Henrique Amorim
O centenário casarão do bairro Vila Amélia, que durante 48 anos abrigou a 151ª DP, atualmente se deteriora a olhos vistos. Rebocos caindo, fiações elétricas expostas, infiltrações e o madeiramento, tanto do telhado, como do piso interno, bastante comprometidos. Nesta segunda-feira, 13, faz 11 meses que a unidade da Polícia Civil no município deixou o imóvel, transferindo-se para uma nova e moderna sede na Vila Nova e a Associação Friburguense de Pais e Amigos do Educando (Afape), proprietária do casarão, não consegue arcar sequer com as despesas de manutenção do imóvel vazio e infestado por cupins, escorpiões e roedores.
A entidade assistencial sobrevive de repasses oficiais, que somam em média R$ 35 mil mensais, creditados geralmente com atraso. A conclusão é óbvia: sobram dificuldades para garantir a assistência médica, educacional e terapêutica dos mais de 300 assistidos, a maioria crianças e jovens, e ainda honrar a folha de pagamento da equipe de funcionários. “Ah se não fosse a caridade de muitos que se sensibilizam e nos ajudam”, diz o presidente da Afape, o advogado Jorge Wilson Vieira.
Com a entrega das chaves do casarão, a diretoria vislumbrou a possibilidade de aumentar a arrecadação mensal da instituição que recebia da Secretaria Estadual de Segurança Pública R$ 7 mil mensais pelo aluguel da antiga sede da delegacia. É bom lembrar, sem nenhum investimento em reformas e uma dívida de aluguéis atrasados que ultrapassam R$ 50 mil. A reconstrução do telhado do casarão, há quase cinco anos, foi obra viabilizada por entidades que se sensibilizaram com o risco que policiais e a comunidade sofriam ali.
Jorge conta que inicialmente pensou em oferecer o casarão para alguém que desejasse alugá-lo, responsabilizando-se ainda por sua restauração e manutenção, mas não encontrou interessados. “Ofereci o casarão para órgãos públicos, empresas e demais profissionais. No final, ofertei-o até mesmo de graça em troca só da manutenção. Nem assim, ninguém se interessou. O Sesi também não manifestou interesse em assumir o casarão para ampliar sua unidade, devido à falta de recursos”, disse ele, que encaminhou semana passada à Secretaria Municipal de Meio Ambiente um pedido de autorização para demolição do casarão centenário da Vila Amélia e dos anexos que serviram à Polícia Civil, inclusive a antiga carceragem, que ocupam parte do terreno de dois mil metros quadrados, avaliado pelo mercado imobiliário em aproximadamente R$ 700 mil.
A ideia é que no local seja construído um condomínio residencial com cinco blocos de apartamentos com três ou até quatro pavimentos. A proposta é de uma construtora da Região dos Lagos, com filial em Nova Friburgo, que se interessou pelo espaço, mas não aceita a hipótese de manter o casarão em meio ao condomínio, restaurando-o. A construtora oferece à Afape em contrapartida a cessão de até 15% do total de apartamentos para que a instituição os administre.
“Poderemos vender esses apartamentos e aplicar o dinheiro apurado em linhas de financiamento nos bancos gerando uma renda estimada de R$ 45 mil por mês ou alugá-los por até R$ 650 mensais garantindo uma renda fixa e vitalícia à Afape”, avalia o presidente da instituição ante ao dilema do momento: investir na preservação do patrimônio histórico ou garantir e até mesmo ampliar a prestação de serviços aos portadores de necessidades especiais assistidos pela Afape. Eis a questão.
Após vistoria, Secretaria de Cultura emitirá parecer técnico favorável ao tombamento do casarão ao patrimônio histórico
Na última segunda-feira, 6, técnicos do Departamento de Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura e diretores da Afape vistoriaram o casarão da Vila Amélia quando atestou-se sua grande importância histórica. “Nova Friburgo é um município que precisa dar mais valor a preservação do seu patrimônio. Poucos casarões foram mantidos e aos poucos a memória vai se perdendo. É uma pena perder essa construção muito semelhante a do solar do ex-deputado Galdino do Valle Filho, felizmente já tombada. Atualmente há casarões em Nova Friburgo em estado bem piores que esse da Vila Amélia”, observa a diretora do departamento, Lílian Barretto.
Ela espera encaminhar nos próximos dias à Secretaria Municipal de Cultura um parecer técnico favorável ao tombamento do casarão que será analisado pelo prefeito. Na avaliação foram enumeradas várias características da construção do casarão que possui um amplo vitrô junto às escadarias de madeira, janelas com venezianas de quase dois metros, sacadas e varandões. Em suma, um símbolo que estampa no alto da fachada o nome do bairro, ainda com “villa” grafado assim, com duas letras l. Caso o tombamento seja concluído, quem irá restaurar o casarão? O dilema continua.
Casarão da Vila Amélia faz parte do patrimônio e precisa ser preservado
Dalva Ventura
O casarão senhorial do Sítio da “Villa Amélia”, que durante anos foi ocupado pela Delegacia de Polícia encontra-se, é verdade, num estado de total degradação. Apesar de ser um prédio histórico, de relevante valor arquitetônico, não chegou a ser tombado nem pelo Instituto Estadual de Patrimônio Cultural nem, muito menos, pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Em 1968 o prefeito Amâncio Mário de Azevedo doou à Afape o terreno da Rua Souza Cardoso onde fica a quadra localizada em frente ao Mercado da Vila Amélia. Em novembro de 1982—ou seja, 14 anos depois—o prefeito Alencar Pires Barroso e a Afape fizeram uma permuta, trocando este terreno por um outro, localizado na Rua Teresópolis, ao lado do Sesi, que estava cedido ao governo do estado para abrigar a 151ª Delegacia Policial, a carceragem e outras dependências da Secretaria de Segurança Pública. A partir daí, o estado passou a pagar aluguel à Afape.
Quem conheceu o casarão nos seus áureos tempos não se conforma com o fato de estarmos prestes a perder um dos poucos que restaram da época em que Nova Friburgo era só beleza e encantamento. “O prédio está em frangalhos, mas poderia ser restaurado. O madeirame em tábuas de pinho de riga está todo lá, não foi tirado um único vitral”, lamenta a professora Dilva de Moraes. “A gente morava ali perto, numa casa da Fábrica de Filó e eu me lembro que quando passávamos por lá, às vezes conseguíamos enganar os cachorros e pegar umas frutas”, recorda-se.
Carlos Jayme Jaccoud também se lembra com saudade de, quando criança, em seus passeios matinais com os irmãos, ir comprar peras e maçãs na chácara. “Era enorme, ia dali onde hoje era a feira até o Sesi. Um absurdo o que estão fazendo com esta cidade, estão acabando com sua história”, declarou.
Thereza Albuquerque e Mello não aceita de forma alguma “a destruição dos últimos casarões que restaram na cidade para a especulação imobiliária”. Ela se lembra com carinho da “chácara do Sr. Pinto”, onde os friburguenses compravam frutas e lamenta, profundamente, a possibilidade de a cidade vir a perder este prédio. “Não sei como, mas precisamos fazer alguma coisa. É uma pena, é revoltante, assistirmos, passivos, mais este patrimônio vir abaixo”, disse.
Deixe o seu comentário