Lolita Pille perdeu amigos e foi barrada em portas de casas noturnas após publicar “Hell”, seu primeiro livro, um fenômeno de vendas na época de seu lançamento (2002). O motivo? A maneira pela qual retratou a juventude da alta sociedade parisiense: consumista, drogada, vazia. Lolita Pille na verdade pertence a essa alta sociedade parisiense e sua personagem—uma menina insolente, arrogante e mimada—leva o mesmo estilo de vida frívolo e hedonista que ela própria critica, o que confere ao livro uma alta dose de cinismo, mas também faz dele uma forma de grito, como se a autora, através deste seu alterego, pedisse para sair de uma cela tediosa que a aprisiona (“A humanidade sofre. E eu sofro com ela”, as duas últimas frases do livro), ao mesmo tempo em que denuncia, por trás da fachada de felicidade e de aparências, o universo oco de um restrito grupo do topo da pirâmide.
“Você poderia ser um morador de rua.
Mas também poderia ser um de nós.
Mas quem somos nós?
Somos simplesmente os herdeiros dos Domini da Roma Antiga, dos senhores da Idade Média, da fidalguia do Renascimento, dos barões da indústria do século XIX, uma fração ínfima de privilegiados que são donos em seus refúgios, onde brilham as joias de Cartier, de 50% do patrimônio francês.
A propriedade é a origem da desigualdade entre os homens. A gente não se queixa disso.
A gente, a gente pode fazer o que quiser, ter tudo, uma vez que podemos comprar tudo. Nascidos com uma colherinha de prata enfiada em nossas bocas VIP, nós transgredimos todas as regras, uma vez que a lei do mais rico é sempre a melhor.
(...) Estamos no mais completo delírio, tomados por uma busca desenfreada de consumo gargantuesco e luxo sibarita. A gente toma Prozac como vocês tomam Melhoral, a gente tem vontade de se suicidar a cada saque na conta do banco, porque é realmente vergonhoso quando se pensa que tem lugar onde as crianças morrem de fome, isso enquanto a gente se entope de porcaria ao encher a cara. O peso da injustiça no mundo se escora em nossos ombros de alfenim de ex-crianças delicadas. Vocês... vocês são as vítimas disso tudo, mas a gente não pode censurá-los por isso.
De qualquer forma, o que quer que a gente faça é sempre uma vergonha.
(...) Vocês dariam tudo para estar em nosso lugar.
Isso faz mal a vocês.
É com um ódio ressentido que vocês largam seus opróbrios sobre nosso comportamento. Querem que a gente fique com a consciência pesada por torrarem uma grana que vocês nunca terão. Se deram mal.”
O livro também é uma historieta de amor...
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