O ano é 1991. A mãe está muito doente, o cãozinho da família segue o mesmo caminho, e a falta de recursos não deixa muitas opções para ajudar. Resta a fé, e felizmente esta não costuma falhar. "Se minha mãe e meu bichinho ficarem bons, vou dedicar minha vida a cuidar dos animais desamparados”, prometeu para si mesma. E então tudo mudou. A mãe recuperou a saúde, o cãozinho Lic voltou a ter alegria e vitalidade — viveria 17 anos —, e a vida de Maria Cristina Paxeco tomou um rumo sem volta, de total entrega e amparo a esses irmãos tão gratos e amáveis, e ao mesmo tempo tão maltratados ou negligenciados pela sociedade como um todo. "Desde aquele dia nunca mais parou de aparecer cachorro na minha vida”, afirma ela, sorrindo. "A primeira que surgiu depois da promessa foi a Becinha, uma cadela que eu vi ser atropelada enquanto ia de Rio das Ostras para Macaé. Desci do ônibus e fui socorrer a bichinha. E aí, quando você começa a acolher e a tratar dos animais, as pessoas ficam sabendo e começam a abandonar filhotes, cães velhos ou doentes na sua porta.” Atualmente, apenas em sua casa, eles são 360.
E a ressalva a respeito da residência se justifica, porque além dos cães que lotam seu terreno Cristina também tornou-se referência certa quando algum cachorro é encontrado nas ruas em situação de desamparo. "Eu não tenho mais espaço em minha casa, não tenho como receber mais cães. Mas, mesmo assim, as pessoas sempre me procuram quando sabem de algum animal em sofrimento, e nós os encaminhamos para tratamento veterinário. Então, além da responsabilidade sobre todos os que atualmente vivem nos canis, também acabo me envolvendo no tratamento de muitos outros”, explica.
Críticas pela falta de estrutura
De modo curioso, a mesma abnegação que torna possível a sobrevivência de tantos animais é também responsável por diversas afirmações de reprovação, inclusive por parte de outros cuidadores. Para muitas pessoas, os cães no abrigo de Cristina não contam com a estrutura necessária para viverem da melhor forma, e por isso seu exemplo deveria ser seguido com ressalvas. Ela, claro, já teve contato com essas afirmações.
"Sim, as pessoas sempre têm críticas a fazer. Se a gente cuida de animais, então tem sempre alguém pronto a dizer que deveríamos estar cuidando de pessoas. Se eu acolho cães que ninguém desejaria adotar, dou abrigo, alimentação e tratamento veterinário apesar da capacidade limitada de meus canis, as pessoas dizem que lá esses animais vivem em condições precárias. Acontece que essas pessoas apenas falam, não me ajudam a fazer melhor. Eu luto com dificuldades, trabalho para pagar minhas contas, e faço tudo o que posso. Dependo de ajuda para arcar com tantas despesas, mas graças a Deus nunca faltou comida por um único que fosse dia para meus cachorros”, desabafa, com lágrimas nos olhos.
É claro que a estrutura poderia e deveria ser melhor. Cristina tem atualmente 50 canis, e precisaria de mais 60. "O terreno eu tenho, mas preciso de ajuda para realizar a obra. Isso, na realidade, é o que mais preciso atualmente”, explica. As críticas, no entanto, nascem de mais uma dentre as muitas inversões de valores que permeiam a opinião pública. Afinal, se falta algum conforto a esses animais, a pessoa que menos tem culpa é a própria Cristina, que há anos vem fazendo milagres com os poucos recursos de que dispõe, para justamente reduzir o impacto do descaso e das agressões que esses cães sofreram nas mãos de outras pessoas.
Atropelamentos, agressões gratuitas, abandonos, tiros, água fervendo... Se o governo municipal cumprisse a lei da castração e a cidade tivesse mais pessoas como Cristina, ou ao menos mais doadores comprometidos do que críticos de plantão, certamente a qualidade de vida dos animais — sobre a qual somos todos igualmente responsáveis — não representaria motivo de tão profunda vergonha ou derrota coletiva.
Como ajudar
Para quem prefere ajudar em vez de meramente criticar, são muitas as formas disponíveis. Felizmente, gente como Cristina torna muito mais fácil a vida de quem ambiciona dividir um pouco do que tem, ou incluir uma rotina de boas ações entre os próprios compromissos. Em termos materiais, rações podem ser compradas em estabelecimentos como a Peixes e Aquários, na Rua Monsenhor Miranda; Super Pet, Dog Show ou Parada dos Bichos, em Conselheiro Paulino; Celeiro, na Ponte da Saudade, ou Rações da Serra, em Olaria. A banca de jornais em frente ao antigo Fórum Julio Zamith, na Praça Getúlio Vargas, Centro, também recebe ajudas específicas, bem como a veterinária Pecly. Da mesma forma, quem puder fazer doações para a construção dos canis estará prestando grande ajuda aos animais. No que se refere ao voluntariado, veterinários ou pedreiros também têm a chance de ajudar com algumas horas de trabalho e dedicação.
Todos os cães estão disponíveis para adoção, por mais que os candidatos tenham que enfrentar uma necessária triagem. "Muitas vezes a pessoa se interessa, mas depois acaba abandonando o animal quando descobre que ele dá despesas e demanda atenção. Adotar um cão é um compromisso de toda a família, que deve ir até o fim da vida e precisa ser assumido com consciência”, defende.
Mensalmente as despesas com ração giram em torno de R$ 6 mil, ao passo que os gastos com veterinários são muito menos previsíveis. Quem quiser ajudar com dinheiro para estas despesas pode realizar depósito no Banco Itaú, agência 0222, conta-poupança 62067-6/500, ou contribuir diretamente na caixinha do canil, também na citada banca de jornais.
E quem não quiser ajudar, que não o faça. Ninguém é obrigado, afinal. Felizmente, Cristina nunca adotou um cão pensando em aprovação, votos ou reconhecimento. Como não poderia deixar de ser, seu compromisso sempre foi consigo mesma, com Deus e com os cães, os quais são gratos e elevados demais para perderem tempo com intrigas ou fofocas.
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