Vinicius Gastin
Assim como a maioria dos clubes brasileiros, o Friburguense encontra dificuldades para manter em dia a situação financeira. Na última semana, a Câmara de Vereadores aprovou uma subvenção de 120 mil reais ao ano, o que corresponde a 10 mil por mês para o clube. No entanto o valor, ainda a ser liberado pela Prefeitura e repassado à Secretaria de Esportes, não poderá ser aplicado no futebol profissional. Ainda assim, todo o montante não seria suficiente para cobrir um mês de despesas do tricolor da serra—hoje em torno de 140 mil.
Ao todo, o Friburguense tem cerca de um milhão e meio de reais em despesas por ano. As receitas provêm do patrocínio da Stam, que adiantou quase todos os valores até o fim de 2014, e as cotas de televisão na faixa de um milhão de reais. Entretanto, devido à queda em 2011, o Frizão só terá direito a 50% do valor total, fora o desconto dos impostos. O tricolor voltará a receber integralmente apenas em 2015 (cresce 25% a cada ano que o clube se mantém na elite). Em entrevista, o gerente de futebol José Siqueira fala sobre as finanças do clube, revela as dificuldades para reforçar o plantel e o ambicioso projeto de fechar o anel do Eduardo Guinle. O dirigente conta como será utilizado o dinheiro da subvenção e acredita que este é o primeiro passo para estreitar as relações entre o Friburguense e o poder público.
AVS: É verdade que, de acordo com a lei, os recursos da subvenção não podem ser aplicados no futebol profissional?
Siqueira: Sim, é verdade. Nesse primeiro ano receberemos um valor que nós tínhamos de administrações anteriores, que haviam acertado patrocínio com a gente e não pagaram. Eu observei muita gente dizendo que o Friburguense poderia, a partir de agora, fazer contratações. Esse é um pensamento equivocado e provinciano. Quero deixar bem claro que, como é uma subvenção, não podemos envolver em momento nenhum o lado profissional.
AVS: Como então será empregado o dinheiro anunciado pela Prefeitura de Nova Friburgo, caso seja mesmo liberado?
Siqueira: Será investido nos meninos. Esse é um trabalho que pouca gente observa, porque o mais importante de um clube de futebol é o seu time profissional e fala-se muito pouco na base. Iniciamos há pouco tempo uma escolinha fundamentada em um trabalho social a partir de cinco anos. Mas já temos em nossas categorias de base cerca de 400 pessoas entre jovens e profissionais envolvidos diretamente. Este trabalho não é patrocinado e com certeza teremos a oportunidade de uma ajuda através desse dinheiro da subvenção. Poderemos desenvolvê-lo melhor.
AVS: As divisões de base geram uma despesa grande ao clube?
Siqueira: Nós alojamos, além dos jogadores de Nova Friburgo, alguns outros de diversas partes do estado e servimos, em média, 60 almoços, 60 lanches e outros 60 jantares. Isso totaliza 180 refeições por dia. Cada categoria tem a sua comissão, com um treinador para cada. Isso gera um gasto muito grande, pois todos são profissionais e possuem o seu certificado de Educação Física. Ainda tem a questão das viagens, arbitragem nos jogos, material, medicamentos, médicos e outros. O gasto hoje só com a base gira em torno de 30 a 40 mil por mês, sem considerar os campeonatos. Temos sempre às segundas-feiras uma psicóloga que trata as questões familiares, o lado pessoal do atleta. Em fevereiro voltaremos a oferecer o tratamento dentário. Cerca de 80% desses 400 jogadores que citei não conseguem chegar ao futebol profissional, mas saem do Friburguense mais disciplinados e preparados pra vida.
AVS: Qual a atual realidade referente às despesas mensais do Friburguense?
Siqueira: Temos uma média de despesas de 140 mil reais mensais, no Friburguense. Esse valor de 120 mil reais, da subvenção, não dá para fazer um mês de futebol. Estamos disputando um campeonato estadual onde um jogador do Fluminense ganha 600 mil por mês, que é o valor do nosso gasto total durante toda a competição. E nós competimos com a mesma responsabilidade e cobrança de nos mantermos na elite. Teremos times do nosso nível com grandes investimentos, pois hoje o futebol é um grande negócio. A subvenção vai ajudar demais, sobretudo no trabalho de base. Mas vale salientar que a lei foi aprovada e não há nada definido. Existe uma série de documentos que são exigidos, remanejamento desse valor que o prefeito tem que fazer para a Secretaria de Esporte e outras questões. Sabemos que a secretaria trabalha com uma receita bem reduzida e até agora não sabemos como, quando e se esse dinheiro vai chegar.
AVS: E como o clube sobrevive? Quais as fontes de receitas além do patrocínio da Stam?
Siqueira: O Friburguense, com um trabalho humilde, gasta um milhão e meio de reais por ano. É uma luta muito grande e precisamos fazer negócio através dos jogadores, que são o nosso produto. Temos um patrocínio da Stam que representa 30% desse valor, chega a 360 mil reais. A cota de televisão, desde que fomos rebaixados e voltamos, vem sendo remanejada. No primeiro ano após o acesso, temos 25% do valor de um milhão. No segundo, que é o nosso caso, temos 50% e assim vai. No quarto ano você se estabiliza e volta a ter o valor total. Ainda sofremos 20% de desconto do imposto e dos direitos de arena, que o jogador ganha pela visibilidade. Na verdade, temos 350 mil para o Friburguense. Se a gente pegar esse valor e somar a todos os adiantamentos que tivemos da Stam, estamos quitando o ano passado e a série D, formando uma nova dívida esse ano. Isso tudo aconteceu porque a gente caiu em 2011. Estamos num processo para quitar tudo isso, como tínhamos feito em 2010. Se não tivéssemos caído, tudo seria diferente, teríamos uma nova etapa no financeiro.
AVS: Sendo assim, manter o clube na elite é o objetivo em 2013 até mesmo pela questão financeira?
Siqueira: Com certeza, temos que nos manter na primeira. Muita gente acha que renovamos muito pouco o time, mas temos que continuar nesse caminho de manter alguns jogadores que são imprescindíveis, como Sergio Gomes, Cadão, Bidu, Ziquinha. E agregar novos talentos que trazemos da base, como o Romulo, Lucas, Diego Guerra e outros que são novatos e que estão no grupo há dois anos.
AVS: Até que ponto a instabilidade financeira atrapalha na contratação de reforços?
Siqueira: A maioria de jogadores que nós tínhamos em vista para completar o elenco recebeu uma proposta melhor financeiramente. Precisávamos de no máximo três, e um no nível do Abedi e Geraldo. Mas não dá nem pra conversar quando existe a proposta de outro clube. O Abedi estava afastado do futebol carioca e tentamos convencê-lo a voltar, mas a Cabofriense teve a mesma ideia e ofereceu praticamente o dobro de salário. No caso do Geraldo, que foi parecido, o Fortaleza ofereceu algo em torno de 30 mil, totalmente fora do momento que estamos vivendo. Já tivemos épocas melhores, pudemos trazer alguns jogadores de nome, mas agora é diferente.
AVS: Qual é o caminho para melhorar a saúde financeira do clube?
Siqueira: O caminho é a renovação e o investimento na base. Os valores têm surgido, a exemplo do Rômulo Azevedo, o Bruno e outros menos conhecidos, por enquanto. Essa é a nossa grande receita hoje. Não podemos gastar mais de 140 mil por mês. Times como o Macaé, Resende, Boavista e Volta Redonda têm uma folha salarial muito grande e eles levaram o Marcos, o Gleison, o Bill, o André Gomes, o Gedeil, o Ricardinho. São jogadores que apareceram aqui e não tivemos condições de manter quando o trabalho deles apareceu.
AVS: A disputa da série D gerou uma despesa grande ao clube?
Siqueira: A série D era a aposta de um passo a mais em termos de crescimento do clube e estivemos muito perto de conseguir. Até hoje procuramos explicações e não encontramos. Mas cada coisa tem o seu momento. Uma grande campanha no estadual vai mostrar uma boa imagem, mas não dá para expandir os rumos do clube. Vamos nos tornar grandes através da competição nacional. Se o Friburguense atinge uma série B, vai estar a dois passos do maior campeonato do país. Em termos de marketing, imagem, receitas e exposição, a série B é excelente. Queremos agradecer à Stam e ao Rogério Faria pelo apoio. Batemos na trave, mas o objetivo continua sendo chegar à série B do Brasileirão, em breve. Vamos buscar a vaga através do Carioca.
AVS: Em caso de nova classificação para a série D neste ano, o Friburguense terá condições de disputá-la?
Siqueira: Tudo dentro das possibilidades. Não vamos fazer nenhuma loucura. As pessoas entenderam o processo, acreditaram no nosso trabalho e isso depende do envolvimento delas. O primeiro objetivo é ser o melhor dos pequenos no estadual, conquistando assim as vagas na série D e na Copa do Brasil. A partir daí, estaremos criando uma fórmula para dar continuidade. Não tem mais como fazer cinco meses de futebol profissional, é preciso ter um calendário durante o ano todo.
AVS: O Friburguense foi o clube de médio porte que mais teve jogos transmitidos pela TV aberta em 2012. Não acha que merece uma maior valorização por parte dos setores público e privado?
Siqueira: Quando se fala em um empresário local, eu nunca vi ninguém ter um apoio tão forte de uma empresa particular como nós temos. O restante é realmente o dinheiro público. Com todo o carinho e amizade que tenho com essa nova equipe de governo, acho que a ajuda deve chegar. Entretanto, temos times de prefeituras que ficaram no meio do caminho. A Cabofriense deve melhorar agora, porque o Alair Correa voltou e apoia. Mas quando não existe esse apoio, o clube cai de divisão. Temos que ser independentes e caminhar com as próprias pernas. A subvenção para um trabalho social é sempre muito bem-vinda, pois além de contribuir na formação do homem, pode ajudar o Friburguense a encontrar novos valores. Hoje nós temos todo o compromisso de exposição de marca nas camisas e shorts até 2014.
AVS: Como o poder público poderia ajudar ao Friburguense?
Siqueira: Existem outras formas de ajudar. Em projetos de fechamento do anel de arquibancadas do estádio, por exemplo. Acho que seria interessante a prefeitura estar junto. Isso aumenta o patrimônio do clube sim, mas poderemos trazer eventos grandes de Campeonato Brasileiro pra cá, o que é bom pra cidade. Tirando o Engenhão e São Januário, temos como praças esportivas o Moacyrzão, o Raulino de Oliveira e daqui a pouco, o Maracanã. E por que isso? Lá tem o anel fechado, estrutura e a TV Globo entende que vai dar uma visibilidade legal. Essa sensibilidade do poder público é interessante, pois haverá um retorno pro povo. Mas o pensamento da maioria das cidades do interior ainda é muito provinciano. Temos muitas coisas para serem resolvidas em outras áreas, sem dúvida alguma. Mas a subvenção é o início, o caminho. Ficamos agradecidos e, no decorrer do tempo, essa equipe vai perceber o valor e a representatividade do Friburguense e nos ajudará mais.
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