Portela
De todos os amores que tenho e cultivo é ela a mais bela da passarela - Portela. Desde a primeira vez que meus olhos fitaram aquela águia, meu coração foi roubado por se deixar conquistado por aquele azul e branco sem igual. E meu corpo treme, meus pêlos se arrepiam, meus olhos se inundam de lágrimas toda vez que após o choro do cavaco e o esquenta da bateria alguém anuncia: Portela!
E nem preciso falar de história. A Portela é a história do samba e que me perdoem as demais, mas ninguém carrega em seu pavilhão mais do que 21 estrelas. Mas se quiserem desafiar, falemos do pioneirismo da Portela: a primeira a usar alegorias, a ter comissão de frente uniformizada, a usar surdo, reco-reco e o apito da bateria. A primeira a ter samba-enredo, mulher na bateria, a usar cordas para organizar os desfiles e também a pioneira em entrelaçar fantasias e alegorias ao enredo. A primeira campeã! A maior campeã. Mas nada disso eu sabia quando ainda menino me encantei por aquela gigantesca águia e voei nas asas da imaginação ao ouvir que se tratava da gigantesca Portela. A maior campeã de todos os carnavais. Também não sabia nada sobre os ilustres portelenses: Paulinho da Viola, Noca, Monarco, Candeia, Natal...
Nunca vi a Portela ser campeã, mas já pude gostar e me enroscar em grandes carnavais, ver a noite através de seus olhos, na releitura das lendas e dos mistérios da Amazônia, nos caminhos de Minas e também de Olinda, na preocupação com a natureza e agora e sempre no amor que traz saudade, mas na verdade que a Portela me dá, "Oh Majestade do samba!". E Vai Como Pode trilhando seu caminho de paz e luz, no vôo abençoado da águia de Oswaldo Cruz.
Portela, minha Portela querida. Razão pela qual o carnaval pra mim tem razões desconhecidas. E quem disse que quero conhecer as razões das coisas do coração? De todos os amores que tenho e cultivo é ela a mais bela da passarela - Portela. E assim como Paulinho esse rio passa pela minha vida e meu coração se deixa levar. Nesse azul mais belo que o céu, mais belo que o mar. Exalto sua bandeira. Vou ao vôo do pássaro que mais alto pode voar. Sempre protegida por Nossa Senhora da Conceição que empresta seu manto para a Portela passar.
E haverá o dia em que o mundo do samba se curvará de novo às asas da águia azul e branco. E se vestirá de novo com a bandeira da azul e branco. E cantará de novo Portela, Portela! Nesse dia o espetáculo não será mero espetáculo, as cores não serão apenas cores se vestindo para o luxo, mas o samba se reencontrará devolvendo ao povo o carnaval. Os pés que palpitam no chão fincarão novamente suas raízes e recobrará as noites em que era dono absoluto da passarela. O gingado terá seu sentido devolvido e com ele todo o brilho que um dia desceu sobre Madureira, de Oswaldo Cruz para o mundo.
Venha ou não esse dia, eu terei saudade do tempo que não vi, mas que sinto em cada canto, na pele enrugada da mais importante velha-guarda entre todas, na surpresa misteriosa da águia que surgirá em cada desfile. Continuarei vislumbrando esse enredo que nem o melhor carnavalesco poderia traçar. O enredo da história e do amor que a Portela motiva. E assim vou, carnaval após carnaval, independente das lágrimas que escorrerão de meus olhos nas quartas-feiras de cinzas, ver chegar a Portela, sendo ela de todos os amores que tenho e cultivo a mais bela da passarela - Portela. Sempre Portela!
Deixe o seu comentário