Muitos artistas e pensadores, cada qual a sua maneira, formularam a seguinte pergunta: a sabedoria traz felicidade? Porque se somos ignorantes, ou melhor dizendo, se ignoramos as coisas, temos uma vida livre da depressão e da angústia. Basta ligar o piloto automático da vida e fazer aquilo que é esperado que você faça — no trabalho, na família, na sociedade.
Essa é a questão de fundo do romance “Como me tornei estúpido”, de Martin Page. O personagem principal, Antoine, é um jovem de 25 anos. É um ser teórico, cerebral, que sempre buscou entender toda a complexidade e a profundidade das coisas. Até que um belo dia chega à conclusão de que a inteligência estava fazendo ele se tornar uma pessoa pobre, solitária e infeliz. Ele resolve então “cobrir o cérebro com o manto da estupidez” e não refletir mais sobre nada. Compra roupas cool, passa a frequentar academia de ginástica e a jogar videogame. Arruma emprego em uma corretora.
Com humor e leveza, Martin Page nos faz pensar sobre diversos valores da nossa sociedade — e da vida de forma geral: compreender a vida, lutar para melhorar a vida, desfrutar a vida.
Eis aqui um trecho do livro, o qual Antoine resolve almoçar em uma famosa cadeia de lanchonetes fast-food:
“Inábil, cravou os dentes no sanduíche; uma parte dos molhos viscosos caiu no prato. Ele teve de reconhecer que gostava disso. Não estava seguro de que era bom para saúde, as embalagens não deviam ser biodegradáveis, mas era simples, pouco caro, muito calórico e de sabor tranquilizante. O gosto lhe dava a impressão de encontrar uma família sem fronteiras, de reunir-se aos milhões de pessoas mastigando no mesmo instante um sanduíche idêntico. Como em uma coreografia internacional, ele executava os mesmos passos e gestos de pagar, de transportar o prato, de beber a Coca e de ingerir as batatas fritas e o sanduíche que outros bailarinos-consumidores em templos exatamente semelhantes. Ele sentiu certo prazer, uma confiança, uma força nova em ser como os outros, com os outros”.
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