Vinicius Gastin
Embora os desfiles das escolas de samba de Nova Friburgo tenham encantado foliões e turistas, a ausência da Alunos do Samba foi bastante sentida na Avenida Alberto Braune. A agremiação de Conselheiro Paulino, que teve sua quadra interditada durante boa parte do ano passado, não conseguiu levantar recursos suficientes para organizar a apresentação. Desta forma, a comunidade de 65 mil habitantes do maior distrito da cidade ficou órfã de sua representante na passarela do samba.
Dona de 12 títulos do carnaval friburguense, a Alunão se organiza para retornar em 2015. No dia 11 de fevereiro deste ano, Felipe Guerra Borges, 37 anos, foi eleito presidente para o próximo biênio. O professor, carnavalesco do Alunão em 2013, aprova a decisão da antiga gestão em não desfilar e questiona o excesso de exigências para a reabertura da quadra. Felipão, como é conhecido, terá um encontro com representantes do poder público para tentar resolver a questão — e começar a planejar o desfile do próximo ano. "Não tenho condições de fazer as reformas necessárias. Teremos que conversar para chegar a um acordo.”
Em entrevista ao A VOZ DA SERRA, o novo presidente da Alunos do Samba fala sobre modelo de gestão, desafios à frente da agremiação e revela a intenção de atrair novamente a comunidade ao barracão.
A VOZ DA SERRA: Por que, afinal, a Alunos do Samba tomou a decisão de não desfilar no carnaval de 2014?
Felipe Borges: A presidência que lá estava sofreu uma série de problemas. A escola foi interditada pela Postura da prefeitura e ainda nem discutimos o que fazer. Eu preciso da quadra aberta para ter renda e levar a escola para a avenida. Cerca de 70% dos gastos de avenida são pagos com os recursos próprios, através dos eventos que realizamos. A Alunos do Samba sofreu uma interdição de quase quatro meses, o que significa uma perda significativa.
Qual o motivo dessa interdição?
O que foi alegado é a questão do barulho. Mas o que tem sido cobrado vai muito além do que podemos fazer. Eles cobram licença ambiental, alvará definitivo... E questionamos o seguinte: que escola ou bloco tem isso em Nova Friburgo? Queremos fazer o certo, mas precisamos do apoio do poder público. Nós somos uma entidade cultural de samba e assim vai ser. Somos a pioneira, a matriarca de todas as escolas. São 12 títulos e um distrito inteiro representado. A decisão do presidente Carlos Santos em não desfilar foi certeira. Ele não poderia levar um carnaval no nível que Conselheiro Paulino merece.
Então a maior dificuldade não é financeira, e sim estrutural?
Sim, eles cobram um tratamento acústico em nossa quadra, e isso custa 150 mil reais. Não temos de onde tirar esse dinheiro. A nossa primeira preocupação é liberar a quadra e vamos dialogar com o poder público para conseguir a liberação para voltar a receber a comunidade.
Então vocês já tinham o carnaval pronto para 2014?
Na verdade, apenas o enredo. Nós falaríamos sobre educação, com o tema ‘De apagador e giz nas mãos, o Alunos dá um show no carnaval’. Mas sem receita não tem como. Ou uma escola hoje, em Nova Friburgo, coloca um carnaval entre 200 e 250 mil reais na rua ou não tem condição nenhuma de disputar nada. E tem escolas que gastam mais do que isso. Vamos chegar lá com a ajuda dos empresários de Nova Friburgo. Aposto na credibilidade que eu e minha equipe temos.
A comunidade compreendeu a decisão e apoia a proposta de vocês?
Tenho escutado muitas palavras de incentivo. Sou um professor e sempre fui envolvido com samba, criado dentro da Alunos. A comunidade tem dado muita força, o que aumenta a minha responsabilidade de dirigir uma agremiação de 68 anos. Vamos mexer em algumas coisas. Queremos, por exemplo, mudar o palco da quadra e adaptá-lo ao que deve ser em uma escola de samba.
O novo modelo de gestão implantado pelas escolas do município vai de encontro à filosofia do Alunão, que costuma fazer o carnaval em parceria com a comunidade. Como pretende trabalhar? Vai manter a tradição ou se adequar à nova realidade?
A princípio, se quisermos brigar por títulos, nós temos que nos adequar à realidade de Nova Friburgo. Ou seja: fazemos um dinheiro, no final de março e início de abril vamos ao Rio de Janeiro para comprar algumas fantasias e alegorias e complementamos com a mão de obra daqui. A Alunos do Samba, até hoje, fez tudo aqui e eu cito como exemplo o trabalho do escultor Ernesto Carvalho. Em contrapartida, nós corremos o risco de o carnaval acabar. O que vai ser do carnaval friburguense se o Rio de Janeiro e São Paulo disserem que não vendem mais? Onde está a nossa originalidade?
Talvez por isso exista a dificuldade de renovação no carnaval da cidade...
Exatamente. Se é mais fácil comprar, por que contratar escultores, pintores e outros profissionais? Por isso é difícil revelar um novo Jorge Marcos Freitas (carnavalesco da Rosas de Ouro, de São Paulo), por exemplo. Tem escola que nem muda nada. Nesse ponto, o nosso carnaval está morto há algum tempo. A nossa ausência é, também, um grito de alerta. As pessoas questionam o subsídio de 46 mil reais, mas esse valor mal paga as pessoas que contratamos para retocar as fantasias. Já ouvi falar que carnaval é bobeira. Mas essa é a única festa popular onde o povo é o artista. A escola só vai pra avenida porque o povo conta aquela história. Temos municípios que pagam 180 mil e as escolas apresentam desfiles pífios. Precisamos pensar o quanto o carnaval gera de receita para a cidade.
É possível garantir que a Alunos do Samba desfila em 2015?
Primeiro, nós precisamos desse acordo com a prefeitura para ter a quadra em funcionamento. Vamos conversar com a comunidade. Se eu posso ter ensaios até 22h, é o que eu vou fazer. Queremos a família do distrito na escola de samba. Quando não representamos a comunidade, fica um vazio muito grande em Conselheiro Paulino. Hoje, a Alunos do Samba é a maior representação do distrito.
Deixe o seu comentário