Os primeiros japoneses em Nova Friburgo
Publicamos hoje a terceira das seis partes em que, para caber no nosso espaço em A VOZ DA SERRA, dividimos esta história, escrita por Toko Kassuga, a matrona da família Kassuga em nossa terra, os primeiros japoneses a aqui se fixarem, em 1927.
Início dos kakis Kassuga
O dr. Zamith não cabia de contentamento pela fixação da família Kassuga nesta terra. A família Zamith inteira se dispôs a auxiliar com uma verdadeira dedicação, pois os recém-chegados não entendiam uma única palavra em português. Por intermédio deles, os Kassuga moraram por dois meses na, então, Rua General Pedra, numa casa de veraneio do sr. Cavalcante, estadista nessa época e que, também, acolheu-os gentilmente. Não bastando já esse grande favor, chamou um jovem inglês, funcionário da Leopoldina Railwey, para servir de intérprete. Infelizmente, devido à dificuldade de se entenderem por intermédio de um terceiro, que aqui não residia, Kassuga resolveu tratar os assuntos diretamente levando consigo dois dicionários, entregando ao dr. Zamith o dicionário português-japonês e ele, por sua vez, ficava com o de japonês-português. Assim, os dois, apontando as palavras, conseguiam, com dificuldade, resolver problemas e trocar ideias.
O dr. Zamith, então, tinha um terreno no Tingly, a 30 minutos da cidade, onde havia plantado uma variedade de árvores frutíferas e flores, como glicínias e camélias. Este sítio, para ele, era de um inestimável valor e estava sendo muito bem administrado. Justamente nessa ocasião havia uns pés de kakis com cica, tão carregados de frutas que os galhos chegavam a vergar. Soube-se que ele conseguia vendê-los dentro da cidade, como também no mercado do Rio de Janeiro.
Mas Kassuga, aos domingos, ia lá para os lados de Conselheiro Paulino e Amparo, com a espingarda nos ombros, procurava um terreno do seu agrado. Mas ele acabava sempre voltando para o sítio do dr. Zmith para contemplar as árvores frutíferas e para praticar o português com o administrador de lá, chamado Teodorico. Uma vez, encontrou entre os pés de kaki um em que a fruta não tinha cica. Pediu ele algumas frutas e as levou para a Embaixada do Japão, onde todos ficaram surpresos em saber que aqui, no Brasil, existiam kakis. Quando ele soube que estava à venda um sítio, ao lado do sítio do dr. Zamith, comprou-o imediatamente. Esse sítio pertencia a um descendente de suíços chamado Cardinot.
Kassuga resolveu plantar, imediatamente, pés de kakis no terreno adquirido.
Mais tarde, encontrado-se com o sr. Miura, diretor do jornal Paulista Shimbum, este o advertiu: “é preciso plantar arroz e feijão para sobreviver. Não é com frutas que se consegue o sustento”. Tudo isto era verdade, mas o casal Kassuga ainda tinha reserva financeira e pretendia fixar residência no Brasil e, jamais, tiveram a intenção de ganhar e vencer às pressas.
O clima e o ambiente tranquilo da cidade de Nova Friburgo os atraia de tal maneira que os comentários dos outros japoneses não fazia abalar os seus sentimentos. Ademais havia a família Zamith, a quem o casal Kassuga depositava toda a admiração e respeito.
Assim, no primeiro inverno do ano, se fez enxerto em cem pés de kakis, pés esses cedidos pelo dr. Zamith. Nos anos seguintes, foi aumentando mais e mais até conseguirem plantá-los em toda a parte elevada e em volta da sua residência.
O casal se deliciava, do fundo do coração, com a vida tranquila no sítio. Aos poucos foram se aproximando dos proprietários visinhos, mas a dificuldade da língua e dos hábitos completamente diferentes não permitiu um relacionamento profundo.
Com o passar do tempo e a existência ignorada pelos patrícios, fez-se sentir a monotonia e a tristeza quase insuportáveis. Foi quando apareceu, do Rio de Janeiro, os senhores Noda e Kouzou Ichigue, conselheiros da Embaixada, e mais os senhores Kaneda e Takahashi, funcionários dela. Depois o senhor Henichiro Hirose do Banco Yokohama. Todas essas pessoas vinham se revezando com a intenção de encher o vazio e encorajar o casal. Apareceu, também, o casal Yukiti Azuma, companheiro de travessia e auxiliar de Kassuga a bordo do navio que os trouxeram e que, não tendo encontrado emprego, veio procurá-los, e aqui ficaram durante meio ano. Tudo isso fez com que o casal Kassuga levantasse a moral e, de alguma forma, os ajudaram a sair da tristeza e isolamento.
Em setembro desse mesmo ano, dois estudantes, Tadashi Nakayama e Yoshitaro Suzuki, foram enviados pela Embaixada para Nova Friburgo, a fim de estudarem o português. Isto foi motivo de muito movimento e alegria para a família Kassuga. Eles, no ano seguinte, passaram para a escola D. Pedro II.
Espalhou-se logo o boato de que Nova Friburgo era terra fértil em lavoura e houve grande procura por outros japoneses. A maioria, uma vez obtido o sucesso da primeira safra, iam embora para São Paulo. Entretanto, alguns adquiriram propriedades e plantaram outros produtos. Estes se firmaram na vida e, aos poucos, foram progredindo.
Em Mogi das Cruzes, também após a guerra, houve mudança de lavouras para a cultura de kakis. Normalizado o intercâmbio entre o Brasil e o Japão, foram importadas outras qualidades de kakis para o terreno experimental agrícola do sr. Matsumoto, mas os kakis de Taubaté continuaram sendo os preferidos no mercado. Atualmente, nos subúrbios de Nova Friburgo, também cultiva-se essa qualidade.
Kassuga, por duas ou três vezes, chegou a colocar seu produto na exposição de kakis de São Paulo e, em todas elas, recebeu o prêmio máximo e também o título de “Shibu Hiaku Monme”.
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