Vinte e dois mortos, sete casas soterradas, um edifício residencial praticamente cortado ao meio como se fosse um brinquedo e uma avalanche de terra e lama de incontáveis toneladas mudaram para sempre a Rua Cristina Ziede na madrugada do fatídico 12 de janeiro de 2011. As cenas da tamanha desgraça na via que até então era um dos pontos nobres do Centro de Nova Friburgo não saem da cabeça de quem as presenciou, viu pela TV ou ainda através das imagens de jornais ou vídeos na internet. Foram cenas realmente chocantes, difíceis de esquecer. Dois anos e quase dois meses se passaram e, infelizmente, pouca coisa mudou na simpática e bucólica rua, que reunia boas construções com proprietários que conheciam bem uns aos outros. E quem diria que ainda hoje, a menos de cinco minutos a pé da Praça Getúlio Vargas, podemos nos deparar com um cenário que mais lembra localidades do Oriente Médio assoladas por bombardeios. Em dias de sol a poeira domina o espaço, principalmente durante a circulação de veículos. Nas épocas chuvosas, tanto a rua como os locais onde outrora existiam casas se transformam num verdadeiro atoleiro. Ver o Edifício Monte Carlo cortado ao meio, com pedaços dos banheiros dos apartamentos de um bloco pendurados ainda com chuveiros e espelhos presos ao que restou de paredes é mesmo de impressionar.
Até agora as únicas intervenções realizadas na Cristina Ziede pelo governo do estado foram as contenções da base da encosta com muros de gabião (blocos compactados de pedras e amarrados com arames) e drenagens com calhas de concreto, além do plantio de vegetações rasteiras que ajudam a apagar um pouco das gigantescas cicatrizes abertas numa imensa montanha que margeia o lado ímpar da rua. Mas ainda há muito o que fazer. A enxurrada captada pelas calhas em dias de chuva forte despeja grande quantidade de lama e entulhos no espaço onde casas foram soterradas em 2011. O grande volume de material invade a rua e acaba até por escavar a base do muro de gabião em alguns trechos. Moradores que ficaram ali e os que se animam a voltar agora clamam por obras de canalização das águas da encosta e pela urbanização do trecho devastado da rua.
O engenheiro Luiz Eduardo Abicalil de Moura viveu 50 anos na Rua Cristina Ziede e ainda se choca toda vez que visita os pais nos fins de semana. “Chega a dar pena. Passo por aqui e não consigo acreditar. Conhecia todas as pessoas que moravam nas casas que hoje viraram um amontoado de poeira”, lamenta ele, incomodado com a utilização do espaço devastado pela tragédia que abre margem para o denominado “turismo mórbido”. Segundo os moradores é constante o número de pessoas que vai até a Cristina Ziede fotografar e filmar o cenário de pós-tragédia, principalmente o Edifício Monte Carlo, embora não interditado pela Defesa Civil, completamente evacuado pelos próprios moradores. Os entornos do edifício e os escombros de casas destruídas pela avalanche, ainda de acordo com vizinhos, têm servido à prática de atividades ilícitas, como consumo de drogas e prostituição.
Para evitar que os terrenos que um dia abrigaram imóveis sejam definitivamente invadidos, alguns proprietários optaram por cercá-los, a fim de evitar que os espaços sejam “oficializados” como estacionamentos. “Qualquer dia vão murar esses lotes, que já se confundem com a rua, e começar a cobrar por vagas de estacionamento rotativo. O poder público deveria agir com mais dignidade. São histórias de vida passadas aqui e destruídas de forma tão brutal. O que custa pavimentar a rua e recolocar os meios-fios para aos poucos ir recuperando essa imagem tão triste? Quem irá indenizar esses moradores? A Prefeitura tem que se manifestar”, reclama Luiz, que teme pela segurança dos seus pais na Rua Cristina Ziede. “Eles estão idosos e até já caíram aqui em meio a tantos buracos. Para evitar novos acidentes, meus pais ficam num apartamento próximo e só passam os fins de semana aqui”, completa o engenheiro.
Manifesto à ouvidoria da Prefeitura cobrará obras
Os moradores e amigos da Rua Cristina Ziede organizam um manifesto com o recolhimento de assinaturas a ser encaminhado nos próximos dias à ouvidoria da Prefeitura de Nova Friburgo para cobrar intervenções urgentes do poder público na via, já que ao estado coube apenas as obras de contenção da encosta. Os moradores querem a urbanização e uma definição aos proprietários que tiveram suas casas soterradas. Afinal, essas vítimas serão indenizadas? Terão direito a uma casa em outro local? Essas são perguntas até hoje não respondidas e que perturbam quem passou por uma tragédia inimaginável em 2011 e perdeu entes queridos e bens. “Não só para quem morou ou ainda mora na Rua Cristina Ziede, mas também para qualquer friburguense o cenário do jeito que está hoje incomoda. É preciso também dar uma definição para o Edifício Monte Carlo. Ele deve ter o bloco atingido derrubado. Dá para recuperar toda a estrutura? Precisamos de soluções! Nenhuma autoridade nos procurou ainda para dar uma posição”, destaca a comerciante Eliane Abicalil de Moura, que recolhe assinaturas de simpatizantes ao movimento na loja de roupas Casa Libaneza, na Praça Getúlio Vargas.
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