Não vou focar meu ponto de vista na atuação dos escritores, iniciantes ou consagrados, tão só sob a ótica do mercado, por si já excludente. Prefiro falar do campo para os autores, esse, sim, amplo no momento, devido ao crescimento acentuado da publicação de e-books. Recentemente, durante minha participação no Circuito OFF Flip, em Paraty, pude assistir a uma mesa sobre os livros digitais, da qual participaram representantes de editoras exclusivamente através da internet, como Kobo, KBR, Jaguatirica, entre outras. Na ocasião foram apresentados números surpreendentes, tanto de e-books publicados como de cifras (algo em torno de 5 milhões de reais, em 2012). Nesse tipo de publicação, os editores e os autores atuam diretamente entre si, dispensando distribuidoras e livrarias, que, na edição de um livro impresso, ficam com grande fatia do "bolo”. Com o livro digital, as percentagens são de 70% para o escritor e 30% para a editora — contra os geralmente 10% para o autor, no caso do livro impresso. Em termos de êxito financeiro, não dará, óbvio, para alguém se tornar rico com a literatura, mas eliminará, com certeza, essa humilhante posição atual do escritor em relação aos lucros com sua obra. Essa ascensão do e-book vai, penso que a curto prazo, forçar uma reestruturação no modelo vigente do mercado em torno do livro de papel, caso as editoras queiram continuar em atividade, levando a uma distribuição mais justa dos valores alcançados com a venda nas livrarias. Pode ser, até, que as distribuidoras estejam com os dias contados — o que será um ganho inestimável contra o lucro fácil no mercado editorial.
O autor, focando agora no fazer literário, tem hoje uma nova missão: ele não pode mais apenas sentar-se à frente do computador e escrever; é necessário que "trabalhe” por seu livro, ou seja, que participe de festivais, festas e feiras literárias, inserindo sua obra nos circuitos de eventos que a cada ano são em maior número no país. Todo agente literário, hoje, deixa isso claro, de antemão, àquele que deseja entrar no altamente competitivo campo da literatura. Será preciso vencer eventuais barreiras como timidez e má vontade para estar com os pés na estrada — e até mesmo o medo de viajar de avião terá de ser superado. O escritor deverá estar preparado para falar de sua obra ou de temas ligados ao seu gênero de atuação na escrita — poesia, narrativa, ensaio, biografia etc. Em mesas de debates, palestras em escolas ou em leituras de textos seus, ele terá a responsabilidade de destacar o seu fazer literário, ao ponto de despertar um vivo interesse por seus livros e arrebanhar novos leitores. Certamente, no caso de falar em uma mesa, a companhia de um bom mediador será elemento indispensável, ao gerar intervenções nos momentos certos, trazer questões mais objetivas e, muito importante, não tentar sobressair mais que o autor focado.
Portanto, acabou a velha imagem do escritor solitário, em crise de desespero com a ideia que não aparece, debruçado sobre sua máquina de escrever, um gato felpudo e preguiçoso se enroscando em sua perna. A nova cara do escritor é sorridente, diante de uma plateia que não quer apenas lê-lo, mas precisa ouvi-lo discorrer sobre seus livros, seu ofício cotidiano e mesmo sobre alguns detalhes de sua vida pessoal, tão desejosa está de identificar-se com ele. Hoje, o perfil do escritor enigmático e avesso a dar as caras por aí é privilégio de muito poucos. De um Dalton Trevisan, por exemplo, que pode se dar o luxo de ser, na sombra e no silêncio, a perfeita encarnação do vampiro de Curitiba.
(*) Sérgio Bernardo Correa nasceu no Rio de Janeiro. É poeta e contista, premiado em diversos estados do Brasil, em Portugal e na Argentina. Atuou como cronista por 6 anos no jornal A Voz da Serra, com a coluna LetraLivre. Publicou, em 2005, Caverna dos signos (poesia e narrativa), a convite da Secretaria de Cultura de Nova Friburgo/RJ, cidade onde mora; e em 2010, Asfalto (poesia), pela editora Selo OFF Flip, lançado em Paraty/RJ, e depois em Nova Friburgo, Rio de Janeiro e São Paulo. Vem participando de feiras e festas literárias em vários estados do Brasil. É colunista do site Os Desmandamentos. Blog: http://sergiobernardocorrea.tumblr.com/
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