Texto: Márcio Madeira / Foto: Amanda Tinoco
O secretário municipal de Finanças, Planejamento, Desenvolvimento Econômico e Gestão, Juvenal Condack, recebeu a reportagem de A VOZ DA SERRA na tarde de quinta-feira, 5, para antecipar e explicar em detalhes as medidas que estão sendo adotadas pelo governo municipal a fim de enfrentar a crise econômica nacional e adequar o orçamento 2015 à redução no volume de repasses federais e estaduais.
O contexto
Antes de tudo, é preciso enfatizar que nós estávamos numa situação ascendente e bastante confortável até o primeiro semestre de 2014, os gastos com pessoal bem abaixo dos limites exigidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas essa situação de tranquilidade e conforto para continuar fazendo um trabalho de base e estruturação da Prefeitura, tanto na área de recursos humanos quanto na compra de equipamentos e na atualização do sistema, começou a ser colocada em xeque a partir do momento em que as transferências dos governos estadual e federal — que representam 78% do orçamento do município — começaram a diminuir. Tomando como exemplo o custo da folha de pagamento, no relatório enviado em agosto ao Tribunal de Contas ela apresentava comprometimento da ordem de 48% do orçamento. Já em dezembro, com praticamente a mesma folha e o mesmo número de pessoas, esse comprometimento havia subido para 53,97%. Ou seja, a despesa permaneceu fixa, e a receita começou a variar negativamente. E no início de 2015 esse quadro começou a se acentuar ainda mais. Agora, além da perda real observada em 2014, equivalente a 5% dessas transferências, tivemos outro recuo de mais 3% em janeiro e fevereiro. Os repasses estão se esvaindo por toda essa situação débil pela qual está passando o país na área econômica. Um quadro que afetou o Brasil como um todo, mas especialmente o Rio de Janeiro, por ser altamente dependente da indústria do petróleo. Hoje nós temos o Comperj (Complexo Petroquímico do Estado do Rio, em Itaboraí) praticamente parado; os royalties realmente diminuíram porque o preço do barril do petróleo caiu pela metade.
Dívidas
O governo atual também herdou diversas dívidas de governos anteriores, e essa herança consome parcelas significativas do orçamento. A dívida de R$ 60 milhões junto ao INSS já foi renegociada, tendo como garantia o fundo de participação do município. O governo federal desconta mensalmente uma determinada quantia, e essa dívida está custando cerca de 1% de nossa receita corrente, que é o que a lei determina.
Existe também a dívida do fundo de garantia da extinta Fundação Municipal de Saúde, em valor próximo a R$ 10 milhões, cujos termos de renegociação estão em andamento e já bem encaminhados. Vamos parcelar esse valor porque, felizmente, mesmo com todas essas dificuldades, o município está 100% em dia com INSS, os recolhimentos, Fundo de Garantia, Pasep, funcionários e com todos os fornecedores, exceto alguns da Saúde. Apesar de todo o apoio financeiro dado ainda existem situações do passado que não estão regularizadas, que são os reconhecimentos de dívidas que nós estamos fazendo. Nesses dois anos também já pagamos R$ 16 milhões em precatórios, de governos anteriores.
Processos
Recentemente fizemos um levantamento de todos os processos que correm nas diversas varas envolvendo a Prefeitura Municipal de Nova Friburgo. E levamos um tremendo susto porque, supondo que todas as causas sejam perdidas o valor total é próximo a R$ 1 bilhão, ou dois anos de nosso orçamento. É lógico que, pelo histórico da Procuradoria e das defesas realizadas, a gente acredita que a maior parte dessas causas serão ganhas. Ainda assim, é claro que alguma fatia desse montante nós teremos que bancar. Aliás, nós e os futuros administradores.
Reajustes
É importante lembrar ainda que a administração atual assumiu uma folha de pagamentos extremamente defasada, depois de muitos anos sem aumentos salariais. Para que se tenha uma ideia, cerca de 3.800 dos seis mil servidores no início de 2013 estavam na faixa de um salário mínimo. O último aumento havia sido na educação, em 2010. E o governo atual conseguiu pagar a reposição geral anual nos dois anos, além de dar aproximadamente 4% de ganhos reais em 2013 e outros 2% em 2014. Paralelamente, o governo também convocou os aprovados de 1999 e 2007, e hoje apenas 8% dos servidores são temporários. Um número que vai cair ainda mais com a realização do próximo concurso, representando um avanço para a condição do funcionalismo, mas também um engessamento dos gastos da Prefeitura.
Sistema
Já licitamos a empresa que vai elaborar o novo sistema da Prefeitura, responsável por interligar todos os órgãos o governo. Postos de Saúde, escolas, creches, secretarias... Nós vamos trabalhar online. Montar isso é muito difícil, mas até o fim deste ano nós estaremos dispondo de um sistema moderno na Prefeitura, e esperamos estar com o Cidade Inteligente funcionando também.
Receita interna
A receita interna, advinda daqueles impostos que estão sob nossa responsabilidade, vem crescendo sistematicamente. Em nosso Planejamento Plurianual o objetivo era aumentar 60% desta receita nos quatro anos do governo Rogério Cabral. E a previsão atual é de que este patamar seja atingido já em 2015. Ou seja: IPTU, ITBI (Imposto Sobre Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis) e ISS subiram muito acima da inflação, variando entre 12 e 23%.
O aumento vem sendo obtido especialmente através do combate à inadimplência, do incentivo à negociação de dívidas, e da regularização de loteamentos. Essa última medida, por sinal, é importante tanto para o governo quanto para a população, pois aumenta a base de contribuintes, e permite que o proprietário tenha uma escritura e um endereço formal.
O problema é que, mesmo com todo esse aumento, a receita interna responde por menos de 23% do orçamento municipal, e por isso não basta para compensar grandes perdas nos repasses.
Ajustes
Toda essa situação obriga qualquer governo responsável a ajustar as suas contas. Aqui em Nova Friburgo esse ajuste não está sendo feito através do aumento de impostos, que é o que o governo federal está fazendo muito agora. Nossa opção tem sido por ajustar as contas através da redução das despesas. Esse caminho, contudo, nos leva a bater de frente com um problema em que Nova Friburgo apresenta um quadro único no Brasil, que diz respeito aos investimentos em saúde.
Saúde
Os gastos com a saúde estão atingindo limites que, mesmo em condições normais, já seriam insuportáveis para o município. E que são ainda muito mais numa situação de recessão, como a atual.
Em janeiro de 2013 havia 1.341 funcionários na saúde; em fevereiro de 2015 nós tínhamos 1.614. No fim, o número de contratações acabou sendo superior a 300, porque na reforma administrativa nós centralizamos uma série de órgãos, e esses cargos saíram do organograma da saúde e migraram para o organograma da Prefeitura. E eram cargos caros. A folha da saúde quando nós assumimos era de R$ 2,9 milhões mensais, agora ela está na casa de R$ 4,6 milhões por mês.
Para dar uma ideia, em 2014 nós transferimos para a saúde quase 40% de nossa receita corrente líquida — que é a base de cálculo — quando a lei manda aplicar 15%. Isso significa gastar com a saúde cerca de R$ 50 milhões/ano a mais do que obrigatório por lei. Isso torna Friburgo um município atípico em termos de investimento em saúde, porque esse tipo de esforço acaba por secar praticamente todas as outras secretarias. Obras, Serviços Públicos, Assistência Social... Todo mundo tem que abrir mão de uma parcela dos valores que poderiam estar investindo, para que se possa garantir uma saúde que preste um atendimento digno à população.
Mas é muito claro que não se pode continuar exigindo que o contribuinte de Nova Friburgo banque sozinho essa conta. Primeiro, nós temos que encontrar meios de dividir esse custo com os municípios vizinhos, que são os grandes utilizadores da UPA e do Hospital Raul Sertã. A princípio isso seria feito através da transferência de parte dessas despesas para o governo do estado, ou a distribuindo através de um consórcio de municípios. Essas são as saídas com as quais o governo Rogério Cabral está trabalhando, pois já ficou claro que esse é o nó da economia municipal, e não será possível dar novos passos à frente sem que esse nó seja antes desatado. É preciso desonerar do contribuinte friburguense o tamanho do custo que ele está pagando na saúde. Do contrário não haverá prefeito nenhum nessa cidade que vá conseguir resultados em sua administração. Esse é o grande plano.
Gestão
É lógico que a questão da gestão nós temos que olhar com muito carinho. Afinal, se nós estamos investindo todos esses recursos, nós temos que verificar, também, como é que esses recursos estão sendo aplicados, como estão sendo geridos, uma vez que eles representam uma carga muito grande de sacrifício para a população friburguense. Um sacrifício que aparece nos serviços públicos, na Secretaria de Obras, que ficam privados de valores que poderiam realmente melhorar o aspecto da cidade, das ruas, das calçadas, enfim... Poderiam fazer de Friburgo uma cidade mais charmosa do que nós temos no momento.
Responsabilidade
Então, em termos de responsabilidade e transparência, é importante informar a população que, apesar de tudo, nós vamos tomar as medidas para enfrentar essa crise. Não vamos fugir de algumas posturas necessárias, que seriam desaconselháveis sob o aspecto político. Trata-se de uma questão de responsabilidade. Não podemos deixar uma herança maldita para quem vier a governar o município no próximo período, e para isso nós temos que pagar o preço de tomar essas medidas hoje.
Pagamentos variáveis
Será publicado nos próximos dias um decreto que irá contingenciar todo o orçamento de Nova Friburgo. Em condições normais, um orçamento aprovado é executado através de suas diversas secretarias. Nessa situação de crise, no entanto, toda e qualquer despesa vai ter que ser aprovada no gabinete do Prefeito. Ou seja: o prefeito vai dizer sim ou não para qualquer gasto no município.
Nós já iniciamos esse processo, e na semana passada liberamos uma circular para todas as secretarias suspendendo todos os pagamentos variáveis da folha. Gratificações, aumentos, horas extras, complementações salariais, enfim. Essas variáveis não vão deixar de existir, porque não é possível conseguir um milagre do dia para a noite. Mas todos esses casos vão ter que passar pela aprovação inicial do prefeito, para que possam ser executados. É claro que existe uma série de funções que exigem o pagamento de hora extra, mas não haverá mais a liberdade de autorizar essas horas extras por conta própria, como havia antigamente. Agora isso será visto caso a caso, passando pelo crivo do prefeito.
Essa medida se faz necessária uma vez que já superamos o limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal, e estamos, no momento, a apenas 0,03% do teto máximo permitido. Esse decreto vai valer para o orçamento de 2015 que foi aprovado pela Câmara Municipal, ou até que a gente ajuste essas contas.
A medida não afeta o cronograma do concurso 2015. Aliás, já na semana que vem deve ser apresentado o edital de licitação para definir a empresa que fará o gerenciamento do processo seletivo. E também não afeta o andamento das negociações junto aos funcionários para definir os detalhes do novo estatuto do servidor, que já vai reger os aprovados no próximo concurso.
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