Henrique Amorim
Começar de novo. Essa é a esperança de muitos sobreviventes da catástrofe de 12 de janeiro de 2011 que tiveram seus lares destruídos ou interditados pela Defesa Civil. Reconstruir suas vidas em casas novas e erguidas em locais seguros sem o risco de deslizamentos de encostas ou enchentes é melhor ainda. Em Nova Friburgo, pelo menos 22 famílias terão a oportunidade de voltar a morar em imóveis próprios graças a uma louvável iniciativa das Testemunhas de Jeová. Membros da religião, que reúne seguidores em todo o mundo, beneficiarão mês que vem sete famílias de desabrigados com a entrega de casas de um, dois e até três quartos, construídas num terreno plano, de 2,1 mil metros quadrados, na Rua 10 de outubro, bem no centro do distrito rural de Amparo.
O mutirão, iniciado em março, segue em ritmo acelerado com cerca de 30 voluntários, quase a metade mulheres, todos os dias e sem hora para terminar. Estes “operários” e “operárias”, que não moram em Nova Friburgo, pernoitam na Escola Municipal Hermenegildo Gripp, bem próximo ao canteiro de obras, e nos fins de semana o trabalho em nome da solidariedade ganha considerável reforço. “Já teve sábado e domingo que trabalharam aqui mais de 200 pessoas. Costumam vir irmãos [demais membros das Testemunhas de Jeová] de congregações de todo o estado, principalmente do Rio de Janeiro e Baixada Fluminense”, conta orgulhoso o coordenador da comissão de ajuda humanitária das Testemunhas de Jeová, Arthur Pacheco.
Depois da conclusão das sete casas em Amparo, outras oito serão construídas no Loteamento Santa Bernadete, no bairro São Geraldo, e mais sete no distrito rural de Campo do Coelho. Os imóveis são os primeiros construídos no município para atender aos desabrigados. As construções impressionam pelo projeto arquitetônico e a qualidade do material. O projeto supera, e muito, os tradicionais conjuntos habitacionais. “Compramos os materiais de um mesmo fornecedor, ou seja, o cimento de um lugar, o tijolo de outro, o material de acabamento de um terceiro. Assim conseguimos preços melhores, mas não abrimos mão da qualidade. São casas simples, mas dignas para os moradores que precisam de um estímulo a mais para recomeçar uma nova etapa em suas vidas”, observa o secretário da comissão de ajuda humanitária, Carlos Soares.
As famílias beneficiadas já estão sendo selecionadas pelas 17 congregações das Testemunhas de Jeová em Nova Friburgo e os membros que tiveram suas casas atingidas na tragédia terão preferência. Junto às chaves os beneficiados receberão as escrituras dos imóveis. Tudo gratuitamente.
As construções das casas, com 2,70 metro de altura, obedecem a um projeto arquitetônico com cômodos amplos, cozinhas americanas e banheiros com revestimento cerâmico nas paredes. Os telhados são de amianto, mas com isolamento térmico e acústico e acabamento com forros de PVC. Os tijolos são de um fabricante paulista e resinados, o que dispensa o reboco. “Decidimos emboçar as paredes internas para garantir melhor luminosidade. Por fora os tijolos à mostra garantem a padronização dos futuros condomínios. O esgotamento sanitário não agredirá o meio ambiente, pois cada casa terá sua fossa própria com filtro séptico”, complementa Arthur Pacheco. O condomínio será todo murado, urbanizado e contará ainda com jardins e garagens.
Custeio das obras vem de fundo mundial para ajuda humanitária
As Testemunhas de Jeová preferem não divulgar valores dos custos com o projeto social, mas revelam que tanto a aquisição do terreno em Amparo como de todos os materiais de construção foi paga à vista, e os preços foram os de mercado. E também será assim nas próximas duas demais fases da iniciativa em Nova Friburgo, cuja tramitação burocrática de legalização dos terrenos já está em andamento. Todo o dinheiro investido nas obras é oriundo de um fundo de ajuda humanitária mantido pelas Testemunhas de Jeová em todo o mundo e utilizado sempre em ações emergenciais pós-catástrofe. Ano passado, os membros distribuíram, graças ao fundo, 700 toneladas de alimentos, outras 400 de materiais de higiene pessoal, 60 toneladas de roupas e calçados e mais de 1,5 milhão de litros de água para as vítimas do desastre na Região Serrana.
“Essas doações não são dízimos. São ofertas feitas de todo coração pelos irmãos de todo o mundo. Atuamos naquilo que as pessoas precisam. Aqui a carência é de casas, então estamos construindo. Se a carência fosse de alimentos, iríamos comprar e distribuir comida. Lá em casa eu e minha esposa fizemos doações para essa frente de emergência, mas eu não sei quanto ela doou e ela não sabe quanto eu doei. Ofertamos aquilo que pudemos e quisemos, seguindo os preceitos de Deus, que nos ensina a ajudar o próximo”, diz Arthur, lembrando que na vizinha Teresópolis também serão construídas em mutirão outras 30 casas para vítimas das chuvas de 2011. “Somos estudiosos da Bíblia e lá está escrito que não devemos apenas nos comover com a necessidade alheia. Temos que ajudar nossos irmãos de verdade, com atos concretos”, observa Carlos Soares.
Voluntários recebem treinamento especial para a construção civil
É impressionante o ritmo acelerado da construção das casas no futuro condomínio que as Testemunhas de Jeová encabeçam em Amparo. Chama atenção o trabalho das mulheres, que não hesitam pegar no pesado, empurrar carrinho de mão, carregar tijolos e sacos de cimento, levantar paredes de alvenaria, instalar redes elétrica e hidráulica e até revestir paredes e o chão com pisos cerâmicos. Para tanto, todos eles receberam um treinamento especial das frentes de mutirões voluntários, que construíram só no ano passado 179 salões do reino, lugar onde as Testemunhas de Jeová se reúnem para celebrações e estudos bíblicos. Tudo em tempo recorde. Cada salão do reino fica pronto em até 45 dias.
Nos mutirões de construção é comum encontrar casais “pegando no pesado” e mulheres que deixam as horas de folga de lado para uma atividade espiritualmente gratificante. É o caso de Rhana Monteiro, moradora do Jardim Ouro Preto, distrito de Conselheiro Paulino, que todo dia viaja quase 20 quilômetros para se dedicar à construção das casas. No dia que a reportagem visitou o canteiro de obras ela assentava azulejos num banheiro com total perfeição. “Recebi um treinamento para isso e antes não me imaginava trabalhando em obra, mas faço de coração. Antes dessa tarefa, peguei no pesado na fase bruta da construção”, conta, orgulhosa. Nos fins de semana e momentos de folga, as próprias famílias que serão beneficiadas se juntam aos demais irmãos das congregações das Testemunhas de Jeová e também ajudam a erguer seus novos lares.
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