Histórias Verídicas - 6 de junho

Por MArio de Moraes
sexta-feira, 05 de junho de 2009
por Jornal A Voz da Serra

A água milagrosa

Na roda de uísque há um senhor bem idoso, a quem fui apresentado momentos antes. A conversa tende para o sobrenatural e, deste, para milagres. Alguns contam casos que presenciaram ou ouviram dizer. O ancião, que até então se mantivera calado, entra no assunto :

- Eu acho que em matéria de política e religião, cada um tem a sua. O que posso provar, no entanto, é que muitos propalados milagres na verdade não passam de autossugestão. Em casos de enfermidades, não raramente, o doente fica curado devido a forças interiores, que possui e não sabe. Vou contar-lhes uma história que aconteceu em Minas Gerais, meu estado natal. Propositadamente não vou precisar a data nem revelar o nome da cidade. Direi apenas, para melhor situar o caso, que ele se passou na região do Vale do Jequitinhonha. Ainda existem muitas testemunhas vivas, capazes de confirmarem o fato. Eu sou uma delas.

Tomou mais um gole de uísque e prosseguiu:

- Numa certa tarde, quando visitava o cemitério local, uma senhora das mais beatas deu com uma sepultura de onde estranhamente brotava água. Procurou se informar e soube que ali estava enterrado um homem que, em vida, fora muito bondoso, lembrado até como santo. A mulher, muito impressionada, ajoelhou-se junto ao jazigo, rezou em louvor da alma do extinto e, levada por uma fé interior, fez um pedido ao que já se fora. Depois, molhou as mãos na água que brotava, persignou-se e foi embora. Acontece que essa senhora tinha uma única filha, acamada com uma moléstia incurável. Ela pedira ao falecido que salvasse sua menina. No dia seguinte, a mocinha melhorou, a febre foi embora e, passada uma semana, a guria estava inteiramente curada, para total espanto do médico.

Mais um bom gole de scotch e o recém-conhecido continua :

- A notícia, como acontece nessas ocasiões, correu mais veloz do que fogo em mato seco. As primeiras romarias ao túmulo do bondoso homem foram de habitantes da própria cidade mas, como sua fama de milagreiro se espalhasse, em pouco tempo o município era invadido por toda sorte de gente. Milhares de peregrinos chegavam de municípios vizinhos em busca de graças, molhando mãos, pés e até o corpo inteiro na água que julgavam benta.

- E a água era mesmo milagrosa ? - interrompe um mais ansioso.

- Isso eu não posso responder. O fato é que cego molhou os olhos nela e passou a ver; paralíticos andaram, depois de banharem as pernas nela...milagres e mais milagres, um atrás do outro, surpreendendo até o pároco da cidade. Quando alguns já pensavam em levantar uma igreja em louvor ao novo santo, a verdade veio à tona. Eu me encontrava no caminhão lotado de romeiros. Vínhamos de uma cidade distante, chegando com fé e esperança de sermos atendidos em nossas preces. Quando o veículo parou na porta do cemitério, não havia viv’alma. Pensamos ter errado o caminho, mas um homem que passava nos esclareceu : “Água benta ? Aquela que saía da sepultura e fazia milagres ? Não era benta, não senhor. Os coveiros descobriram que era apenas um velho cano furado...”

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