Lamaçal - 10 de outubro

Por Diego Vieira
sexta-feira, 09 de outubro de 2009
por Jornal A Voz da Serra

Poetam que a fumaça se perde nos céus enquanto se dissolve em fios de cabelo. Eu vejo além da fumaça. Vejo seus lábios rosados e pequenos - a fumaça escorrendo entre eles, após ter lhe tocado em lugares que amante algum jamais alcançará.

Este é o fim – a aproximação do crepúsculo é iminente, são as últimas aventuras da Tropa dos Lanternas Verdes. Pena que o mundo não seja como nos quadrinhos, em que basta ressuscitar todo mundo para que uma franquia seja, sem questionamentos por parte do leitor, completamente revitalizada (mesmo que as histórias sejam uma bosta – e normalmente, são mesmo). O mundo não é assim. Não existe espaço para este delírio, só há decadência (se você for um personagem do Steve Ditko, então, só vai haver isso mesmo), só existe este desequilíbrio – essa dúvida própria do autor (de Deus), sobre quais os limites, qual é a linguagem, para onde ir, para quem gritar (uma preocupação cretina com quem é que vai ser o público, como vão recebê-lo, quais palavras lhes parecerão gratuitas... quando isso já está decidido, desde já faz muito tempo, porque não há outro jeito: o público só quer um pouco de afago), toda essa coisa que, no fundo, no fundo não passava de – –

Outra memória: uma distante ilhota, uma festa em que não há convidados, uma solidão incrível, A CÂMERA PERCORRE A CASA. PARA DIANTE DE UM GAROTO SENTADO NO FUNDO DE UM CORREDOR, ELE ESTÁ NU, USANDO APENAS UMA MÁSCARA DE CARNAVAL, CHEIA DE PENACHOS (close nos genitais impúberes do menino) ELE CAMINHA EM DIREÇÃO A UMA BANDEJA NO CHÃO NO MEIO DO CORREDOR – ELE TIRA A TAMPA, HÁ UM ÓRGÃO HUMANO ALI. Não, não é um órgão. A carne começa a se desdobrar, como que se abrindo, exibindo um vivo inseto na parte de dentro. O bichinho, barulhento, bate asas e avança em direção ao centro—

ouça o clique-claquear-cliclear-clic-clic-clac-clic da máquina de escrever

Este é o som de deus – muito mais ruidosa que a destruição é a criação, isto eu lhe digo. O processo é igual, um tolo cria os mapas, outro caminha embriagado, mais um perde a vida, enquanto o mais fraco se ilude, pensando ser vitorioso.

O bichinho verde que voa em direção ao sol que acerta o sol que faz todo mundo gelar que detona o universo que faz com que toda a história acaba que enfim faz com que tudo acabe que bichoinho é esse?

O prazer deste delírio, este interregno, esta cena em que a fumaça lhe escapa pelos lábios – lentamente, sensual, você sempre sensual, esses olhos verdes, você é este prazer, essa minha ilusão que não se concretiza, minha poesia incompleta, meu desatino, o que tenho esperado, isso tudo é você – rápida, serelepe, a coisa toda muda, os olhos da câmera, enfim, desistem de você, se concentram no todo (o todo limitado que os diretores de cinema insistem em chamar de todo), toda essa coisa que se vê por aí, o garoto sentado no meio fio, cheirando cola, a madama, perdida, solitária, madaminha chique, triste e infeliz, mas caminhando assim, até parece feliz, sacudindo o rabinho arrebitado – blé blé blá blá

triste caminho até entre as árvores

meu reino de Eldorado não será jamais encontrado, está escondido à vista de todos, num livro, nas folhas rabiscadas, entre as linhas, lá está todo meu tesouro, todas as minhas cartas marcadas, e onde está você que não busca mais por este raio este trovão este super-homem. Onde está você agora que o abismo o engoliu?

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