Nas frequentes reuniões com os amigos, entre os assuntos vários que transitam por essas ocasiões informais, nossa cidade é quase sempre um tema que inevitavelmente abordamos. Nova Friburgo tem uma história ímpar, repleta de fatos únicos e que infelizmente hoje são ignorados ou desconhecidos pela maioria de seus habitantes. Não se trata aqui de reforçar posturas etnocêntricas vinculadas à ideia de “Suíça brasileira” ou outros delírios europeizantes. Porém uma questão não pode ser ignorada por qualquer pessoa que busque estabelecer um olhar mais aprofundado sobre a cidade: os marcos históricos. Estes demarcam a fundação da vila, posteriormente os processos de transformação da cidade e precisam ser constantemente ressignificados se pretendemos alcançar o status de uma sociedade coesa e com mais justiça social. A identificação desses marcos não constitui uma tarefa obscura ou inacessível. A partir da brilhante tese de doutoramento do historiador suíço Martin Nicoulin, “La Genèse de Nova Friburgo”, ficaram claros os contextos e as motivações que resultaram na fundação da Vila de Nova Friburgo. Seguiram-se outros trabalhos esclarecedores publicados pelos professores doutores Jorge Miguel Mayer e João Raimundo de Araújo, elaborados dentro de abordagens historiográficas consistentes, que se complementam em estudos mais recentes produzidos por uma nova geração de historiadores com fecunda formação acadêmica, a saber: Ricardo da Gama Costa e Janaína Botelho.
Sugerimos a todos os interessados, como leitura inicial, o livro “Teia Serrana”, organizado de forma clara e até didática, que a nosso ver deveria ser o livro de cabeceira daqueles que se propõem a atuar como nossos administradores públicos, já que a obra revela, com detalhes, aspectos importantes para o entendimento da história friburguense. Alguns podem argumentar que essas ideias se referem a “coisas de antigamente”, narrativas perdidas no tempo, longe das questões que se apresentam urgentes e incontornáveis no dia a dia da cidade. Mas é aí que está o engano, a história é construída do presente para o passado. As visões de mundo hoje são consequências das permanências e rupturas que os acontecimentos históricos abarcam. Resumindo: o presente infere o passado e o passado infere o presente.
Nova Friburgo produziu recentemente um importante documento histórico que foi o Plano Diretor. Documento premiado e reconhecido nacionalmente. Trata-se de um estudo detalhado, construído a partir de inúmeros debates, em que as demandas das comunidades das várias regiões do município foram apresentadas, resultando num corpus documental de cunho participativo, fundamental à compreensão das possibilidades, mas também dos limites para o desenvolvimento de nossa cidade. Cabe ao poder legislativo implementar leis para aplicação desse Plano, que, infelizmente, encontra-se ignorado. “Ninguém sabe, ninguém viu”. Nessa perspectiva, é incompreensível que os poderes municipais não tenham se apercebido das inúmeras interfaces que o turismo, a cultura e a educação podem estabelecer com a implantação do centro histórico da cidade, área já definida no Plano Diretor. Nova Friburgo é rica em potencialidades, cidade privilegiadamente inserida em um patrimônio natural de valor inestimável, com perfil de cidade histórica. Ufanismos à parte, também podemos ser: polo industrial (metalurgia e confecções), polo de agronegócios (floricultura e agricultura), polo educacional (universidades e instituições de pesquisa). Uma potencialidade não invalida a outra, Nova Friburgo pode ser isso tudo e ao mesmo tempo. Já se encontram presentes na estrutura socioeconômica do município os elementos necessários para a promoção dessas frentes, cabendo ao setor público e ao privado articular suas ações convergindo em padrões éticos e de eficiência.
Esse artigo não pretende apontar nenhuma posição político-partidária diante do horizonte já visível das próximas eleições municipais. Mas antes, propor uma reflexão. Os prefeitos passam, os vereadores passam, os secretários de governo passam, nós todos passaremos, mas Nova Friburgo cumprirá inexoravelmente sua trajetória histórica. Cabe a nós uma escolha: essa trajetória será construída orientada pela Ciência e o respeito ao bem comum, ou creditada ao destino e aos embusteiros de ocasião.
Aceito réplicas, desde que fundamentadas.
Mario Massena, artista plástico, tecnólogo em Conservação e Restauração de Bens Culturais—Faop-MG. Foi membro do Conselho Municipal de Cultura da cidade de Ouro Preto por ocasião dos festejos de 300 anos de sua fundação. Atualmente é graduando em História pela Unirio.
mariomassena@gmail.com
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