Nascido em Pureza, 3º distrito de São Fidélis (RJ), em 13 de junho de 1969, Alzimar Andrade – que lança hoje, às 19h, no Centro de Arte, na Praça Getúlio Vargas, 71, seu livro Uma Justiça muito louca e outras histórias... – mudou-se para Nova Friburgo aos 4 anos, onde passou o resto da infância. Aos 18, em 1987, foi trabalhar no antigo Banco do Estado do Rio de Janeiro (Banerj), na cidade do Rio de Janeiro, transferindo-se para Trajano de Moraes, em 1994, passando depois para Duas Barras, retornando a Nova Friburgo a partir de 1995. Prevendo a privatização do banco e a mudança que isto traria, saiu do Banerj em 1996, em programa de demissão voluntária.
Em 2000, fez concursos para a Caixa Econômica Federal, para o Banco do Brasil e para o Tribunal de Justiça. Chegou a trabalhar alguns meses no Banco do Brasil, mas foi logo chamado pelo TJ, onde está até hoje. Alzimar se formou em Administração pela Universidade Candido Mendes em 1994 e em Direito, pela Estácio de Sá, em 2006. Atualmente, além do trabalho na Justiça, coordena um curso preparatório para concursos, onde dá muitas aulas, participa de programa de rádio com Pedro Osmar, na Rádio Friburgo AM, elabora um livro para advogados informando custas judiciais, que sempre requer atualização, e dá aulas na Escola de Administração Judiciária do Tribunal de Justiça. Sua dedicação ao trabalho, que lhe rendeu ter diversos ex-alunos em quase todos os cartórios e escritórios da prática judiciária, além de ser reconhecido por leitores, que sempre lhe trazem alguma questão para esclarecer, faz de Alzimar uma figura da Justiça. Numa conversa descontraída, ele falou ao A VOZ DA SERRA sobre o livro, sua carreira e suas experiências.
A VOZ DA SERRA – Você saiu de Nova Friburgo, teve oportunidade de se estabelecer em outro lugar, mas quis voltar para cá. Por que esta escolha?
Alzimar Andrade – Eu sempre gostei de Friburgo, não quis sair daqui. Saí porque fui obrigado profissionalmente. Quando eu estava no Banerj, lá no Rio, todos os dias saía do trabalho e ia lá na direção geral do banco pedir para voltar para Friburgo. Dizia que queria voltar, que morava em Friburgo, que minha família estava aqui. Perturbava os caras todos os dias até me trazerem de volta para cá. Consegui voltar, fiquei por aqui até que surgiu uma chance em um cargo melhor, dentro do Banerj, mas lá em Trajano de Moraes, e resolvi arriscar. Fiquei um ano por lá, depois fiquei um ano em Duas Barras e, depois, voltei em definitivo. Eu adoro tudo em Friburgo. Acho uma cidade bonita. Já conheci muitas outras cidades, mas gosto mais daqui. Acho que é uma cidade limpa, gosto do verde que tem aqui, dessa formação da cidade que está em um vale cercado de montanhas. Aquela chegada em Mury é fantástica, acho linda aquela paisagem. Adoro o lugar em que moro, Cascatinha, acordar de manhã e ver tudo em volta verde. E gosto muito das pessoas daqui. Eu cresci em Olaria, onde conheço muita gente. Já morei em vários bairros da cidade. Acho que aqui as pessoas se tratam bem. Aqui existe aquela coisa de vizinhança que não existe mais nas cidades grandes. É legal conhecer pessoas e encontrá-las na rua, trocar impressões com elas. Claro que isto está mudando, porque a cidade está crescendo, mas ainda existe essa identidade.
AVS – Você não percebe uma certa inquietação por aqui, apesar da cidade ser considerada por muita gente como conservadora?
Alzimar – Acho que Friburgo é uma cidade conservadora. Mas o perfil dos moradores daqui vai mudando com o tempo. As tradições que existem na cidade – dia disso, dia daquilo, as comemorações que são feitas – tudo isso compõe esse lado conservador da cidade. Aqui também tem muita gente que vem de fora. E com essa mistura que vai se processando, o jovem de hoje – e eu tenho duas filhas e posso observar isto nelas – tem essa inquietação. Acho que Friburgo favorece as atividades culturais e ligadas às artes. Existem aqui muitos artistas plásticos, muitos músicos de excelente nível, muitos escritores, muitos poetas. Acho que Friburgo tem uma tendência para a arte. E isto acontece sem que a administração da cidade ofereça maiores condições, mas os jovens se viram. Se não tem muito show para assistir, eles se organizam, montam seus grupinhos, suas bandas, fazem seus shows, suas atividades.
AVS – Este espírito poderia ser usado como uma atração turística, não acha?
Alzimar – Acaba se tornando, porque o turista que vem aqui e vê esse movimento, alguém na praça tocando, uma banda, mesmo grupos menores, como o Tom sobre Tom, que se apresenta na rua... é fantástico! Acho legal essa ideia de o turista chegar aqui, no Dia dos Namorados, ou no Natal, e ter um grupo local se apresentando e muita gente parando para ouvir. Isto é excelente para a cidade. E para o turista é interessante, porque não se acha mais isto em cidade grande.
AVS – Talvez em lugares como Conservatória, com os seresteiros, se encontre coisas assim, mas é menor...
Alzimar – Pois é, é muito pequeno e tradicional, mas Friburgo está inovando com esse tipo de coisa. E valoriza o artista local.
AVS – E o que você acha que provoca essas mudanças?
Alzimar – A necessidade. Por exemplo, aquele nó no trânsito, no Paissandu, aquela tragédia. Aquela praça pode ser bonita, mas é inútil, atrapalha o trânsito. E na hora em que se propõe uma mudança, mexer naquela praça, por exemplo, para o trânsito fluir, entram em cena os saudosistas, dizendo que não se pode alterar nada na praça porque ela tem não sei quantos anos, é tradição. É esse o conflito que se instala: o saudosistas querendo manter pela beleza, e o mais novo desejando a praticidade. É a necessidade que nos faz deixar um pouco o tradicional e olhar de um ponto de vista mais moderno o problema. E é preciso optar, não adianta ter a praça como cartão-postal e o morador estressado pelo engarrafamento do trânsito. Há coisas que precisam ser preservadas, outras não. Aquelas árvores da Praça Getúlio Vargas, por exemplo, são lindas, mas está na hora de se rever aquele espaço. As árvores estão velhas, estão caindo galhos. É possível reformular aquela praça, ter mais espaço para as pessoas caminharem e se divertirem, ter um pouco menos de árvores, mas árvores mais novas. É preciso saber agradar os dois lados e tornar a cidade mais prática.
AVS – E o seu livro com essas histórias da Justiça? Fale um pouco disto.
Alzimar – Eu trabalhei em A VOZ DA SERRA, anos atrás, entre a saída do Banerj, em 1996 e a entrada no Banco do Brasil, em 2000. Trabalhei na subeditoria, junto com a Angela Pedretti, e fui repórter também. E gosto muito do jornal e de toda a equipe. Quando saí de lá para trabalhar no banco, deixei esse vínculo com o jornal. Quando entrei para a Justiça, propus fazer uma coluna para o jornal, ideia aprovada pelo Laercio Ventura e pela Angela. Como eu estava trabalhando na Justiça, minha ideia inicial era fazer uma coluna que tratasse de temas jurídicos. No início, a coluna tinha um tom um pouco mais sério, orientava as pessoas quanto a direitos, comentava decisões judiciais que modificavam suas vidas. Uma vez, porém, fiz um texto que era um pouco mais leve, mais bem-humorado, e teve uma repercussão muito grande, muitas pessoas escreveram comentando. Passei, então, a mudar um pouco o enfoque da coluna e a fazer coisas mais leves, para o leitor se divertir, e não terminar de ler arrasado porque a decisão judicial era muito pesada. E o retorno foi muito maior. O livro é uma coletânea, tem parte dos textos mais sérios e outros mais bem humorados, mesmo falando de questões da Justiça, e outros em que o tema é mais variado. São 61 textos selecionados junto com a Candido Mendes, que deu apoio à produção do livro. Alguns sobre a Justiça, outros sobre o dia a dia, alguns assuntos pessoais, de lembranças de infância, de casos que aconteceram. E por ter tornado este projeto possível, gostaria de registrar meu agradecimento ao jornal A Voz da Serra, nas pessoas de Laércio e Angela, e à Universidade Candido Mendes, na pessoa do Alexandre Gazé.
AVS – Mas quando você trata das questões da Justiça, você contribui para a discussão da ideia de que a Justiça é o espaço para se resolverem os conflitos, coisa que em nossa tradição cultural é relativamente nova. Em nossa tradição recomenda-se queixar-se ao bispo, ou procurar o coronel quando há um conflito.
Alzimar – Algumas pessoas, às vezes, me procuram querendo tirar dúvidas jurídicas. Isto porque viram na coluna alguma menção que fiz a algum caso com que as pessoas se identificam. Quando eu boto na coluna uma decisão judicial – mesmo que seja engraçada ou pitoresca – a pessoa que tem uma questão parecida se sente estimulada a lutar na Justiça ou a querer conhecer melhor como a coisa funciona. Algumas pessoas têm direito a alguma coisa, mas não sabem como proceder e aí indagam sobre quem procurar, se é Vara Cível, se é Juizado Especial, se têm que ir de terno à audiência. São coisas simples do dia a dia, a respeito das quais o cidadão não tem a informação. A Justiça, infelizmente, ainda é para o povo uma coisa meio distante, o juiz está lá longe, é um cara de terno, fechado, tem um poder enorme e o cidadão comum se intimida diante disto. Essa impressão de que o juiz assusta a população é muito ruim para a democracia, porque a Justiça tem que estar ao lado do que é certo e ao lado do povo. Se eu, cidadão, tenho um direito, não posso ter medo de ir ao juiz brigar por ele. Assim, apresentar a Justiça como também sendo humana, faz o cidadão se sentir mais próximo dela. Ele pensa: eu posso, então, ir lá, apresentar meu problema e ter uma solução. Aproximar a população da Justiça – e eu procuro fazer isto com os textos que escrevo – é humanizá-la.
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