Palavreando - 6 de junho

Por Wanderson Nogueira
sexta-feira, 05 de junho de 2009
por Jornal A Voz da Serra

Passos

escando olhares, passeio por entre as multidões só pescando olhares. E sou como o peixe que não foge da isca e deixa a correnteza lhe indicar os caminhos para que um dia também seja fisgado. E sou como o andarilho de destino incerto que da incerteza de seus passos busca a certeza para se encontrar. E sou como os próprios passos que não veem, mas decidem onde querem estar e para onde querem ir.

O horizonte é minha sina, mas talvez eu não queira aportar no horizonte, talvez eu tropece e queira ficar onde caí, talvez eu queira ir mais adiante ou ficar bem antes de onde nasce o sol. E no fim das contas, gostaria de estar aqui, onde o hoje faz sentido. Meus passos cantam, meus passos voam, meus passos pulsam e de passo em passo vou me transformando em mim mesmo. Não posso antecipar nada, como não posso reviver aquilo que já foi vivido, mesmo que eu possa voltar atrás, recuar... não posso viver de novo aquilo que já vivi e aí só me restam lembranças. É preciso seguir, essa é a lei dos passos, essa é a regra da vida que não pode ser transgredida.

Travestido de mim mesmo numa mistura com aquilo que quero ser, sou eu, somente eu e os meus passos. Não há nada, a não ser aquilo que coloco por livre e espontânea vontade, entre mim e os meus passos. Às vezes, a paixão por pessoas ou lugares ou momentos inebriam nossas decisões, mas ainda que sob a influência da lua, de todos os demais astros e até dos deuses, a decisão de pra onde se vai e onde se fica é exclusivamente minha. E é disso que tenho mais medo. Toda decisão deixa certas coisas pelo caminho, toda decisão faz você levar certas coisas na bagagem, toda decisão é um risco. Cuidado com seus passos, mas o cuidado não pode estancar seus passos, é preciso seguir, é necessário seguir sempre porque até parado você segue, até paralisado você anda. E se seus passos estancam, o chão corre sob seus pés. E na lei da vida é assim e seja feita a sua própria vontade.

Passos... Passos que passeiam, passos que correm, passos que caminham e voam pelas almas das pessoas, pela luz escondida das estrelas, pelo rastro dos sapatos de alguns que nos despertam para a ilusão, para a beleza, para o prazer, para a vida e até para a felicidade.

São só meus passos e eu. Num mundo tão cheio de gente é incrível que tenhamos de dar chance a tão poucos e no fim acabemos meio que sozinhos, solitários nessa multidão toda. E o tempo corre e apressa os meus passos. O mundo é grande demais para ser possível conhecê-lo por completo, mas é incrível como se pode ter todo o mundo na palma das mãos quando se tem preenchido o coração. E aí os passos caminham por si só, e eu vivo pela vida. Por isso, pescando olhares, passeio por entre as multidões só pescando olhares. Quem sabe eu seja fisgado na próxima esquina, quem sabe o destino não se torne menos incerto para mim, quem sabe eu enxergue além dos meus próprios passos e saboreie o poder de decidir.

Passos que são como asas, pétalas soltas que deslizam pelo vento, rodas que correm no mergulho que o mundo faz dentro de nossas almas para clarear nossas vidas. Nem sempre meus passos são apurados, nem sempre meus passos são seguros, mas são meus passos o meu modo de decidir o que quero e o que faço da vida. Se olho para trás, percebo minhas pegadas nem sempre heróicas, mas na frente visualizo meus passos e nem sempre de forma planejada vejo-os encontrarem e também desencontrarem os sonhos que desenhei. E meus passos são aquilo que tenho de melhor, porque é aquilo que tenho de único.

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