Henrique Amorim
Muita gente ainda desconhece, outras ouviram falar, algumas nem sequer entenderam direito, mas desde o último dia 4 de julho entrou em vigor a lei 12.403/2011 que alterou 32 artigos do Código de Processo Penal brasileiro. Entre as mudanças, a mais polêmica refere-se à garantia de reclusão somente aos que cometerem delitos graves passíveis de penas de prisão de quatro anos ou mais. A alteração estabeleceu ainda a possibilidade da cadeia ser submetida por pagamentos de fianças arbitradas pelos próprios delegados de polícia e não somente pela justiça, o monitoramento eletrônico dos que cometeram tais infrações, recolhimento domiciliar à noite, proibição de viajar e de frequentar determinados ambientes, impossibilidade de manter contato com determinadas pessoas e ainda ter as atividades econômicas suspensas. Todos os casos, porém, deverão ser objetos de análise dos delegados de polícia e a justiça. Se o infrator cometer vários delitos leves, cuja soma de todos renda mais de quatro anos de prisão, ele deverá ser privado da liberdade.
Com a nova lei as prisões preventivas só devem ser decretadas quando o acusado já tiver sido condenado pela justiça, nos casos de violência doméstica ou quando houver dúvidas sobre a identidade dos suspeitos. Vale destacar que os crimes leves que rendem penas inferiores a quatro anos de prisão são furto, porte ilegal de arma, homicídio culposo no trânsito (quando não houve a intenção de matar), apropriação indevida, dano ao bem público, contrabando, cárcere privado, coação de testemunha ou falso testemunho.
As alterações, embora ainda pouco divulgadas, geram bastante dúvidas. Será que impedir a prisão daqueles que cometerem “considerados leves” não poderia incentivar uma onda de crimes ante a maior sensação de impunidade? Ou será que em breve uma nova lei deverá reconsiderar o que é um crime leve ou hediondo? A VOZ DA SERRA foi às ruas saber o que a população friburguense pensa sobre essa polêmica que colabora ainda para tentar desafogar as carceragens pelo país afora, a maioria delas superlotadas, como a da 151ªDP, que reúne mais de 120 detentos num espaço onde deveriam caber 60.
“Antes de tudo, é preciso destacar que o juiz pode decretar a prisão se entender que, independente do delito cometido, o autor oferecer algum perigo a alguém ou a sociedade. Essa alteração recente, na verdade, não vai alterar a forma arcaica do nosso Código Penal que precisa de uma reformulação completa. É preciso atualizá-lo e trazê-lo para a nossa realidade. O Código Penal em vigor é de uma época em que o comportamento dos brasileiros era outro. Acredito que essa lei trará muitas surpresas. Vai ter gente que pode pensar na possibilidade de sair assaltando por aí na certeza que não poderá ser preso. Isso, de fato, pode contribuir para o aumento da sensação de impunidade, o que pode gerar maior insegurança entre a sociedade”
Manuel Joaquim Ferreira, advogado, Centro
“Acredito que essa mudança irá colaborar muito para aumentar a sensação de impunidade. Se poucas pessoas cometessem pequenos delitos no Brasil, tudo bem, mas hoje em dia, a maioria quer mesmo é levar vantagem. Com o amparo da lei garantindo a liberdade para determinadas infrações, muita gente vai achar que pode fazer coisas erradas, porque não haverá mais punição. Se a nossa realidade no Brasil fosse outra. É bem capaz de ter gente que cometa crimes piores a partir de então, achando que não será mais punido.”
Luiz Antônio Dias, jornalista, Centro
“Sou a favor desta mudança na lei, pois, em alguns casos, o cidadão comete algum delito sem ter essa intenção e acaba por força do nosso código penal sendo preso em flagrante e cumpre pena junto a criminosos de alto perigo. Ao final da pena, esse cidadão preso, sem ter má índole, pode tornar-se uma ameaça. O sistema prisional no Brasil, infelizmente, não corrige, sem contar a carência de uma reformulação urgente.”
César Iório, empresário, Centro
“Essa lei é por si só polêmica e merecia uma consulta popular, pois nosso código penal está muito ultrapassado e tem que ser totalmente reformulado. É necessário que seja feito um amplo estudo dessas alterações para não causar diferentes interpretações, nem aumento da sensação de impunidade entre a população. Vivemos numa realidade com uma lei baseada em costumes do século passado. Ao mesmo tempo, nossos presídios estão superlotados, com muitos presos que cometeram crimes leves.”
Renato Bravo, engenheiro, Cônego
“Isso não vai dar certo. Quem tem índole ruim vai debandar a fazer coisas erradas com a certeza de que não vai ser preso. E o pior. Com a certeza amparada pela lei. O governo criou isso para impedir que os ‘ladrões de galinha’ ocupem vagas nos presídios destinadas aos bandidos, mas os grandes criminosos, esses sim, mudando ou não a lei vão continuar soltos. Se as penas alternativas e as multas valessem mesmo e não fossem tão brandas, talvez muita gente pensasse duas vezes antes de cometer algum delito.”
Elias Eleutério Barbosa Batista, 24 anos, universitário de Direito, Olaria
“Essa nova lei, pelo jeito, não vai pegar. Qual o delegado que vai assumir depois o ônus de soltar um criminoso que cometeu um pequeno delito e por não receber punição alguma, como a cadeia, ficará a vontade para praticar atos ainda piores, na certeza que nada irá acontecer com ele. Cada vez ficamos mais desprotegidos. Infelizmente vivemos numa sociedade onde é mais inseguro viver fora do xadrez do que dentro dele.”
Geruza Cardoso de Alencar, 52 anos, professora, Vale dos Pinheiros
“Acho que o governo agiu certo. Quase sempre vemos na TV e nos jornais os problemas da superlotação dos presídios. A maioria dos presos nas delegacias, mesmo depois de condenados, cumpre pena nas delegacias porque não há vagas nas penitenciárias. Nelas, os presos porque cometeram crimes leves se misturam a grandes criminosos e saem de lá catedráticos na bandidagem. Essa decisão de não prendê-los, atribuindo penas alternativas é interessante, pois irá desafogar o sistema penitenciário.”
João Cardoso de Menezes e Silva, 43 anos, serventuário da justiça,
Icaraí, Niterói
(de férias em Nova Friburgo)
“ Se uma pessoa cometeu um crime e foi pega pela polícia não pode ser liberada. Se pegou, tem que prender. Que história é essa de trocar o xadrez por pagamento de cesta básica? Os grandes bandidões estão soltos e a polícia só prende quem deve a pensão dos filhos. Se não tem vaga, porque não se constrói mais presídios. Ia gerar mais emprego. Aqui em Friburgo há anos se discute se deve ou não construir um presídio. O xadrez da delegacia não cabe mais ninguém, e agora o governo inventa essa de não prender quem cometer crime leve. Se é crime, quem cometeu tem que pagar.”
Antônio Vicente de Lisboa, 67 anos, aposentado, Chácara do Paraíso
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