Vinicius Gastin
De fato, pouca gente conhece o Edson Feliciano Marcondes pelo nome. No entanto, o apelido é um dos mais respeitados no mundo do samba. Desde que ingressou no carnaval carioca, Nêgo conquistou espaço e deixou de ser apenas o irmão do Neguinho da Beija-Flor. Dono de cinco estandartes de ouro (apenas Jamelão e Neguinho, com seis cada, o superam), o intérprete será uma das atrações da Vilage no Samba, a última escola a se apresentar neste domingo na Avenida Alberto Braune.
Aos 54 anos, o cantor é conhecido pela vibração ao conduzir os sambas-enredos das escolas que defende. E foram muitas ao longo das quase quatro décadas de carreira: Unidos da Tijuca, Grande Rio, Viradouro, União da Ilha, Império Serrano, Mocidade Independente, dentre outras. Nêgo é coautor de diversos sambas de sucesso, como "A Grande Constelação das Estrelas Negras”, em parceira com Neguinho, no ano de 1983.
Em 2014, o intérprete terá a missão de conduzir a verde e branco de Duas Pedras na Avenida Alberto Braune. Estar em Nova Friburgo não é uma novidade para o músico, que diz ser apaixonado pela cidade e revela ter planos de morar na Serra. Nêgo fecha o ciclo de entrevistas de A VOZ DA SERRA com os cantores das escolas de samba friburguenses, apostando no potencial do carnaval do interior fluminense: "É um celeiro de bambas. A renovação para o Rio de Janeiro está aqui.”
A VOZ DA SERRA: Você é mais um exemplo de intérprete consagrado no carnaval carioca que participa da folia em Nova Friburgo. Como aconteceu o convite?
NÊGO: Sou amigo do Adonai, músico tradicional da escola e um dos autores do
samba deste ano, do Jefinho (Jefferson Lima, diretor) e já defendo o samba dele na Imperatriz Leopoldinense, onde inclusive eu fui campeão. Já gravei sambas aqui, esse é o quarto. Tenho um amor muito grande por Nova Friburgo, não só pelos amigos, mas por ser uma cidade maravilhosa, acolhedora e com pessoas incríveis. É uma honra estar representando a Vilage, que é a minha escola aqui, onde gosto do tratamento, do calor humano e da pegada do pessoal. A vontade é muito grande. Sou devoto de São Jorge e por isso acredito que todos que lutam, conseguem. Vou dar o meu suor na avenida para fazermos um grande desfile para conquistar o campeonato.
Então você costuma frequentar a cidade em outras épocas...
Costumo vir a Nova Friburgo, Cordeiro, Cantagalo e outras cidades próximas, mesmo fora da época do carnaval. Sou apaixonado pela região e o meu sonho é, no final da minha vida, morar em Nova Friburgo.
O desfile das escolas de samba de Nova Friburgo é considerado o melhor do interior do estado. Concorda?
Eu acho que não deve nada. Aqui nós temos os melhores compositores, uma boa bateria e não perde em nada para o Rio de Janeiro. Acompanho escolas de samba desde os 13 anos, trabalho há 29 anos como intérprete no Rio, o meu irmão canta na Beija-Flor há 40 anos e posso garantir que Nova Friburgo não perde em nada pro carnaval da capital do estado. A diferença está apenas no tamanho. Se formasse uma escola aqui e descesse para o Rio, seria muito forte.
E a relação do intérprete com a bateria, como funciona? Vocês costumam conversar com os mestres durante os ensaios para definir ritmo e melodia?
A bateria da Vilage já tem uma característica própria, com pegada e cadência muito boas. Eles trabalham surdo, repique e tarol igual ao Rio, por isso qualquer cantor que vier aqui não vai sentir diferença. Cabe a nós nos adaptarmos ao samba, ao estilo e fazer nosso papel em conjunto com os ritmistas.
Quanto à emoção de defender um samba na Marquês de Sapucaí e na Avenida Alberto Braune, dá pra fazer um comparativo?
Eu acho que os sambas são bons, a bateria e os músicos são excelentes e todos nos deixam bem à vontade. No Rio é apenas maior. As escolas recebem milhões lá, e aqui, nem tanto. A distinção é única e exclusivamente essa, o restante é igual. O sentimento de representar uma escola na Marquês de Sapucaí e na Avenida Alberto Braune é a mesma, pois você mexe com a emoção de uma comunidade que trabalhou o ano inteiro por aquele momento. Só as proporções mudam.
Assim como acontece com algumas agremiações cariocas, aqui existe uma rivalidade, saudável, entre Vilage e Saudade. É uma motivação extra?
Tenho certeza que a Vilage vai fazer um grande desfile. Conheço o carnaval da Saudade, é muito bom e a nossa coirmã merece respeito, pois vem ganhando de maneira merecida nos últimos anos. No entanto, nós vamos fazer um desfile para chamar o público pro nosso lado, com um grande samba-enredo, de melodia maravilhosa. Com esses dois ingredientes, só depende da gente transformar em conquista.
Quando vocês estão em cima do carro de som, conseguem sentir a resposta do público e dos componentes ao samba?
A gente sente essa resposta, sim. É a mesma coisa de um jogador de futebol profissional jogando em um Maracanã lotado, com a torcida incentivando o tempo todo. Quando a escola toda canta e a avenida também, é um combustível extra para cantar cada vez mais e buscar o tão sonhado título. Vejo muita garra e vontade dos componentes para reconquistar essa hegemonia do carnaval de Nova Friburgo. Vamos deixar o julgamento por conta dos jurados, porque desfile bom nós vamos fazer.
O Nêgo, sem dúvidas, é uma referência para os intérpretes friburguenses. Como é essa relação com os demais cantores da Vilage no Samba?
Ganhei cinco estandartes de ouro. Além de mim, apenas Neguinho da Beija-Flor e Jamelão levaram o prêmio tantas vezes. Venho pra Vilage porque amo a cidade, a escola e o pessoal que canta comigo. Se amanhã eu for cantar no Rio, eu levo uns três ou quatro comigo. Muitas vezes falta material humano na capital e aqui tem de sobra. Os cantores são maravilhosos, afinados, têm pegada forte. Os profissionais do violão e do cavaquinho também são excelentes.
Então, a renovação para o carnaval carioca pode estar no interior...
Sem dúvidas, como tem o Monstrinho, o Jorge Freitas, carnavalesco da Rosas de Ouro, e tantos outros que saem de Nova Friburgo para o carnaval carioca. Eu mesmo já trabalhei com o Adonai em outros lugares. A gente tira o material de onde existe o verdadeiro sambista e essa região tem muitos talentos. Antes de conhecer, eu pensava que o samba daqui se resumia a Benito di Paula. Hoje eu sei que vai muito além. Aqui é um celeiro de bambas.
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