Quero um novo amor, desses livres de vícios, com parágrafos em branco, sem qualquer história, sem qualquer rancor ou recordação de flores de surpresa. Um amor sem que remeta a fotografais de prateleira, cartas guardadas, perfumes que fedem ou inebriam. São as histórias que acabam com os amores, ainda que elas o acomodem. Se pudéssemos escrever a história sem a presunção do amanhã e sem as implicações do ontem...
Um novo amor, porque tudo que é novo é bem-vindo. Quero e preciso festejar esse novo. Em sua chegada não proponho fogos de artifício, nem salvas de tiros, mas não prometo a ausência de taquicardia. Quero assim simples, mas misterioso. Enigmático, mas não tão complicado. Sei do pranto e da dor, mas também quero conhecer a alegria de um beijo bem dado e de um abraço aguardado.
Esqueço todos os amores passados, abandonei as paixões antigas, estão acolhidas no museu de minhas recordações. Não mais pagarei ingresso para visitá-las. Foram boas, mas acabaram. Foram importantes, mas passaram. Nada mais tenho a ver com elas, nenhuma delas. Abandonei-as tardiamente, após ser abandonado por elas e agora só fazem parte de mim pelas experiências que me deram. Que sejam felizes todos os meus ex-amores tanto quanto quero ser feliz.
Bebo uma taça de vinho, tenho à minha frente a companhia de uma cadeira vazia e penso: a espera é uma dádiva, nos dá o direito de refletir, sentir e ser a gente mesmo quando ser a gente mesmo é tudo o que se sempre quis. Quero um novo amor que entenda isso ou então prefiro me amar sozinho.
Quero um novo amor, como todos querem e precisam de alguém. Não espero que me encontre, mas também não vou procurá-lo nas esquinas de qualquer cidade. Talvez eu seja flagrado por ele numa noite dessas de lua cheia ou de sol a pino à meia-noite. Talvez eu o flagre pulando ondas na praia ou passeando entre as estrelas. Talvez nos flagremos num café da tarde, num esbarrão na fila do banco ou numa reunião chata de trabalho. Talvez nunca nos encontremos enquanto viajamos na procura de um novo amor e sejamos felizes e tristes com os velhos ou com as lembranças deles. Há quem goste de pagar ingresso para visitar inúmeras vezes os museus de suas recordações ainda que prometa nunca mais fazer isso. Esse pode se tornar um vício difícil de se largar. Esse pode se tornar um vício que o impede de encontrar aquilo que lhe espera, o novo amor que dobra na esquina, mas desdobra a mesma esquina ao não ser percebido, ao deixar de ser avistado.
Quero um novo amor ainda que não esteja predestinado a isso. Mas sonho em escrever uma nova história, nada de candidata a best-seller, nada dessas histórias dignas de virar filme ou novela. Quero uma história para minha biografia que se perpetue apenas entre os meus, ela e os filhos que virão com ela, num apartamento alugado com escritório apertado.
Um novo amor, grande de tão simples, feliz de tão comum como do vendedor de flores da esquina; como da menina em seu primeiro beijo; como do estudante em sua faculdade de medicina que sorri das dúvidas da melhor amiga (ele ainda não sabe que é ela); como dos velhinhos que se deixam forçadamente pela natureza para se encontrar em outra vida, quando tudo será novo para eles num novo e conhecido amor.
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