Lugar meu
Estou tentando me achar... Achar-me nessa multidão que me pede esmolas de sentidos e sentimentos. Todos querem uma migalha de amor e eu também quero, mas já não sei onde procurar, já não sei onde posso achar tão escondido tesouro. Olho para as pessoas nas ruas. Olho para os caminhos vazios. Olho-me no espelho d’água e não vejo nada. Ainda ontem tinha esperança, mas ela escapou-me pelos dedos na minha ignorância. O tempo também escapou pelos meus dedos e perdi ainda o talento de fazer do tempo o meu aliado. Estou no meio de tudo, sem nada.
Um pássaro pousa no meu ombro. Canta como se quisesse conversar comigo. Como queria ter o dom de ouvir e entender os pássaros. Como queria ter o dom de ouvir e entender as pessoas. Como queria ter o dom de ouvir e entender a mim mesmo.
E a estrada está aberta para que eu possa enfrentá-la. Adentrá-la com a foice das palavras e fazer sangrar em seus obstáculos a seiva da verdade. Mas a verdade, a verdade às vezes me assusta! Quem sabe eu deva dosar a força que uso. Quem sabe eu deva evitar a foice das palavras. Quem sabe eu deva evitar aqueles olhos...
Prefiro ouvir música. Dançar sozinho, porque não sei dançar. Posso evitar essa dor, posso escapar dela fugindo de mim. Ontem, tentei mudar de lugar, mas o lugar me persegue. Sim! Melhor é fugir de mim mesmo! Mas como?
E esse lugar meu é um imenso castelo vermelho, de entranhas estranhas e a alma é um castelo que por mais que belo ainda só ouve os passos meus. Atropelo a existência, inexisto na ausência, incompleto o verso esvai... Incompleto, vou ....
Pelas andanças do destino, mais inocente do que ingênuo, vou à procura de mim mesmo fora de mim. E fora de mim o mundo é imenso, mas a rua continua vazia... Como pode o mundo tão cheio de gente e eu no fundo, sozinho, sem saber a via que me leva para onde quero estar? E eu à procura já nem sei bem ao certo aonde quero ficar...
Talvez apenas nesse lugar meu, de céu azul, com um pouco de verde pra respirar e meu castelo vermelho cheio de uma só pessoa e ninguém que possa me libertar.
Tenho sono. Tenho vontade de despertar logo. Não gosto de ir dormir, mas também não gosto de ter que acordar. Prefiro sonhar.
Danço sozinho ao som da música que desconheço por nunca tê-la ouvido ou simplesmente por ter esquecido seu verdadeiro tom.
A foice das palavras me persegue por essa estrada aberta, pois só ela pode me fazer avançar. De vez em quando me firo, tropeço, canso... Porém nada além da foice das palavras me faz sentir ser filho de um colo, habitante de um lugar. É o meu vício e também o meu ócio. É meu sentido e também minha perturbadora revelação. Perco os escudos e as defesas e meu castelo vermelho fica à deriva das linhas inimigas. Tudo por que estou tentando me achar, tudo porque também quero umas migalhas de amor, tudo porque quero fugir do meio de tudo para ter um pouco do todo. Tudo porque estou tentando me achar, tudo porque sempre estou tentando me achar...
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