O Centro de Estudos Avançados de Governo e Administração Pública da Universidade de Brasília (CEAG/UnB) lançou um aplicativo gratuito para que a população informe relatos sobre a crise na Região Serrana do Rio de Janeiro. Até o momento, os deslizamentos devido às chuvas causaram a morte de mais de 855 pessoas e desabrigaram e desalojaram cerca de 30 mil pessoas*. O serviço está disponível no link http://mapacriserj.com. A população pode inserir relatos sobre diversas categorias: serviços disponíveis; condições da infra-estrutura; emergência; segurança; voluntariado; e pedidos de ajuda. Na plataforma é possível ver e enviar relatos e receber alertas.
O aplicativo on-line construído pela equipe de pesquisadores do CEAG/UnB foi baseado no Ushahidi, software desenvolvido por um grupo de tecnologia sem fins lucrativos especializado no desenvolvimento de programas em código aberto e gratuito para a coleta de informações, visualização e mapeamento interativo. A maior parte da equipe de desenvolvimento vem de diferentes países da África, além de profissionais dos EUA e Europa. O objetivo dos idealizadores do Ushahidi é criar ferramentas para democratizar a informação, aumentar a transparência e reduzir os obstáculos para que os indivíduos possam compartilhar suas histórias. Os responsáveis pelo Ushahidi definem-se como “uma organização que está disposta a assumir riscos para mudar a maneira tradicional dos fluxos de informação”.
O mapa dos Relatos da Crise na Região Serrana do Rio de Janeiro foi desenvolvido por Igor Morais e Sérgio Cruz, pesquisadores de tecnologia do CEAG, sob a coordenação do professor Paulo Carlos Du Pin Calmon e do pesquisador Marcel Pedroso.
“É um caso de transferência de tecnologia em uma direção muito diferente da que ocorre tradicionalmente. São raros os casos de tecnologias vindas da África para outros países do mundo. O diferencial da ferramenta é que a fonte de informações é a população (crowd source) constituindo-se como demonstração de uma estratégia participativa, comunitária e, de certa forma, uma arena deliberativa na qual a população se envolve diretamente não apenas na notificação das áreas necessárias de intervenção, mas também oferece serviços, ajuda e apoio para as pessoas em situação de risco”, explica o professor Paulo Calmon, coordenador do CEAG.
Ushahidi significa “testemunha”, em idioma banto, e foi desenvolvido inicialmente em resposta à violência pós-eleições, em janeiro de 2008, no Quênia. O aplicativo original foi usado para mapear os incidentes de violência e os esforços de paz em todo o país com base em relatórios apresentados pela web e pelo celular. O site tem 45 mil usuários no Quênia e foi o catalisador para que os criadores da iniciativa percebessem a necessidade da existência de uma plataforma que poderia ser utilizada por outras pessoas ao redor do mundo.
“O mapa é uma pequena contribuição do CEAG para a ajuda à Região Serrana. A ferramenta pode auxiliar na localização de pessoas, e, principalmente, na coordenação dos esforços para a reconstrução das áreas afetadas, fazendo com que a população se torne protagonista na produção de informações relevantes que podem ser utilizadas pelos voluntários, Centro de Coordenação Operacional, mídia e as autoridades competentes”, explica Marcel Pedroso, pesquisador do CEAG e um dos idealizadores do mapa.
No Brasil, a primeira iniciativa de uso do Ushahidi surgiu em 2010, com o “Eleitor 2010” (http://eleitor2010.com), um projeto apartidário e sem fins lucrativos para fiscalização colaborativa das eleições de 2010, construído com a finalidade de tornar-se um observatório do processo eleitoral, segundo a ótica do eleitor. A plataforma foi aberta para que a população enviasse diretamente relatos de denúncias de crimes eleitorais e irregularidades: boca-de-urna, comícios ou carreatas no dia da eleição, irregularidades em geral, e eventos similares relacionados ao processo de campanha e eleição em 2010. A ferramenta já foi utilizada em outras ocasiões no mundo, como em casos dos terremotos no Chile (http://chile.ushahidi.com) e no Haiti (http://haiti.ushahidi.com), além da polícia de Atlanta (http://crime.mapatl.com/).
“A percepção das pessoas para a necessidade de apoio a uma iniciativa como essa é chamada de superávit cognitivo, e trata-se da disposição da população dedicar parte da sua energia, tempo e conhecimento, dentro de uma rede social, cujos efeitos dessa ação vão reverter-se para a construção de uma rede para a própria comunidade. O mapa é uma contribuição da UnB para a construção de uma rede de apoio, de forma a colaborar com a sociedade a partir do conhecimento existente. Os instrumentos de coordenação, o apoio logístico e a própria mobilização das pessoas para essa situação são fundamentais para superar as dificuldades enfrentadas na Região Serrana”, acrescenta Paulo Calmon.
A plataforma está disponível no endereço http://mapacriserj.com.
* Números de 30 de janeiro de 2011.
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