Texto: Ana Borges / Fotos: Lúcio Cesar Pereira
[Por que resistimos tanto em reconhecer, umas nas outras, o nosso valor? Porque somos desunidas, preconceituosas, ou sei lá o quê? Em que estamos errando? Bom, talvez não seja por nada disso, ou por tudo isso.]
Esta questão desperta a curiosidade de considerável parcela do eleitorado feminino, que no Brasil representa 52% do total — o mesmo percentual de Nova Friburgo. É a velha e batida história: a mulher ainda é vista como esposa, mãe, dona de casa. Entramos no mercado de trabalho há apenas um século. Há um longo caminho pela frente e muitos espaços a conquistar. Temos de provar, todo santo dia, que somos capazes e eficientes também fora de casa.
Boa parte do eleitorado feminino é formada por donas de casa, com atividades restritas à vida doméstica. Ela tem enormes dificuldades para entender outro tipo de mulher, aquela que é independente e compete, profissionalmente, com o homem. Mulher submissa desconfia daquela diferente. E não raro, torce contra.
Mudar estratégias e abrir novas frentes
Hoje, mulheres ocupam altos cargos em empresas privadas e estão presentes nos poderes judiciário, executivo e legislativo. Algumas, ainda ligadas aos afazeres domésticos. Outras, por opção e sem culpa, se permitem não casar nem ter filhos, priorizando a carreira e a liberdade de viver a vida como bem entender, sem maiores compromissos familiares.
A presença da mulher na política ainda não foi suficiente para fazer história. Em alguns países, a mulher vem ocupando posições relevantes cada vez mais frequentemente. No entanto, é pouco, muito pouco. Em relação à presença masculina, o percentual feminino é pequeno, em algumas cidades, irrisório, em outras, inexistente. Em Friburgo, apesar de a maioria de eleitores ser feminina, no último pleito apenas uma candidata foi eleita. É necessário pensar em novas estratégias e esclarecer o público de forma mais convincente.
Essa confrontação é abrangente e constante. Onde a mulher estiver, seja no setor público ou privado, sofrerá pressão também das mulheres. Temos que levar em conta a questão histórica, cultural, na qual a mulher ainda se submete ao homem, é dominada por ele. Então, ela prefere apostar no homem. Afinal, mulher submissa não entende ou não aceita aquela que é diferente dela.
Geni Nader
Muitas perguntas, poucas respostas
Para a socióloga Geni Nader, refletir sobre o tema é oportuno neste momento. Ela considera que as mulheres têm por hábito refletir, re-elaborar. E pensa que não existe uma resposta única para essa questão, "pois por si só ela não bastaria”.
"Essa é uma questão complexa, que ao longo da história tem apresentado outros matizes, mas vale a pena tentar levantar algumas possibilidades de resposta. Isso tudo nos leva a pensar que uma questão fundamental é o papel da mulher no imaginário social: como a mulher pensa o seu papel, como o homem pensa o papel da mulher, e como este modo de pensar este papel influencia, quer na decisão da mulher de se candidatar, quer na decisão de dar seu voto a uma mulher. Em pleno século 21, ainda estamos fazendo esses questionamentos”.
A pedagoga e diretora do Colégio Nossa Senhora das Dores, Jean Beatriz Wermelinger, acredita que esse estado de coisas tem relação direta com a educação em geral, e das mulheres, em particular. "A mulher desde sempre foi preparada para ser apenas ‘do lar’, quando deveria ser também para desempenhar um papel no mundo. Mas ela ainda aí está apenas para ser esposa, mãe, passar a imagem da mulher perfeita. É vista como uma criatura frágil que deve ser protegida pelo homem. Essa maneira de ver fez a mulher acreditar na impossibilidade de ela assumir qualquer poder além dos limites impostos e consolidados há tempos. Desvalorizada, desacreditada, a mulher acha que não tem porque confiar na ‘outra’. Inclusive, seu médico preferido ainda é homem”, avalia.
Afinal, que critérios nós, os eleitores brasileiros, adotamos na hora de escolher um candidato? Qual o peso destas divisões de gênero? Que questões a mulher está levando para sua agenda política, como ela pretende sensibilizar o eleitorado feminino? Essas são questões pertinentes colocadas por Geni Nader. Como as mulheres pensam a política partidária para a sua militância.
"Num campo político mais amplo, na vida pública, as mulheres estão bem inseridas, suas lutas estão presentes em diversos setores da vida brasileira, como sindicatos e região rural. Mas essas lutas estão gerando filiação partidária, as bandeiras levantadas por elas nos partidos dão conta de outros anseios da população?”, Geni quer saber.
Ao que a psicóloga Carmen Lucia Göbel Coelho pergunta o quanto a mulher está interessada em se envolver em questões sociopolíticas. Ela lembra que existe uma mulher que não acredita que possa mudar alguma coisa e que deve se preocupar apenas com coisas mais práticas e próximas. "É preocupante que não haja no Brasil uma política que reflita os ideais da população. Tem um marketing que mascara as candidaturas, destrói o que pode haver de genuíno num candidato, que represente as pessoas naquilo que elas precisem de verdade. Na falta dessa credibilidade, e pela sensibilidade própria da natureza feminina, a mulher acaba por se recusar a participar da política partidária”, ressalta Carmen Lucia.
Geni Nader vai além, lembrando que muitas questões que tradicionalmente fazem parte das tarefas ditas femininas, no fundo, são políticas. "No dia a dia, quando falamos de educação, creche, saúde, segurança, estamos falando de tarefas e atividades que tradicionalmente estão ligadas ao papel da mulher. Ela está fazendo política. O que dizer, então, quando ela está em atividade no próprio campo político, cumprindo um papel que lhe foi delegado pelo povo?”.
Resumindo, as três profissionais aqui ouvidas para esta matéria salientaram que, em um quadro onde se destaca certa negatividade, há também muitas coisas positivas. Por estas não serem veiculadas com o mesmo destaque ou frequência da primeira, é preciso um olhar atento. Defendem a união na busca de outras saídas que só poderão ser gestadas coletivamente. Num tempo em que a humanidade está cada vez mais individualista, é importante perceber que não há saída para problemas coletivamente sofridos, sendo individualista. A solidariedade é fundamental para que se avance nesse processo. "Como, a partir da nossa individualidade, podemos colaborar com os outros para a construção de uma morada comum, um mundo mais humano? Esta é uma condição sine qua para a sobrevivência de todos”, encerraram Geni, Jean e Carmen.
Jean Beatriz
Carmen Lucia Göbel Coelho
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