Palavreando - Nosso filme

Por Wanderson Nogueira wandersonnogueira@gmail.com
sexta-feira, 29 de março de 2013
por Jornal A Voz da Serra

No filme que a gente fez os dias trataram de escrever uma história que nem o mais talentoso dos autores poderia fazer. Torta, irreverente, engraçada e triste como toda boa história, mas inusitada ao ponto de reinventar o significado da palavra. 
Personagens não previstos chegaram. Personagens certos se foram. Enredos jamais planejados se fizeram ao cúmulo de se fazer chorar na inesperada última cena—surpreendente. O fim está em aberto. O recomeço não se sabe quando ou como virá! 
Uma história em que não se identifica facilmente o mocinho, o bandido e o par romântico. Tampouco se estipula com clareza os triângulos inúmeros—metáforas. Exige ver além! Provoca visões diversas. Difunde as possibilidades a um imaginário infinito. Mais intrigante do que perturbador. Mais angustiante do que curioso. Complicado. O espectador adora complicações, só para ver o desenrolar delas! Por isso, atrai tanto o nosso filme que nem sei bem se é meu com quem eu escolhi ou se é com quem me escolheu comigo ou se nem é comigo ou com outro que nem percebi na história.           
Com quem eu escolhi posso dizer que, sem querer, me deu inspiração no tempo certo. Sem querer, me fez olhar para dentro de mim, me fez encontrar Deus no reencontro com a minha espiritualidade. Fez com que eu quisesse ser melhor. Voltar a ser romântico, porque eu sou esse cara, mas tinha me esquecido disso. Sem querer, me fez querer ser o melhor de todos. Sem querer, me devolveu o coração e os sonhos de iluminar outras pessoas. Sem querer, me fez dar mais valor às coisas simples de família e fazer perguntas que eu não fazia, ainda que nem sempre tenha obtido as respostas. Sem querer, me fez voar de novo e ficar confuso. Não impero tanto assim meu destino, ainda que tenha me mostrado que é possível moldá-lo. Rimos muito juntos. Plantou em mim a tristeza também. Mas jamais me permitiu ser indiferente. Isso é o máximo! Não ser indiferente em um mundo afogado na indiferença. Sem querer, me inspirou e me deu os meus melhores trabalhos.
Quem eu escolhi, fala pouco, ainda que reconheça que tem alma nessa relação. Diz apenas: “complicado”. Admite ter dificuldades em expor seus sentimentos. Não pode ser taxado de frio na minha visão. Na do espectador—realmente não sei, depende de quem vê. Torna-se personagem principal, ao questionar toda a história e indicar seu pressuposto: “Como chegamos a esse ponto em tão pouco tempo?”. O filme não precisa ser extenso para ser intenso e impactante. Reflexão. Quem poderia imaginar, supor que a história declinaria para outro lado? Ironia. A vida escreve certas coisas difíceis de se imaginar. Confirma ao não negar que nossas vidas estão entrelaçadas e que para não descoser talvez seja primordial uma sequência do filme no próximo verão, quem sabe. Por enquanto, deixa as letras subirem, sem o final pronto.
Quem me escolheu acredita em mim com a devoção dos anjos. Quer abrir os meus olhos, me salvar. Não sou eu o mocinho—me prova. Rouba a cena, porque sequer tinha sido convidado para estar no filme. Sonha, ensina sobre realidade, institui a trilha sonora. Vê estrelas no teto do seu quarto, enquanto me chama para dançar. Fracassa ao tentar domar minhas manias e defeitos—indico que é preciso se adaptar. Faz valer a pena, torna possível o querer por querer no confronto com o sem querer. Espera. Espera. Espera... O tal final feliz e estipula que apoia um segundo, terceiro, quarto filme até vir o tal final feliz. É incansável na busca de que o diretor finalmente acerte nas escolhas.    
Chamei tantos para o meu filme que deixou de ser meu para ser do mundo. Atropelos acontecem na ânsia de ser feliz. Não há o que martirizar no fim da história. Todos choram com a despedida. Não dá para se levantar da sala sem ter ficado mexido. Quando o filme acaba e as letras sobem, estupefatos—pensamos. O que aconteceu? O fim é estranho, sem querer, complicado... A despedida é cruel. Toda despedida é sofrida. Nenhuma sinopse poderá resumir a poesia que é esse nosso filme. 
Sereno, sóbrio, um pouco mais emotivo e também racional, o drama fica no quintal com o personagem de mim mesmo. O turbilhão fica para a varanda e ainda que para além da janela fiquem todas as falas, músicas e lembranças, o céu não entra no meu quarto e na minha cama—eu vou dormir só. Até a sequência do filme, quem sabe no próximo verão.

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