Falando de fábricas e laudos

quinta-feira, 15 de setembro de 2011
por Jornal A Voz da Serra

— Quando eu me formar me mudo para Nova Friburgo e vou trabalhar na Fábrica Ypu; o Pedrão casa comigo e vai para a Sinimbu.

Bem-humorada e apaixonada por Nova Friburgo, essa era a frase preferida de minha irmã. No entanto, apenas o casamento deu certo e o mais perto que eles chegaram de nossa cidade foi na lua de mel, em um hotel de Mury.

Corria a década de setenta e as fábricas friburguenses eram conhecidas e respeitadas em todo o Brasil. A então poderosa Ypu, com seus produtos de couro, era uma marca consagrada e seu imenso prédio, bem na entrada da cidade, motivo de orgulho.

Quarenta anos depois, enfrentando crises econômicas, mudanças de moedas e o inesperado “milagre” chinês, assistimos consternados ao fechamento da Fábrica de Rendas, simbolicamente determinando o fim de um ciclo, quando o nosso parque industrial chegou a ser considerado um dos mais importantes do país.

Sim, algumas indústrias ainda estão saudáveis e em plena atividade, sem falar no polo de lingerie, atraindo compradores todos os dias. Mas, a verdade é que as grandes empresas do início do século passado estão indo embora uma após a outra e não conseguimos mais atrair investimentos do mesmo porte.

Temos algumas dificuldades naturais: a serra, por exemplo, sempre dificultou o escoamento de nossos produtos. A estrada ficou acanhada e é mal conservada, além de cortar o centro da cidade. Não é possível construir um aeroporto, a ferrovia foi desativada e a segunda saída para a baixada é uma estrada sinuosa e perigosa, onde, aliás, é proibido o tráfego de caminhões.

Para complicar, Nova Friburgo está espremida entre montanhas e rios. Espaços grandes, planos e seguros para a construção de fábricas são raríssimos. Não existe uma política agressiva de incentivos fiscais e a acomodação de centenas de famílias de operários hoje, depois das chuvas de janeiro, seria uma tarefa complicada.

No entanto, a cidade tem vida própria e os edifícios das grandes fábricas, hoje vazios, abrigarão estudantes universitários, dando origem ao um novo ciclo, o da educação e formação profissional. De fato, a vinda de novas universidades seria capaz de revitalizar nossa economia, criando centros de pesquisa e excelência em setores como a saúde, agricultura e, porque não, até tecnologia de ponta.

Antigos gargalos terão de ser solucionados como a qualidade de nossas comunicações, principalmente os serviços de internet banda larga, transportes, luz, água, esgoto e serviços. O grande desafio seria manter e aproveitar os cérebros aqui formados.

Juntamente com o bom e atualmente esquecido turismo, a educação pode ser a luz no fim do túnel, talvez a nossa última oportunidade.

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Mudando completamente de assunto, há pouco tempo atrás, minha mulher, por conta de exames periódicos, recebeu um laudo de um patologista atestando a possibilidade de uma doença grave. Imediatamente procuramos um especialista que após uma pequena cirurgia nada encontrou e a vida seguiu normalmente.

Por que trouxe essa historinha para cá? É que nas últimas semanas o friburguense, eu inclusive, não fez outra coisa a não ser discutir e tentar entender laudos geológicos, preocupado, com toda a razão, com sua segurança com as chuvas que virão.

Meus amigos, um laudo serve, antes de qualquer coisa, para indicar que linha de ação tomar ou o que fazer diante do problema apontado. Lá em casa uma biopsia liquidou o assunto, mas em Nova Friburgo não precisamos de muitos laudos para perceber que ainda corremos perigo junto às encostas desprotegidas. Aliás, tal como nas enfermidades, o importante é agir com rapidez e eficiência, impedindo que o mal cresça como uma metástase maligna, impossível de ser controlada.

As águas voltarão em outubro, como desde sempre e o desmatamento na Amazônia prossegue inalterado, alterando o regime de chuvas das regiões Centro-Oeste e Sudeste. A famosa Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS) pode voltar a influenciar o clima do nosso lado e temos noção de que ainda não estamos nem um pouco preparados para um novo evento, não é mesmo?

Cabem a nós, moradores desta cidade que enfrenta um ano tão sofrido, exigir transparência nas informações que nos chegam. Tudo deve ser discutido às claras e é muito melhor que o susto venha agora, quando ainda estamos na estação seca, do que numa madrugada escura, debaixo de água dos rios e lama dos morros, sem saber para onde correr, pedir socorro ou até mesmo ajudar o próximo.

E o nosso tempo de discutir, meus caros leitores, está chegando ao limite.

Carlos Emerson Junior

carlosemersonjr@gmail.com

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