Câncer de mama. O diagnóstico assusta, e com razão: segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), a taxa de mortalidade decorrente dessa doença no Brasil ainda é alta, provavelmente em função de muitos casos só serem descobertos já em estágio avançado. Esse é o tipo mais comum de câncer a atingir mulheres e o segundo mais frequente do mundo.
Para chamar a atenção para a doença, os Estados Unidos iniciou, em 1990, o Outubro Rosa, um movimento que levou o Congresso Americano a definir esse mês como o da prevenção nacional do câncer de mama. Um laço cor-de-rosa tornou-se o símbolo mundial da luta contra a doença.
Em Nova Friburgo, a Associação da Mulher Mastectomizada (Amma) é referência quando se fala em apoio às vítimas da doença. As histórias são muitas nesses 13 anos de existência da entidade. Mas, pelo menos, três fatores são comuns e unem essas mulheres: a mudança de hábitos após o câncer, a valorização de cada momento, a vontade de ajudar o próximo.
O Light abraça a causa dessas pessoas vitoriosas mostrando um pouco da trajetória de quatro delas, desde que foram diagnosticadas com câncer até a volta por cima, a descoberta de novos caminhos, a retomada da alegria de viver e a conscientização da importância de se apoiar quem está começando nesse duro caminho.
Maria Helena Moraes dos Santos trabalhava na Telerj – antiga companhia telefônica do Estado do Rio – quando notou um caroço no seio. Era um câncer. "Um buraco se abriu no chão. Eu fazia exames anualmente, mas entre uma consulta e outra apareceu o nódulo”, conta ela. "Tive que operar. Receber esta notícia é muito ruim, a gente fica sem saber o que fazer. Por isso é fundamental o apoio da família, dos amigos. Felizmente, todos eles me deram muita força, inclusive meu marido”, diz Maria Helena, afirmando que é comum o esposo se separar da mulher quando esta passa pela mastectomia. "Muitos vão embora, por preconceito ou covardia, o que agrava o estado emocional da vítima da doença. O meu marido ficou comigo, o que foi fundamental.”
O câncer, entretanto, não impediu que Maria Helena trabalhasse. A aposentadoria só veio um ano e meio depois da operação. E aí veio o convite para ela integrar a Associação da Mulher Mastectomizada de Nova Friburgo. "A Rosângela Coelho Gomes, mentora da associação, me chamou para participar. Vim e fiquei. E aí ela teve que abrir mão da presidência por causa do trabalho. Assumi. Só que sou tímida e constantemente tenho que dar entrevistas por conta do cargo. Imagine, até aparecer na televisão. Mas não tem jeito, encarei e continuo encarando”, diz, bem-humorada. "Na verdade estou completamente diferente do que era antes do câncer. Nossos valores mudam. Antigamente eu não ia a uma festa se não tivesse uma roupa nova. Hoje, isso já não acontece. O mais importante é a família, amigos, é a gente se doar. Com o apoio deles e acreditando em Deus e no médico, sobrevivi ao câncer. Estou aqui na Amma, uma instituição que conseguiu o respeito da comunidade. O trabalho dos voluntários da associação é muito importante para quem está chegando, iniciando esta caminhada em busca da recuperação”, finaliza a presidente.
Suely da Silva Santos, 57 anos, costureira aposentada. Atende os clientes do bazar da Amma e confecciona as próteses mamárias para a associação - "Parece estranho, mas uma coisa tão ruim como o câncer acabou me fazendo bem, mudando a minha vida”
Logo após descobrir que estava com câncer de mama, a costureira Suely da Silva Santos perdeu a mãe, vítima de câncer no útero. O tratamento começou em julho de 1997, quando ela trabalhava numa confecção. "A gente sabe que tem que fazer exames todo ano, mas vai deixando passar por causa do trabalho, da casa. Foi o que aconteceu comigo. E aí tive que retirar um seio. Vi minha mãe sofrer tanto... Mas minha filha precisava de mim, e isso me deu garra, nunca desanimei”, conta ela, que passou a receber benefício do INSS e acabou se aposentando. O trabalho voluntário na Amma surgiu quando o professor da filha, que tinha parentes com a doença, sugeriu que ela fosse à entidade. A experiência como costureira chegou em boa hora: além de tomar conta do bazar da associação, ela confecciona próteses mamárias que são introduzidas em sutiãs especialmente desenvolvidos para mulheres mastectomizadas por uma empresa friburguense. "Depois da doença descobri uma nova vida. Antes não saía, ficava enfurnada em casa. Agora vou à praia, a bailes... Chamou eu estou indo”, brinca ela, que é divorciada e tem uma filha e dois netos. "Uma coisa tão ruim, como o câncer, acabou mudando a minha vida”, sentencia Suely. "Agradeço todos os dias.”
Maria Inês Coelho Gomes, 59 anos, aposentada da Receita Federal - "O câncer muda muito a nossa visão do ser, do ter, da relação com o dinheiro. A gente fica mais complacente, mais humana”
O susto de Maria Inês Coelho Gomes começou com a irmã, Rosangela – fundadora da Amma - quando esta teve câncer de mama em 1999. A cirurgia, o sofrimento, o tratamento e, enfim, a alta médica. Cerca de onze anos depois foi ela quem recebeu o diagnóstico da doença. "Fiquei pior com o caso da Rosangela. Quando a doença apareceu em mim eu já conhecia todo o problema, todas as etapas que teria que passar. Mas é claro que é um grande susto. E descobri bem no comecinho, o que foi uma vantagem. Metade do câncer foi eliminada na própria biópsia”, conta Maria Inês, que faz acompanhamento e tratamento com tamoxifeno (modulador seletivo do receptor de estrógeno). Funcionária pública aposentada, ela aconselha que ninguém pare de trabalhar por causa da doença, mesmo durante o tratamento. "Se fizer algo pelo próximo, melhor ainda”, acrescenta Inês. "Não se deve tomar a história dos outros para nós. Cada corpo é um corpo, as reações são diferentes. É preciso manter o equilíbrio e o nosso dia a dia normal, de acordo com as possibilidades. A fé é muito importante, é onde podemos nos apoiar. Mas temos que fazer o tratamento de forma correta, fazer a nossa parte, sem descuidos. O câncer, na verdade, me ensinou a viver o hoje, com tudo a que se tem direito. Tudo isso me deu ainda mais vontade de viver”, afirma.
Aldaléia Rideiro Martins, 62 anos, funcionária pública aposentada, tesoureira da Amma - "Depois do câncer passei a acreditar mais em Deus, a ser mais positiva, a ajudar o próximo”
"Quase pirei.” Com essa frase, Aldaléia Ribeiro Martins resume a sensação ao saber que estava com câncer no seio. "Minha mãe faleceu por causa da mesma doença”, diz ela, que fez a cirurgia – quadrante – em fevereiro de 2000 e logo depois voltou ao trabalho, na prefeitura, até se aposentar. "Vi que não poderia comparar o meu caso com o da minha mãe, até porque agora o tratamento é outro, é mais moderno. Mas fiquei meio revoltada, amarga, quando ela morreu. Acho que passei a acreditar mais em Deus. Temos que confiar nele e, abaixo dele, nos médicos e na nossa família e amigos”, aconselha Aldaléia, ressaltando que o preconceito ainda é uma dos grandes problemas do câncer. "Tem gente que nem fala o nome da doença. Pior, algumas mulheres são até rejeitadas pela família e, principalmente, pelo marido, o que piora, e muito, a situação”, diz ela, que exerce o cargo de tesoureira da Amma. "Eu mudei muito, passei a me sentir mais útil. A gente precisa ser mais positiva, ajudar mais o próximo. E também aproveitar a vida. Eu adoro dançar, viajo, passeio, faço academia e ainda tomo conta do meu netinho.”
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