou...

Vinicius Gastin

Depois de alguns anos afastado da folia, o meu avô voltou a assistir um desfile na Avenida Alberto Braune, em 2014. Ou, pelo menos, sentir. Com apenas 5% da visão plena, já não consegue identificar o colorido das alegorias, das fantasias e demais particularidades do carnaval. No entanto, ao ‘sentir’ a entrada da Vilage no Samba na avenida, não conteve a emoção. O grito da águia no primeiro carro alegórico anunciava a entrada da verde e branco, e o sinal sonoro foi o suficiente para que algumas lágrimas escorressem em seu rosto.

Ao final do desfile, converso com ele. Pergunto se gostou. Sem titubear, responde: "Gostei muito, estava impecável! Só perde se for roubada”. Com uma boa dose de exagero e paixão, meu avô, que já não consegue ser tão preciso na captação de imagens, certamente enxergou com a alma, o coração e as lembranças. Em sua cabeça, passou um filme de quando era criança, em meados de 1940. À época, morador do bairro Vilage, jogou pelo time de futebol amador de mesmo nome e ajudou a fundar a Escola de Samba. Uma paixão que ele construiu e desenvolveu com as próprias mãos.

Passado um ano, vem a confirmação de que apenas a Unidos da Saudade vai estar na Avenida Alberto Braune neste domingo, 15. Para o meu avô, esse carnaval não será o mesmo. O verde e branco não vão colorir as passarelas, assim como não vão desfilar o vermelho e branco da Imperatriz de Olaria e o azul da Alunos do Samba — e podemos incluir Prado e Amparo nesta lista. Um vazio difícil de ser preenchido.

Polêmicas à parte — e todas as acusações merecem ser devidamente investigadas, até mesmo para descobrir se existe algo irregular no carnaval de Nova Friburgo e há quanto tempo — quem perde é a cidade. Nós, população, somos o maior réu e sem direito a defesa. Nova Friburgo tem uma particularidade em relação aos outros municípios: as nossas instituições fazem parte da nossa história, rica como nenhuma outra. Quantas famílias surgiram a partir de encontros durante ensaios e preparativos nas escolas de samba? Ou nos campos de futebol, aos domingos, no tempo do amadorismo? Ou mesmo nas fábricas ou bailes antigos? 

Os blocos de rua são importantes e compõem esse cenário carnavalesco. Mas as escolas representam o sentimento único para quem bate no peito e diz com orgulho que é friburguense. Tudo isso sem citar os trabalhos sociais, a geração de empregos e o trabalho em comunidade — algo cada vez mais raro nestes novos tempos. Infelizmente, estamos perdendo as raízes. Evoluir e modernizar não significa perder a identidade. E qual será a nossa a partir de agora?

Não sei de quantos carnavais meu avô ainda poderá participar. São 87 anos de idade, e muitos deles dedicados à sua grande paixão: a Vilage no Samba. E do mesmo modo existem os apaixonados pela Imperatriz, Alunão, Saudade, Amparo e Prado. Eles dedicaram uma vida a estas agremiações, e hoje são incomodados pelo barulho ensurdecedor do silêncio em pleno período da folia. Todos nós estamos órfãos, e temerosos quanto ao futuro. O que será do nosso Carnaval? Ao invés de preservar as raízes e plantar novas sementes, estamos devastando a nossa história. 

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